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LUÍS NASSIF
O caso Globo Cabo
No sábado passado apresentei os argumentos do
BNDES para a operação Globo
Cabo. A lógica do banco é que,
com a atual estrutura de capital, a Globo Cabo é inviável, colocando em risco o próprio dinheiro que o banco tem a receber. Portanto há que capitalizar
a empresa para viabilizá-la e
salvar os ativos lá colocados.
Na opinião de analistas de
mercado, o aporte de capital, de
fato, é inevitável, mas não resolve de imediato a vida da empresa. Com a capitalização de R$ 1
bilhão, a dívida cairia para R$
800 milhões e o capital subiria
para R$ 1 bilhão. O valor do endividamento seria razoável para os padrões de mercado, mas
não viabilizaria a empresa em
seu formato atual.
Há duas pedras no caminho.
A primeira, seu próprio desempenho operacional, diz Eduardo
Aragaki, do Sudameris. Em
2001 o resultado operacional da
companhia (geração de caixa)
foi de R$ 277 milhões. A depreciação anual do investimento
(que mede quanto a empresa
tem que investir para repor os
equipamentos que vão sendo
usados) foi de R$ 423 milhões.
Se a dívida de R$ 800 milhões
for paga a 18% ao ano, haverá
mais R$ 144 milhões de despesa
financeira anual. Ou seja, mesmo reestruturada, a companhia
ainda terá prejuízo por volta de
R$ 300 milhões por ano, apenas
por conta da depreciação e da
despesa financeira.
Essa diferença entre depreciação e resultado é decorrência da
capacidade ociosa da rede. Portanto o aumento do uso é fundamental para estabelecer o
equilíbrio do negócio.
Aí se entra no segundo nível
de análise, as características do
negócio cabo. Como lembra o
leitor e provavelmente analista
Augusto César Contrucci Alvim,
o modelo de TV a cabo vem sofrendo em todo o mundo. Quando a Globo Cabo foi lançada,
havia projeções irrealistas de
penetração no mercado brasileiro. O nível de penetração é de
apenas nove domicílios por cem
com TV aberta.
Esbarra-se no problema de
renda e na própria competição
da TV aberta. Na Argentina o
cabo conquistou parcelas expressivas de consumidores, mas,
além da melhor renda do argentino, a TV a cabo reservava para
seus assinantes atrações como
campeonatos de futebol. Aqui
há uma canibalização entre a
TV aberta e a TV a cabo. E, perdendo a hegemonia absoluta
que marcou a era Boni, dificilmente a TV Globo abriria mão
de atrações em favor do cabo.
Estratégia possível
Para dar novos usos à sua rede
-como a banda larga de telefonia-, a Globo Cabo precisaria
não só de investimentos como
de clientes. Mas como conseguiria clientes para a sua rede se é
concorrente também por meio
do Virtua?
A partir desses dados e de alguns sinais colhidos no ano passado, o analista levanta algumas hipóteses para a operação.
Em sua opinião, a estratégia
consiste em fazer o aporte mínimo para viabilizar a empresa.
Depois a Globo Cabo venderia a
rede para um novo operador,
que investiria em um padrão
melhor e poderia alugar pelo
mesmo preço para a próprio
Globo Cabo e seus competidores. De um lado, a Globo Cabo
se livraria da depreciação gigantesca. De outro, receberia
pelos ativos vendidos.
São vários os sinais que apontam nessa direção. Primeiro, o
fato de o BNDES convencer a
Globopar (controladora da Globo Cabo) a estender o "tag
along" (o direito de receber o
mesmo valor das ações do controlador) de 100% para os minoritários, inclusive para os acionistas preferenciais. O "tag
along" é optativo. Como o
BNDES tem ações preferenciais,
é evidente que está se resguardando, diz Aragaki.
O segundo sinal é que em setembro do ano passado todas as
empresas das Organizações Globo juntaram-se para criar um
ágio. O ágio consiste na diferença entre o valor de aquisição de
companhias adquiridas e seu
valor contábil. Ele serve para
abater do Imposto de Renda, no
momento em que a empresa registrar lucro.
Em setembro do ano passado,
a Globo Cabo já tinha prejuízo
acumulado de R$ 1,5 bilhão
-que poderia ser abatido dos
lucros futuros à razão de 1/3 ao
ano. Por que então esse trabalho
de consolidar o ágio? A única
explicação é a possibilidade de
um lucro extraordinário, proveniente de venda de ativos.
E-mail - lnassif@uol.com.br
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