São Paulo, domingo, 20 de janeiro de 2008

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Brasil vai sofrer algum "incômodo", diz Armínio

Para ex-presidente do BC, inflação na meta traz risco de "pressão para cima"

Retração nos EUA mostra que chance de recessão "está cada vez mais clara'; economista vê alta de 3% no PIB do Brasil neste ano

GUILHERME BARROS
COLUNISTA DA FOLHA

O economista Armínio Fraga enfrentou algumas crises econômicas quando esteve no comando do Banco Central, no segundo mandato do governo Fernando Henrique Cardoso, entre 1999 e 2002. Hoje, à frente da Gávea Investimentos, ele acha que o Brasil vai sentir algum "incômodo" com o processo de desaceleração da economia norte-americana, cada vez mais com cara de recessão. "A aversão ao risco está aumentando, e, com isso, a possibilidade de uma recessão está cada vez mais clara."
O ex-presidente do BC acha que o Brasil, hoje, está muito mais bem posicionado do que em outras crises, mas, mesmo assim, irá sofrer. "Com certeza, algum incômodo vamos ter."
Sobre o pacote fiscal anunciado na sexta pelo presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, Armínio manifestou certo ceticismo em relação à sua eficácia. Ele considerou as medidas importantes, mas disse que é muito cedo para se saber se surtirão efeito. "Vai ajudar a amortecer o processo de desaceleração, mas é cedo para se dizer se isso será suficiente para evitar a recessão."
A seguir, a entrevista, concedida por telefone, na tarde de sexta-feira, pouco depois do anúncio do pacote fiscal do presidente George W. Bush:  

FOLHA - Como o sr. vê o atual momento dos Estados Unidos?
ARMÍNIO FRAGA
- Eu vejo os EUA vivendo um momento de reversão do que foi um ciclo de alta, de crescimento alavancado, na qual as famílias americanas aumentaram seu padrão de consumo em cima da valorização de seus imóveis. Numa certa fase, parecia que o país estava vivendo na economia um novo ciclo virtuoso, mas depois se transformou numa bolha, que, agora, está se revertendo. Ou seja, os preços dos imóveis estão em queda.

FOLHA - Qual é o risco de uma recessão nos EUA?
FRAGA
- As pessoas estão se vendo obrigadas a vender seus imóveis e seus ativos e a qualidade do crédito da economia americana está se deteriorando. A aversão ao risco está aumentando, e, com isso, a possibilidade de uma recessão está cada vez mais clara.

FOLHA - O resto do mundo será atingido pela recessão?
FRAGA
- Também no resto do mundo há sinais de desaceleração. A economia japonesa, por exemplo, vem mostrando cada vez mais uma perda do padrão de confiança do consumidor; na Europa, até semanas atrás, falava-se em aumento no juro para combater a inflação, e, agora, o mercado já aposta inclusive na possibilidade de um corte na taxa; e a própria China vem lidando com problemas de inflação e também tem que desacelerar o crescimento. Tudo isso significa menos crescimento, mais aversão ao risco e mais volatilidade.

FOLHA - E o Brasil? O país também vai sofrer com a crise?
FRAGA
- O Brasil está bem posicionado, mas, como muitos têm dito -a exemplo do próprio presidente do BC, Henrique Meirelles-, ainda irá sofrer algum incômodo. Nada comparado a outros momentos quando o nosso grau de vulnerabilidade era muito maior. O balanço de pagamentos do Brasil está menos dependente do capital de curto prazo, a inflação está na meta, as reservas estão num nível bem confortável, mas, mesmo assim, com certeza algum incômodo vamos ter.

FOLHA - O Brasil vai sentir como?
FRAGA
- Haverá menos demanda dos nossos produtos e menos investimentos no país.

FOLHA - Em entrevista recente, o sr. previu um crescimento de 3% para o Brasil neste ano. O sr. não está muito pessimista?
FRAGA
- Não foi uma previsão, mas apenas um cenário que pode acontecer, um cenário muito ruim para a economia global neste ano. O mais provável, no entanto, é que o país cresça um pouco mais, mas aquele cenário, de um crescimento de 3%, é possível sim que aconteça.

FOLHA - O que o sr. achou do pacote fiscal anunciado pelo presidente dos EUA, George W. Bush?
FRAGA
- Essas medidas são importantes, assim como a postura adotada pelo BC americano, mas ainda é cedo para dizer se farão efeito. Vai ajudar a amortecer o processo de desaceleração, mas é cedo para se será suficiente para evitar a recessão.

FOLHA - A alta da inflação no Brasil é preocupante?
FRAGA
- A inflação se elevou de 3% ao ano para 4,5%, portanto dentro da meta definida pelo governo (o centro da meta é de 4,5%). Isso significa que a folga desapareceu, mas a inflação ainda está dentro da meta.

FOLHA - O sr. acha que, em razão dessa alta da inflação, o BC pode ser levado a subir juros neste ano?
FRAGA
- Não prevejo um movimento nesse sentido, mas acho que, na medida em que a inflação está na meta, sempre há chances de haver alguma pressão para cima. Eu e a torcida do Flamengo acreditamos que existe esse risco quando a inflação está cravada na meta.

FOLHA - Há como saber a extensão da atual crise em relação às demais?
FRAGA
- É difícil dizer agora qual será o tamanho da crise.


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