São Paulo, segunda-feira, 20 de maio de 2002

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PECADO CAPITAL

Classe média alta dos EUA compra para elevar a auto-estima, seja bolsa de US$ 500 ou camiseta de US$ 10

"Nova luxúria" quer consumir felicidade

ADRIANA MATTOS
DA REPORTAGEM LOCAL

Eles não são exatamente ricos. Ganham de US$ 50 mil a US$ 75 mil por ano -algo em torno de R$ 120 mil a R$ 180 mil. Trabalham bastante, sete horas por semana a mais do que seus pais. E, principalmente, compram para elevar a auto-estima, não por narcisismo.
Essa categoria de consumidores, de classe média alta, que vão às lojas por prazer -mas consomem principalmente porque querem se sentir respeitados e amados- foi batizada de "the new luxury" ("a nova luxúria") pelos consultores norte-americanos. Uma expressão usada pela popular apresentadora dos EUA Oprah Winfrey, em um recente programa de TV sobre o tema.
Nos Estados Unidos, eles somam 25 milhões de pessoas -representam, em média, 10% da população total nos países desenvolvidos. Em países emergentes, são menos de 2%.
No ano que vem, essa massa de consumidores, seleta e exigente, vai virar alvo de um livro que está sendo elaborado pela direção da BCG (Boston Consulting Group), uma consultoria com 54 escritórios em 34 países do mundo.

Felicidade
Basicamente, quem pertence a esse grupo compra para obter "benefícios emocionais", segundo Michael Silverstein, vice-presidente da BCG em Chicago, que está elaborando o livro e deve finalizá-lo em dezembro.
"Essas pessoas podem comprar uma bolsa Gucci de US$ 500 ou uma camisa de US$ 10 da Target e terem a mesma satisfação. Não importa o preço, porque eles não adquirem só coisas caras, e até barganham. O que importa é a sensação de felicidade", disse Silverstein à Folha.
Estudos estão sendo feitos em Chicago e Nova York para que os consultores determinem outras características desse grupo. Pesquisas por amostragem com diversas questões (feitas até o momento) levam a crer que um entre cada dez americanos são "pecadores"-fazem parte dessa "nova luxúria" nos Estados Unidos.
Eles não são escravos de marcas, são autênticos e detalhistas. Privilegiam o que é de boa qualidade e não compram produtos de marcas pelas quais não tenham afeição.
No livro, serão selecionadas as marcas de produtos preferidas desses consumidores e exemplos de companhias que cresceram explorando esse segmento.
Entre as marcas escolhidas na pesquisa estão os chocolates Godiva -uma caixa com 16 bombons sai por US$ 25-, lingeries Victoria's Secret -uma camisola custa, em média, US$ 50- e até aparelhos de som da Bang & Olufsen -Madonna tem um em casa e custam, em média, US$ 3.500. Produtos bem mais baratos entraram na lista, como o café servido nas redes Starbucks (o expresso com leite custa US$ 3).

Mercado interno
No Brasil, o consultor não arrisca eleger as preferidas, mas afirma que esse público, em países emergentes, tem basicamente as mesmas caraterísticas da classe norte-americana. A diferença é o evidente abismo entre as rendas.
"No Brasil ou no México, a expansão dessa classe esbarra nos problemas de desigualdade econômica", afirma ele. Estudo finalizado pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) mostra que cada vez menos as pessoas estão ganhando mais. E cada vez mais estão ganhando menos.
Cerca de 2,5% da população brasileira recebe acima de 20 salários mínimos hoje no país. Essa taxa foi próxima a 3% seis anos atrás, segundo a pesquisa.
A queda na renda reduziu a quantidade de pessoas que poderiam incorporar essa nova classe de consumidores no Brasil.

Preferências que vendem
Silverstein arrisca até a dizer que algumas das marcas preferidas dessa classe cresceram no ano passado -em meio à forte desaceleração da economia mundial- porque essa categoria de consumidores não parou de comprar. A Starbucks, por exemplo, cresceu 20% nos últimos anos, enquanto o mercado cresceu a metade disso.
Lojas que comercializam itens para animais (pet shops), como a Diamond e a Eagle Pack, eleitas pela "nova luxúria", têm crescido 10% ao ano, o dobro da média do mercado. No Brasil, alguns economistas e publicitários ouvidos pela Folha destacam outras marcas com igual aceitação. Entre elas estão Nike, Victor Hugo e carros Mercedes-Benz.
Para atingir esse público, entretanto, é preciso seguir algumas regras, na avaliação do consultor Neil Fiske, que também elabora a pesquisa ao lado de Silverstein.
Eles afirmam que, em primeiro lugar, é importante criar produtos para essa categoria sem subestimar seus desejos de consumo. "As empresas precisam criar algo além daquilo que os consumidores querem", dizem os autores no artigo "A nova luxúria e porque precisamos dela".
Além disso, é importante, em princípio, que a empresa crie um nicho de mercado leal à marca. Cerca de 10% dos consumidores fiéis a uma marca respondem por, em média, de 30% a até metade das vendas, segundo o artigo.


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