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OPINIÃO ECONÔMICA
A volta do pêndulo
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
Tenho uma amiga de longa data, mineira de BH, que é
hoje uma profissional competente
na atividade de conhecer e entender o que o povo pensa da vida.
Em períodos normais a ação de
sua empresa -Síntese- está dirigida, em maior intensidade, para questões ligadas à mensuração
e avaliação de hábitos de consumo. Mas em épocas de eleições ela
mergulha de cabeça no trabalho
de avaliação do cenário político e
das intenções de voto do eleitor.
Ela faz isso não só respondendo
às demandas efetivas do mercado
mas também porque a política é
uma de suas paixões. Sua geração
viveu intensamente o período de
chumbo da ditadura, agora resgatada do esquecimento popular
pelo "Lula Light" de Duda Mendonça. Nos anos em que estive engajado no governo FHC, Cássia
Paixão representou para mim
uma âncora importante, para
evitar que eu perdesse o cidadão
como referência da minha ação e
do governo do qual eu participava. A história havia me ensinado
que essa é uma das maiores armadilhas que cercam as pessoas
que se engajam na atividade pública. Principalmente em momentos de efêmero sucesso!
Quando a campanha eleitoral
que estamos vivendo começou a
esquentar, apelei mais uma vez
para Cássia. Queria entender e
acompanhar como o povo estava
vendo e sentindo esse processo.
Muitas das reportagens do site
Primeiraleitura e algumas de minhas colunas semanais aqui na
Folha refletiram suas avaliações.
Foi ela quem primeiro me alertou
para a avaliação negativa que a
maioria da população estava tendo do governo em razão de problemas objetivos, enfrentados no
dia-a-dia. A estagnação da renda, as dificuldades crescentes no
mercado de trabalho, o apagão e
o aumento brutal das tarifas públicas estavam lentamente moldando a posição oposicionista da
maioria da sociedade brasileira.
Posteriormente, foi ela também
que me alertou para as dificuldades que Fernando Henrique encontraria para fazer seu sucessor
e a avenida que estava começando a abrir-se para o PT e seu eterno candidato. Como o saudoso
Mário Covas -um dos poucos
políticos que conheço que mesmo
depois de um longo período no
poder não perdeu sua sensibilidade de entender o povo-, ela
também me falava do cansaço da
sociedade com a racionalidade
de nosso presidente e de seu modelo econômico que não respondia mais às demandas e aos sonhos dos brasileiros.
As pesquisas qualitativas realizadas pela Síntese recentemente
comprovam e reafirmam essas
previsões feitas há algum tempo.
O desgaste do governo FHC, apesar da admiração que a maioria
dos brasileiros ainda tem pelo
presidente, é ainda mais evidente, e o cansaço, mais explícito.
Cansaço com o discurso oficial
sobre as vantagens do mundo
globalizado e que estão cada vez
mais distantes do dia-a-dia do cidadão comum; cansaço com as
palavras do ministro da Fazenda
ressaltando nossos bons fundamentos macroeconômicos e a
avaliação negativa verbalizada
pelos mercados e autoridades internacionais sobre a nossa economia; cansaço com os discursos favoráveis do FMI e de suas amarras sobre nossa política econômica; cansaço com a falta de respeito de altos funcionários, como o
presidente da Petrobras, que não
tem nenhuma emoção ao dizer
que prefere ficar do lado dos 400
mil acionistas da empresa em detrimento dos milhões de consumidores do gás de cozinha, um
produto essencial na cesta de consumo do brasileiro; cansaço da
covardia do Copom na administração dos juros e sua eterna promessa de taxas mais baixos no
futuro.
Frustrada em seu sonho de dias
melhores, que o sucesso do Plano
Real nos primeiros anos de FHC
parecia prometer, a maioria dos
brasileiros parece decidida a dar
uma chance ao PT e a Lula. Os
antigos receios e medos que o ex-líder metalúrgico sempre provocou no eleitor estão hoje menores.
A opinião pública reconhece um
processo de amadurecimento do
partido, convertido de um socialismo radical à defesa da economia de mercado, e de seu símbolo
maior -Lula-, apresentado
sob um novo figurino, criado por
Duda Mendonça. Essa nova postura do eleitor fica clara com os
baixos índices de rejeição do candidato. Lula deixou de lado o discurso de lutas de classe e do conflito entre ricos e pobres e apresenta-se como o candidato de todos os brasileiros.
Aos militares, faz juras de amor
e de respeito por seu espírito nacionalista e promete tudo, até a
bomba atômica. Aos usineiros de
açúcar, promete créditos e a volta
dos dias de glória do álcool. Aos
trabalhadores sem terra, promete
a reforma agrária redentora. Aos
brasileiros que ganham o salário
mínimo, promete a sua multiplicação por dois em seu governo.
Acena com a volta do crescimento econômico e do emprego.
E, para fechar essa agenda de
promessas, assume o compromisso de respeitar o atual acordo
com o FMI, que obrigará seu governo a realizar um superávit fiscal de 3,75% do PIB, nos próximos anos. Por mais impossível
que possa parecer essa agenda, e
o eleitor tem consciência disso, a
maioria da sociedade está decidida a dar a vez para o PT e Lula.
Talvez até no primeiro turno!
A história pode estar armando
uma grande arapuca para o PT e
seu candidato a presidente. Ele
pode tomar posse em um período
de grande crise econômica e financeira no mundo, o que tornará a administração de nossa economia muito difícil. Se em seguida da vitória nas urnas o PT e
seus seguidores entrarem em euforia pela chegada ao poder e perderem a capacidade de entender as limitações que vão existir para um governo de esquerda, sem a confiança dos chamados mercados, em 2003 poderemos viver dias muito difíceis.
Luiz Carlos Mendonça de Barros, 59, engenheiro e economista, é sócio e editor do site de economia e política Primeira Leitura. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo FHC).
Internet: www.primeiraleitura.com.br
E-mail - lcmb2@terra.com.br
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