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Crédito se esgota como motor econômico
Níveis de inadimplência têm alta significativa e IBGE diz que o consumidor chegou "ao limite" do seu endividamento
Técnico do Ipea afirma que
a ampliação do crédito e
os benefícios assistenciais
deram "gás artificial" ao
crescimento da economia
FERNANDO CANZIAN
DA REPORTAGEM LOCAL
A expansão do crédito como
um dos motores do atual crescimento econômico chegou ao
seu limite e está desacelerando.
Ao mesmo tempo, há recordes
no aumento do número de endividados e no comprometimento da renda com dívidas.
Em julho, o Brasil sofreu um
aumento considerado "histórico" nos registros de CPFs de
pessoas que não honraram suas
dívidas. Houve um salto de
89,2% sobre julho de 2005 na
média de 15 Estados (não inclui
São Paulo), segundo o SPC Brasil (Serviço de Proteção ao Crédito). A alta acumulada no primeiro semestre é de 35%.
Em São Paulo, 38% dos consumidores declararam, em julho, estar com a renda comprometida com dívidas por mais de
um ano. Um recorde, diz a Fecomercio SP, que reúne as empresas comerciais do Estado.
Segundo a entidade, mais de
55% dos paulistanos têm dívidas. Desses, 37,3% estão com as
contas em atraso.
De acordo com o Banco Central, 7,7% das pessoas físicas estavam inadimplentes em maio.
Do final de 2004 para cá, a inadimplência cresceu 24,2%. No
crédito para a aquisição de bens
de consumo, o não-pagamento
chega a 11,3%. Como resposta,
vários bancos já estão pisando
no freio na oferta de crédito.
Segundo Marcel Solimeo,
economista da ACSP (Associação Comercial de São Paulo), se
os dados do BC excluíssem as
operações de crédito consignado (com desconto direto em folha de pagamento e hoje 50%
do crédito concedido), a inadimplência seria ainda maior.
Limite e artificialidade
Reinaldo Pereira, responsável pela Pesquisa Mensal de
Comércio do IBGE (Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística), afirma que o brasileiro
está chegando "ao limite de seu
endividamento".
Para o pesquisador Roberto
Messenberg, do Ipea (Instituto
de Economia Aplicada), ligado
ao Ministério do Planejamento, o esgotamento do crédito
revela a "artificialidade" e a "insustentabilidade" das políticas
adotadas pelo governo para
promover o crescimento atual.
"Muito disso [da expansão
econômica e do crédito] fez
parte de um processo de transferência de renda promovido
pelo setor público. Os programas assistencialistas injetaram
um poder de compra maior na
economia. Isso deu um gás ao
consumo e fez com que o ritmo
fosse mantido por algum tempo. Mas é insustentável", afirma.
Na semana passada, a Folha
entrevistou algumas pessoas
que saíam de lojas especializadas em conceder crédito no
centro de São Paulo. Há dezenas delas e centenas de funcionários "caçando" clientes nas
ruas. Dois dos entrevistados foram à financeira tentar um novo crédito para pagar dívidas.
Basicamente, a inadimplência aumentou porque as pessoas se endividaram mais sem
que houvesse um aumento correspondente na renda.
Nos últimos 12 meses, segundo o Banco Central, as operações de crédito às pessoas físicas tiveram aumento de 31%.
Boa parte do crescimento deveu-se ao crédito consignado a
pensionistas da Previdência
Social, que hoje já representa a
metade do que é concedido.
Em contrapartida, o aumento da massa real de rendimentos no Brasil deve subir apenas
5,5% neste ano.
Para 2007, as previsões de
aumento da renda são piores.
Devido a seu peso sobre as contas públicas, não são esperados
um aumento significativo do
salário mínimo (subiu 13,4%
neste ano) ou os impactos positivos dos benefícios previdenciários atrelados ao mínimo.
Também não deverá ocorrer
uma ampliação nos programas
sociais como o Bolsa-Família,
que atingirá seu limite de atendimento até o final de 2006. No
emprego, a tendência é que a
criação de vagas formais mude
pouco. Hoje, 90% dos novos
empregos pagam só até R$ 700.
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