São Paulo, domingo, 20 de janeiro de 2008

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Álcool frustra investidores e produtores

Chamados de "heróis" por Lula na era da euforia, usineiros freiam projetos de expansão e dizem que boom do álcool não se comprovou

Produção deve continuar excedendo o consumo até 2010, diz BNDES; ao menos 25 projetos de usinas foram adiados ou reavaliados

ELVIRA LOBATO
PEDRO SOARES

DA SUCURSAL DO RIO

Ao menos no curto prazo, o mercado do álcool frustrou os que acreditaram nas promessas de novo eldorado verde dos negócios. A euforia de investidores e empresários com o crescimento do setor, iniciada em 2006, arrefeceu com a queda nos preços do produto no mercado interno e com as dificuldades para a exportação, que não se abriu na velocidade alardeada pelo governo.
Segundo informações de empresários, ao menos 25 projetos de implantação de novas unidades industriais foram adiados ou reavaliados.
Há no país 367 usinas em funcionamento, com a previsão de mais 29 entrarem em operação neste ano.
As exportações de álcool caíram 14% -de 3,6 bilhões de litros em 2006 para 3,2 bilhões de litros em 2007-, e estudo inédito do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) admite possibilidade de excedente de produção de 10% até 2010, a depender da evolução do preço da gasolina. A partir daí, projeta um longo ciclo de crescimento sustentado, principalmente, pelo mercado interno.
No auge da euforia, em 2007, o presidente Lula chamou os usineiros de heróis: ""Os usineiros de cana, que há dez anos eram tidos como se fossem os bandidos do agronegócio neste país, estão virando heróis nacionais e mundiais, porque todo mundo está de olho no álcool", afirmou.
Os investidores acreditam no potencial do mercado a médio e longo prazos, mas dizem que o setor tirou o pé do acelerador, no curto prazo.
Pelas projeções do governo, o consumo de álcool hidratado vai ultrapassar o de gasolina em 2016. No ano passado, o consumo de gasolina foi três vezes maior. A aposta no mercado interno, como força de sustentação da produção, baseia-se nos carros flex (bicombustíveis), que representam quase 90% dos novos veículos.
O governo nega ter havido otimismo demais: ""Houve excesso de declarações, mas quem lida com o setor previa dificuldades na exportação", afirma o diretor do departamento de Combustíveis Renováveis do Ministério de Minas e Energia, Ricardo Dornelles.

Desaceleração
Os sinais de desaceleração são confirmados por vários segmentos. A Unica (União da Indústria da Cana-de-Açúcar) mandou equipe ao campo para apurar se os projetos com início de produção previsto para este ano estão confirmados ou se terá de rever a próxima safra.
""Os preços da safra 2007/ 2008 caíram muito. Não remuneram nem o custo de produção. A indústria não gerou caixa nem registrou lucro suficiente para remunerar os investimentos", declarou o diretor-técnico da Unica, Antonio Pádua.
Para o especialista Josias Messias, presidente do "Jornal Cana", de Ribeirão Preto (SP), até 25 projetos foram adiados.
"Os adiamentos ocorrem entre grupos menores, que dependem do caixa gerado pela atividade para financiar os investimentos. Com os preços em baixa, ficaram sem fôlego -25% dos novos projetos estão nessa situação", diz Messias. O preço médio do álcool hidratado, ao produtor, em São Paulo, que chegou a R$ 1,25/litro em março de 2006, estava em R$ 0,71 na semana passada.
Um exemplo é o do grupo Equipav, que reduziu o tamanho de um novo projeto em Mato Grosso do Sul, com início de operação previsto para 2010. ""A desaceleração está ocorrendo. O ritmo dos projetos se reduziu. Poderíamos fazer uma safra muito grande, de 2,5 milhões de toneladas de cana, mas vamos produzir 1,8 milhão de tonelada", diz Newton Salim Soares, diretor da Equipav. ""Uma boa parte dos projetos não vai virar nada. Quantos vão adiante? Não sei. Muita gente sonhou com ganhos extraordinários", diz Marcelo Vieira, presidente da Adecoagro, que investe na construção de usinas e da qual o investidor George Soros é o principal acionista.


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