São Paulo, segunda-feira, 20 de junho de 2005

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"JEITINHO"

Economistas vêem queda na competitividade das empresas e do país

Corrupção dificulta negócios e diminui os investimentos

MARCELO BILLI
DA REPORTAGEM LOCAL

Os escândalos envolvendo empresas e políticos em esquemas de corrupção e evasão fiscal nas últimas semanas não devem impedir o Brasil de crescer neste ano ou mesmo nos próximos.
A corrupção nem sempre derruba o crescimento, mostra a literatura econômica. Por outro lado, ela torna os investimentos mais caros, reduz a produtividade e faz com que empresas e governo desperdicem recursos que, no caso dos países em desenvolvimento, já são muito escassos.
São poucos os economistas e especialistas que se dedicam ao estudo dos efeitos econômicos da corrupção. O primeiro obstáculo é a dificuldade de medir, quantificar, ou mesmo detectar a existência de corruptos e corruptores nos países.
Os índices disponíveis até agora, como o da Transparência Internacional, são baseados na percepção das pessoas, geralmente de agentes envolvidos em negócios transnacionais.
"São levantamentos de percepção. O nome já diz. Indicam algo, mas não são fato", diz Claudio Abramo, da Transparência Brasil.
Apesar da dificuldade de mensurá-la, não é impossível prever os efeitos de um alto nível de corrupção em uma economia, e os economistas chegaram a algum grau de consenso a respeito disso:
1) corrupção aumenta os chamados custos de transação. Na existência dela, portanto, fica mais difícil fazer negócios, os custos aumentam e, por tabela, os preços também;
2) o investimento se torna menos produtivo, também porque os custos para investir aumentam. Ou o investimento é menor, ou é preciso um maior volume de investimento para gerar resultados que, na ausência de corrupção, exigiriam menos recursos;
3) em algumas áreas, a corrupção reduz a eficiência das próprias empresas. Se compensa mais subornar do que investir em novos processos para ganhar uma concorrência pública, por exemplo, a empresa ficará menos eficiente, deixará de investir em inovação e usará o dinheiro para "comprar" a licitação;
4) não menos importante, níveis altos de corrupção distorcem o mercado, criando vantagens artificiais para empresas ou setores, o que, no geral, resulta em economia menos competitiva.
Marcos Gonçalves, pesquisador da FGV (Fundação Getulio Vargas), lembra ainda que altos níveis de corrupção também estão associados à instabilidade política. Ela pode ser maior ou menor, mas um dos possíveis efeitos é o aumento da incerteza em relação aos rumos e regras da economia, que se não impedem, pode atrasar ou deprimir os investimentos.

Crescimento desigual
É possível, claro, um país ter níveis altos de corrupção e crescer a taxas impressionantes. Esse pode ser o caso do Brasil, até a década de 80, e o da China, hoje. Como? Os economistas ainda não chegaram a um consenso.
Uma explicação possível é que, enquanto o crescimento é vigoroso, os benefícios de investir são muito superiores aos custos adicionais e distorções criados pela corrupção. Os problemas aparecem e ficam mais evidentes, então, quando as taxas de crescimento tornam-se menores.
Nos indicadores internacionais, o Brasil aparece entre o grupo de países com níveis razoavelmente altos de corrupção. Pesquisa da própria Transparência Brasil, feita com empresas de São Paulo, mostra que 78% responderam que a corrupção é um obstáculo muito importante para o desenvolvimento. Nada menos do que 70% disseram gastar até 3% do faturamento com pagamento de propinas.
Emerson Kapaz, presidente do Etco (Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial), aponta para a grande informalidade da economia brasileira como um dos indícios que mostram o também alto nível de corrupção. "Como essas empresas [no setor formal] se mantêm? O problema da informalidade vem junto com a corrupção", diz.

Estado inchado?
A decisão de se corromper, ou, por exemplo, entre subornar um fiscal ou pagar o imposto, pode ser encarada como uma cálculo econômico bem racional. Ele envolve o risco de ser denunciado e responder pelo crime e o benefício de não pagar imposto. Dadas a alta carga tributária brasileira, a lentidão da Justiça e a sensação de impunidade, diz Kapaz, não é muito difícil imaginar para onde pende a decisão.
Deste ponto de vista, na origem do problema da corrupção estão o tamanho do Estado, medido pelo tamanho da carga tributária, e suas próprias ineficiências. Visão com a qual nem todos concordam. Abramo, por exemplo, diz que, caso os níveis de corrupção estivessem ligados à carga tributária, escândalos pulariam pelo continente europeu, onde estão os países com algumas das maiores cargas tributárias do mundo.
O que não significa que não exista nenhuma ligação entre nível de impostos e sonegação. A teoria econômica mostra que existe um limite para aumento de impostos a partir do qual a arrecadação começa a cair -é o chamado efeito Tanzi.
Mas daí a explicar a origem do problema começando pela carga tributária vai um salto, diz Abramo, para quem a origem do problema está na própria estrutura do Estado e do sistema político brasileiro. "O escândalo do "mensalão" tem zero a ver com a carga tributária", afirma.

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