São Paulo, domingo, 19 de outubro de 2008

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China busca AL para manter expansão

Estratégia vai privilegiar comércio com América Latina, África e outros asiáticos, além de ampliar consumo doméstico

Planejamento chinês inclui investimento bilionário em infra-estrutura para evitar que o país sinta os efeitos da desaceleração econômica

RAUL JUSTE LORES
ENVIADO ESPECIAL A HONG KONG

A China vai acelerar uma série de transformações em sua economia para enfrentar a recessão global. A receita anticrise inclui o aumento das participações da Ásia, da África e da América Latina como destinos das exportações do país, o estímulo ao consumo interno e investimentos bilionários em infra-estrutura.
Representando apenas 5% do PIB mundial, a China não terá como garantir sozinha o crescimento mundial se os Estados Unidos, o Japão e a União Européia entrarem em recessão. Mas as novas diretrizes do Partido Comunista indicam que, pelo menos, o governo acredita que o país pode ficar blindado e continuar a crescer.
A União Européia e os Estados Unidos respondiam por mais de 50% das exportações chinesas havia cinco anos. Hoje, elas representam 38,5%, e estão em queda. A Ásia fica com 46,9%, a América Latina com 4,9% e a África com 3,5%.
Um quarto do crescimento das exportações da China no ano passado foi para a América Latina e a África.
Como a China exporta produtos de maior valor agregado a países emergentes, de eletrodomésticos a computadores, de maquinaria industrial a trilhos e contêineres, o redirecionamento das exportações chinesas também busca valorizar os produtos que empregam mais tecnologia.
Minimizando o impacto da queda de demanda de europeus e americanos, a China também começa a sacrificar dois setores que foram chave no início de sua reindustrialização, há 20 anos: têxteis e brinquedos.
Os produtos mais baratos, de tênis a bonecas, já estavam afetados antes mesmo da quebradeira em Wall Street. A moeda chinesa se valorizou quase 20% nos últimos dois anos, os salários dos operários das linhas de montagem aumentam 10% ao ano e o custo das matérias-primas e dos fretes diminuíram a competitividade chinesa em alguns setores.
Cerca de 15 mil fábricas fecharam neste ano na região do Delta do Rio Pérola, o ABC chinês, de onde sai um terço das exportações do país. Do total, 3.631 fábricas de brinquedos fecharam em 2008, 52% do total.
O peso das exportações de baixo valor agregado que utilizam mão-de-obra intensiva é de 25% (elas já foram responsáveis por dois terços das exportações chinesas, há 15 anos).

Nova indústria
"O Partido Comunista fez as contas e viu que parte da produção de brinquedos e têxteis era de baixo valor agregado, paga salários muito baixos e é muito poluidora. Então, os incentivos a essas áreas estão desaparecendo, a China quer outro tipo de indústria", disse à Folha o economista Andy Rothman, macroestrategista para a China do banco de investimentos CLSA, em Xangai.
"É a terceira onda de reformas econômicas desde 1978, que começa agora. Haverá alguns setores sacrificados, mas a longo prazo faz sentido."
Na quinta-feira, 4.000 empregados protestaram em Dongguan após a falência das duas fábricas de brinquedos da Smarts Union, com 6.000 funcionários, que estão há seis semanas sem receber salários.
"Acho que é cedo demais para a China abandonar parte de suas manufaturas", reclama o empresário Mickey Kong Chun, da empresa Jetta Toys. A empresa é a maior do gênero no país, com 40 mil empregados em seis fábricas, entre Guangzhou e Dongguan.
"Nossa vasta mão-de-obra ainda não está preparada para essa transição", afirmou Kong Chun à Folha, reforçando que até mesmo grandes empresas exportadoras sentem os reflexos da crise.
As exportações chinesas só devem crescer 5% no ano que vem -o pior número em dez anos. Há 20 milhões de trabalhadores no setor exportador do país, mais do que toda a população da Grande São Paulo.


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