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Brasil vai sofrer algum "incômodo", diz Armínio
Para ex-presidente do BC, inflação na meta traz risco de "pressão para cima"
Retração nos EUA mostra que chance de recessão "está cada vez mais clara'; economista vê alta de 3%
no PIB do Brasil neste ano
GUILHERME BARROS
COLUNISTA DA FOLHA
O economista Armínio Fraga
enfrentou algumas crises econômicas quando esteve no comando do Banco Central, no
segundo mandato do governo
Fernando Henrique Cardoso,
entre 1999 e 2002. Hoje, à frente da Gávea Investimentos, ele
acha que o Brasil vai sentir algum "incômodo" com o processo de desaceleração da economia norte-americana, cada vez
mais com cara de recessão.
"A aversão ao risco está aumentando, e, com isso, a possibilidade de uma recessão está
cada vez mais clara."
O ex-presidente do BC acha
que o Brasil, hoje, está muito
mais bem posicionado do que
em outras crises, mas, mesmo
assim, irá sofrer. "Com certeza,
algum incômodo vamos ter."
Sobre o pacote fiscal anunciado na sexta pelo presidente
dos Estados Unidos, George W.
Bush, Armínio manifestou certo ceticismo em relação à sua
eficácia. Ele considerou as medidas importantes, mas disse
que é muito cedo para se saber
se surtirão efeito. "Vai ajudar a
amortecer o processo de desaceleração, mas é cedo para se
dizer se isso será suficiente para evitar a recessão."
A seguir, a entrevista, concedida por telefone, na tarde de
sexta-feira, pouco depois do
anúncio do pacote fiscal do presidente George W. Bush:
FOLHA - Como o sr. vê o atual momento dos Estados Unidos?
ARMÍNIO FRAGA - Eu vejo os EUA
vivendo um momento de reversão do que foi um ciclo de alta,
de crescimento alavancado, na
qual as famílias americanas aumentaram seu padrão de consumo em cima da valorização
de seus imóveis. Numa certa fase, parecia que o país estava vivendo na economia um novo ciclo virtuoso, mas depois se transformou numa bolha, que,
agora, está se revertendo. Ou
seja, os preços dos imóveis estão em queda.
FOLHA - Qual é o risco de uma recessão nos EUA?
FRAGA - As pessoas estão se
vendo obrigadas a vender seus
imóveis e seus ativos e a qualidade do crédito da economia
americana está se deteriorando. A aversão ao risco está aumentando, e, com isso, a possibilidade de uma recessão está
cada vez mais clara.
FOLHA - O resto do mundo será
atingido pela recessão?
FRAGA - Também no resto do
mundo há sinais de desaceleração. A economia japonesa, por
exemplo, vem mostrando cada
vez mais uma perda do padrão
de confiança do consumidor;
na Europa, até semanas atrás,
falava-se em aumento no juro
para combater a inflação, e,
agora, o mercado já aposta inclusive na possibilidade de um
corte na taxa; e a própria China
vem lidando com problemas de
inflação e também tem que desacelerar o crescimento. Tudo
isso significa menos crescimento, mais aversão ao risco e
mais volatilidade.
FOLHA - E o Brasil? O país também
vai sofrer com a crise?
FRAGA - O Brasil está bem posicionado, mas, como muitos
têm dito -a exemplo do próprio presidente do BC, Henrique Meirelles-, ainda irá sofrer algum incômodo. Nada comparado a outros momentos
quando o nosso grau de vulnerabilidade era muito maior. O
balanço de pagamentos do Brasil está menos dependente do
capital de curto prazo, a inflação está na meta, as reservas estão num nível bem confortável,
mas, mesmo assim, com certeza algum incômodo vamos ter.
FOLHA - O Brasil vai sentir como?
FRAGA - Haverá menos demanda dos nossos produtos e menos investimentos no país.
FOLHA - Em entrevista recente, o
sr. previu um crescimento de 3% para o Brasil neste ano. O sr. não está
muito pessimista?
FRAGA - Não foi uma previsão,
mas apenas um cenário que pode acontecer, um cenário muito ruim para a economia global
neste ano. O mais provável, no
entanto, é que o país cresça um
pouco mais, mas aquele cenário, de um crescimento de 3%, é
possível sim que aconteça.
FOLHA - O que o sr. achou do pacote fiscal anunciado pelo presidente
dos EUA, George W. Bush?
FRAGA - Essas medidas são importantes, assim como a postura adotada pelo BC americano,
mas ainda é cedo para dizer se
farão efeito. Vai ajudar a amortecer o processo de desaceleração, mas é cedo para se será suficiente para evitar a recessão.
FOLHA - A alta da inflação no Brasil
é preocupante?
FRAGA - A inflação se elevou de
3% ao ano para 4,5%, portanto
dentro da meta definida pelo
governo (o centro da meta é de
4,5%). Isso significa que a folga
desapareceu, mas a inflação
ainda está dentro da meta.
FOLHA - O sr. acha que, em razão
dessa alta da inflação, o BC pode ser
levado a subir juros neste ano?
FRAGA - Não prevejo um movimento nesse sentido, mas acho
que, na medida em que a inflação está na meta, sempre há
chances de haver alguma pressão para cima. Eu e a torcida do
Flamengo acreditamos que
existe esse risco quando a inflação está cravada na meta.
FOLHA - Há como saber a extensão
da atual crise em relação às demais?
FRAGA - É difícil dizer agora
qual será o tamanho da crise.
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