São Paulo, quarta-feira, 20 de outubro de 2004

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EFEITO COPOM

Recuperação das vendas no varejo mostra vigor menor, segundo o IBGE; alta da Selic hoje pode inibir mais

Crédito caro freia retomada do consumo

DA SUCURSAL DO RIO
DA REPORTAGEM LOCAL

A recuperação das vendas no varejo dá sinais de enfraquecimento, segundo dados divulgados ontem. Os culpados são a não-recuperação da renda e os juros altos, que encarecem o crédito e desestimulam o endividamento das famílias.
A retomada do consumo pode levar outro golpe hoje, quando o Copom (Comitê de Política Monetária) decide se eleva a taxa de juros -Selic-, atualmente em 16,25%. É quase um consenso entre economistas de que ela subirá entre 0,25 e 0,50 ponto percentual.
Segundo a última ata do Copom, um dos principais motivos para elevar os juros seria uma possível inflação de demanda, argumento enfraquecido pelos dados divulgados ontem.
Segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), o volume de vendas do varejo em agosto cresceu 7,53% -sobre o mesmo mês de 2003-, ritmo menor do que o de julho (12,04%).
Desde março deste ano, o comércio crescia a taxas de dois dígitos, graças às vendas a crédito. Para o instituto, a base de comparação mais elevada a partir de agosto de 2003 explica, em parte, a desaceleração do comércio.
Segundo Nilo Lopes de Macedo, economista do IBGE, como a renda ainda está em queda e o emprego reage lentamente, as famílias não podem assumir novas dívidas antes de pagarem as antigas.
De acordo com ele, o fato de a renda ainda não ter se recuperado também prejudica o desempenho do ramo de híper, supermercados e demais lojas de alimentos. É que esses itens são consumidos de acordo com a disponibilidade de dinheiro das pessoas. O volume de vendas desse ramo subiu 4,06% em agosto -havia tido uma alta de 10,40% em julho.
Dados da Abras (Associação Brasileira dos Supermercados) também mostraram arrefecimento. Há dois meses seguidos o setor registra queda na receita. O faturamento real caiu em setembro -1,87% sobre agosto-, após recuar 2% em agosto sobre julho.
No ano, o resultado ainda é positivo: o acumulado dos nove primeiros meses de 2004 apresenta alta de 1,77% em relação ao mesmo período do ano passado.
A entidade também credita o resultado claudicante à recuperação ainda lenta da renda.
Em outra pesquisa divulgada ontem o IBGE confirma que a recuperação do rendimento segue tímida. Enquanto o emprego na indústria cresceu, pelo quarto mês consecutivo, a renda do trabalhador no setor estacionou.
"O crescimento [das vendas no varejo] só é mais consistente quando é acompanhado da expansão do emprego e da renda. Quando é impulsionado só pelo crédito, o ritmo diminui naturalmente com o passar do tempo, pois há um limite de endividamento", disse Macedo, do IBGE.
O economista Carlos Thadeu de Freitas, da CNC (Confederação Nacional do Comércio), concorda. Lembra que o país viveu uma recuperação "induzida" pelo crédito desde o final de 2003, mas que era esperada logo em seguida uma melhora da renda, o que não houve. "As famílias tomam crédito até um certo limite. Muitas delas estão tendo de reduzir seu consumo agora para pagar dívidas."
A Folha mostrou ontem que, apesar da recente elevação da taxa Selic, o volume global de crédito concedido por instituições financeiras aos consumidores apresentou leve alta no mês passado, em relação a agosto. Mas especialistas indicam que a tendência é de inibição desse movimento, se os juros continuarem em alta.
Para o economista Alex Agostini, da Global Invest, o fator fundamental para a "freada" do comércio é a alta dos juros de mercado, que balizam as taxas do crediário.
Para Freitas, da CNC, esse "esgotamento natural" do impulso do crédito fará com que o desempenho da economia no último trimestre seja menos vigoroso.
Apesar disso, levantamentos da CNI (Confederação Nacional da Indústria) e da Fecomercio apontaram que tanto os empresários quanto os consumidores seguem confiantes na recuperação da economia brasileira.
Já a consultoria Global Station vê, em relatório, um lado positivo do ritmo do consumo menor: inibe pressão sobre os preços e a necessidade de subir os juros.
(PEDRO SOARES E ADRIANA MATTOS)


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