São Paulo, domingo, 20 de outubro de 2002

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CONJUNTURA

Deterioração do cenário causa divergência entre economistas, que já prevêem recessão e inflação de dois dígitos

Dólar e juros elevam pessimismo para 2003

ÉRICA FRAGA
FÁTIMA FERNANDES
JOSÉ ALAN DIAS
DA REPORTAGEM LOCAL

Prever o desempenho da economia brasileira para 2003 é tão arriscado quanto dar um tiro no escuro. Não é à toa que os economistas mais tarimbados em fazer projeções macroeconômicas quebram a cabeça neste momento para traçar um cenário para o país no ano que vem. Ainda assim, não chegam a um consenso. As previsões para a inflação variam de 5% a 15%. As estimativas para o PIB (Produto Interno Bruto) vão de queda de 1,5% a alta de 2,6%.
Levantamento feito pela Folha com 15 importantes consultorias, bancos e universidades do país revela que as previsões para o futuro da economia são cada vez mais pessimistas e discrepantes. De forma geral, as estimativas para o PIB minguaram, enquanto as previsões para a inflação subiram, especialmente nas últimas semanas, por conta da alta do dólar e da recente elevação da taxa de juros.
Há um único evento sobre o qual as previsões convergem: o mercado tem quase certeza de que Luiz Inácio Lula da Silva será o novo presidente do Brasil. E as preocupações sobre o comportamento de um governo petista servem de pretexto para que um mesmo banco trabalhe com três cenários possíveis para 2003.
As incertezas quanto ao futuro da economia brasileira são tantas que há casos de projeções de crescimento econômico que se transformaram em expectativa de recessão no período de um mês. O banco JP Morgan, por exemplo, mudou sua previsão de crescimento para o PIB de 2% para uma queda de 1,5% em 2003.
"A deterioração da economia mundial, somada à maior probabilidade de que o PT ganhe as eleições, nos levou a mudar nosso cenário", diz Fábio Akira, economista do banco norte-americano.
O mesmo acontece com algumas projeções para a inflação, que dispararam nas últimas semanas. O Instituto de Economia da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) trabalhava recentemente com projeção de 6% de inflação para 2003, medida pelo IPCA. Agora, já fala em 10%.
"Os preços estão subindo muito por causa da alta do dólar, por isso refizemos nossa projeção", afirma Francisco Eduardo Pires de Souza, coordenador do Grupo de Conjuntura do Instituto de Economia da UFRJ.
Foram duas as razões principais para a deterioração das perspectivas econômicas para o próximo ano. Com a piora da expectativa de recuperação da economia internacional, cresceu o pessimismo em relação ao fluxo de investimentos para países emergentes, como o Brasil, em 2003. Nos últimos seis meses, o que já se viu foi a migração de recursos desses países para ativos considerados de risco zero, como os títulos públicos dos Estados Unidos.
A proximidade da sucessão presidencial tornou também o mercado financeiro mais apreensivo. Se Lula ganhar, na análise dos economistas ouvidos pela Folha, o país vai levar um tempo para se acalmar, pelo menos até que o novo governo anuncie a sua equipe econômica e deixe claro os rumos que dará para a economia. Isso já contribuiu para uma forte restrição ao acesso de empresas brasileiras a financiamentos externos e para a explosão do dólar.

Inflação e dívida
A desvalorização do real gerou grande preocupação no mercado, principalmente em relação a dois importantes indicadores da economia: inflação e relação entre a dívida pública brasileira e o PIB.
Além de pressionar os preços, principalmente as tarifas administradas, a alta do dólar fez aumentar de forma significativa a parcela da dívida pública que é corrigida pela moeda norte-americana. Surgiram temores até de calote da dívida brasileira, o que causou piora ainda maior nas expectativas.
Para tentar solucionar parte do problema -a inflação-, o Banco Central anunciou na segunda-feira, em reunião extraordinária, a elevação da taxa de juros de 18% para 21% ao ano.
A medida causou polêmica. Economistas acreditam que a alta dos juros ajudará a conter as pressões inflacionárias, embora apostem que é inevitável algum repasse para os preços em 2003 por conta da desvalorização cambial dos últimos meses.

Mais aperto
Juros mais altos significam também aumento da dívida pública. E novamente um abismo separa algumas estimativas. Tome-se um caso: o Bank of América prevê que, com os atuais níveis do dólar (R$ 3,90) e dos juros básicos, para deter a escalada da dívida pública o governo teria de gerar superávit primário (parcela destinada ao pagamento de juros) de 5% do PIB em 2003 -1,25 ponto percentual acima do acertado com o Fundo Monetário Internacional.
A maioria dos analistas consultados pela Folha prevê ser possível manter estabilizada a relação dívida/PIB com superávit primário de 3,75%. Mas com uma ressalva: que o dólar recue.
Para piorar os cenários, a recente elevação dos juros aumentou o temor de enfraquecimento da economia em 2003. O crescimento potencial do país, para Celso Toledo, economista da MCM, é de 2,6% em 2003. Essa taxa será possível de ser alcançada, diz ele, se o novo governo adotar políticas fiscal e monetária coerentes com a política de preços.



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