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AÇÚCAR
Agricultores belgas temem "invasão" brasileira
Produtores europeus criticam fim de subsídios e atacam Brasil
DO ENVIADO ESPECIAL A BRUXELAS
Os produtores belgas de açúcar,
falando em nome de seus colegas
de toda a Europa, encaminharam
documento ao comissário (espécie de ministro) de Agricultura da
União Européia, o austríaco
Franz Fischler, no qual protestam
contra o corte nos subsídios a eles
concedidos e colocam o Brasil no
centro das críticas.
Os produtores dizem, primeiro,
que a reforma anunciada por
Fischler na semana passada "abrirá as portas para uma invasão do
açúcar brasileiro, que tomará todo o mercado europeu", para
acrescentar que "os únicos beneficiários serão os comerciantes,
transportadores e grandes proprietários de terra no Brasil".
Contra-ataca Elizabeth Seródio,
representante da Unica (União da
Agroindústria Canavieira de São
Paulo), que reúne 98 associados,
responsáveis por 65% da produção brasileira de açúcar:
"A reforma européia não beneficia os ricos ou os pobres, mas os
produtores mais competitivos",
afirmou.
Seródio diz que, no centro-sul
brasileiro, o açúcar é produzido a
um custo de US$ 98 por tonelada,
ao passo que o preço mínimo garantido aos produtores europeus
é hoje de 642 e, mesmo após a
reforma, ficará em 421, mais de
quatro vezes o preço do açúcar
brasileiro.
Protestos
O protesto dos produtores europeus foi encaminhado ontem a
Fischler justamente no momento
em que ele explicava a sua proposta de reforma aos ministros de
Agricultura dos 25 países-membros da UE.
A maioria ficou contra, especialmente os ministros de países
como Espanha, Grécia e Itália,
que são os menos competitivos.
O porta-voz de Fischler, Gregor
Kreuzhuber, reconheceu que a
reação dos ministros "não foi positiva", uma maneira branda de
qualificar as críticas recebidas.
Mas Kreuzhuber diz que a oposição dos ministros não significa
que a reforma vá ser abandonada.
"Fischler tem grande experiência em reformas da política agrícola e sabe que nunca é fácil fazê-las", afirma o porta-voz.
Desta vez, no entanto, é particularmente difícil, na medida em
que se trata, como diz Kreuzhuber, de um "setor complexo", ao
qual a UE dedica a metade exata
dos subsídios à exportação que
agora pretende reduzir.
É difícil também por "se tratar
de um lobby poderoso", completa
o porta-voz.
Chris Scott-Wilson, vice-presidente do "Grupo Canguru", instituição do Parlamento Europeu
que faz campanha para completar
o mercado interno da UE e, por isso mesmo, critica as distorções
provocadas pelos subsídios, dá
uma idéia mais precisa da força
do lobby do açúcar na Europa:
"As estatísticas da Comissão
Européia mostram que a fazenda
média de beterraba é maior e tem
maior renda por hectare que outras fazendas, precisamente pelas
peculiares vantagens do regime
do açúcar" (o açúcar europeu é
feito de beterraba, diferentemente
do brasileiro, que vem da cana).
Brasil
O Brasil vai se beneficiar da reforma européia não para invadir
o mercado europeu, diferentemente do que dizem os produtores belgas. A Europa é auto-suficiente em açúcar e, o que precisa
importar, o faz dos chamados países ACP (Ásia, Caribe, Pacífico) e
da Índia.
O benefício para o Brasil virá,
em tese, de dois lados: com menor
estímulo à produção européia, os
preços no mercado internacional
devem subir, o que é bom para
um país que é o maior exportador
do produto (13,370 milhões de toneladas).
Além disso, o açúcar brasileiro
terá menos concorrência do europeu em terceiros mercados, com a
redução dos subsídios.
Mercosul
A única chance de o Brasil ganhar também mercado na Europa
é se, na negociação direta com a
União Européia, o Mercosul conseguir a cota de 1,8 milhão de toneladas que está pedindo.
A oferta européia, até agora, é
zero, exceto por uma microcota
de 23 mil toneladas, que, mesmo
assim, paga uma tarifa de US$ 98
a tonelada.
Apesar de o porta-voz de Franz
Fischler dizer que as críticas dos
ministros não vão bloquear a reforma, o fato é que a reunião de
ontem foi apenas a primeira. Em
outubro, o governo holandês
(presidente de turno da União
Européia) pretende convocar
uma reunião mais ampla para
discutir o assunto. É nesse mesmo
mês que muda a Comissão Européia, o braço executivo do conglomerado, o que significa que Fischler pode nem estar presente para
defender a sua proposta, que, por
tabela, coincide com interesses
brasileiros.
(CLÓVIS ROSSI)
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