São Paulo, domingo, 20 de abril de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

YOSHIAKI NAKANO

Juros na contramão

Enquanto os especuladores festejam a alta dos juros, os empresários devem rever os planos de mais empregos

O BANCO CENTRAL decidiu elevar a taxa de juros em 0,5 ponto percentual, preocupado, segundo seu diretor de Política Econômica, com a deterioração das expectativas de inflação de 2009 e porque aumentaram os riscos de que os preços se acelerem mais do que o previsto pelo próprio banco.
Por trás dessa decisão estão os bancos e especuladores internacionais, de um lado, festejando; de outro, os empresários que, incrédulos, começam a rever seus planos de oferta de emprego e decisões de investimento. Os bancos, respondendo à sinalização dada pelo próprio Banco Central, já haviam elevado antecipadamente os juros no mercado, preparando o terreno para uma ação dessa natureza.
Os especuladores internacionais se beneficiaram da maior taxa de juros do mundo, apesar de o risco Brasil estar caindo, ampliaram seus ganhos com o aumento do diferencial de taxas e já aumentaram o fluxo de capitais para forçarem uma nova rodada de apreciação da taxa de câmbio. Do outro lado estão os empresários, que vinham ampliando a capacidade produtiva, respondendo ao aumento da demanda, mas estão se sentindo como aquele indivíduo que estava para completar a maratona mas foi agarrado e derrubado.
O resultado é um filme conhecido, reprisado diversas vezes desde o Plano Real: interrompe-se o ciclo de recuperação e aprecia-se o câmbio.
Com isso, o déficit em transações correntes, que já vinha aumentado fortemente, deverá se acelerar explosivamente. Num futuro próximo, que os especuladores internacionais definirão, ou queimamos as reservas cambiais, ou elevamos mais a taxa de juros ou o real passará a se depreciar, provocando nova onda inflacionária, dessa vez verdadeira.
Em relação ao controle da taxa de inflação, são dúbios os efeitos dessa elevação dos juros e das próximas que virão. Como nas elevações anteriores, a decorrente apreciação cambial terá efeitos deflacionários sobre os bens comercializáveis. Mas, se a taxa de inflação vai cair, é muito duvidoso. Todos sabem que a alta da taxa de inflação se deve fundamentalmente à inflação importada, isto é, ao aumento dos preços de alimentos, petróleo e derivados, produtos siderúrgicos e outras commodities, todas com pressões vindas do exterior, o que nos diz que a taxa de juros brasileira será incapaz de afetá-la.
O aumento da inflação é um fenômeno global. A taxa média de inflação projetada de 41 países, segundo os dados da "The Economist", passou de cerca de 3,1%, há um ano, para cerca de 5,2%, hoje. Se olharmos para a oferta de alimentos, o quadro é desanimador. Depois da desvalorização cambial de 1999, o setor agropecuário respondeu ampliando as exportações, de forma que a área plantada de grãos passou de 35 milhões de hectares na safra 1997/8 para 49 milhões na de 2004/5, além de forte alta na produtividade. Em 2004, a taxa cambial começou a se apreciar mais fortemente, e os custos de produção sofreram fortíssimo aumento, reduzindo a área plantada para 46 milhões de hectares.
A sorte é que neste ano são Pedro ajudou, e a produtividade aumentou, mas, com a nova alta dos juros e a apreciação cambial, vamos piorar ainda mais as condições de oferta.


YOSHIAKI NAKANO, 62, diretor da Escola de Economia de São Paulo da FGV (Fundação Getulio Vargas), foi secretário da Fazenda do Estado de São Paulo no governo Mario Covas (1995-2001).


Texto Anterior: Vinicius Torres Freire: O cretinismo moral do FMI
Próximo Texto: Juro alto ameaça crescimento, diz analista
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.