São Paulo, terça-feira, 20 de outubro de 2009

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Camargo Corrêa pode levar R$ 7 bi da União

Pedido de indenização será julgado hoje pelo STJ; se perder, Eletronorte terá de pagar multa a empresa de consultoria do grupo

Empresa prestou serviços à Eletronorte nos anos 70/80; em 93, houve acerto, mas a empresa quer se indenizada por "custos financeiros"


KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O STJ (Superior Tribunal de Justiça) julga hoje, a partir das 14h, um pedido de indenização bilionária do grupo Camargo Corrêa à União. É uma ação judicial de 1994 que, atualizada, poderá chegar a R$ 7 bilhões, de acordo com cálculo que consta do processo.
Trata-se de uma ação de cobrança indenizatória que poderá obrigar a Eletronorte a pagar tal quantia ao Cnec (Consórcio Nacional de Engenheiros Consultores), empresa de consultoria do grupo Camargo Corrêa.
O processo, que teve início em dezembro de 1994, dividiu a 2ª Turma do STJ, composta por cinco ministros. A Eletronorte apresentou um recurso contra decisão do TJ (Tribunal de Justiça) do Distrito Federal. Se a Eletronorte perder, terá de pagar a indenização.
Dificilmente poderá recorrer ao STF (Supremo Tribunal Federal), porque não há questões constitucionais em debate. Apenas matéria sobre contratos. Apesar disso, a Eletronorte diz que pretende recorrer se perder.
Caso o STJ aceite hoje o recurso da estatal, o efeito prático será a anulação da decisão do TJ do Distrito Federal. A batalha jurídica recomeçaria na segunda instância. É uma causa bastante polêmica. Dividiu a 2ª Turma do STJ -o tribunal é repartido em grupos que julgam casos de diferentes naturezas jurídicas.
Dois ministros da turma votaram a favor da Eletronorte: Eliana Calmon e Antonio Herman Benjamim. Dois ministros apoiaram a Camargo Corrêa: o relator do caso, Mauro Campbell Marques, e Humberto Martins. O ministro Castro Meira se declarou impedido para julgar.
É uma situação que acontece, mas não é usual no STJ. Para desempatar, o caso foi levado às mãos do ministro Luiz Fux, da 1ª Turma.
Para um integrante da cúpula da AGU, que participa da defesa da Eletronorte, existem divergências jurídicas profundas e incomuns nos votos em relação a um caso desse tipo. Os advogados da Cnec sustentam a legalidade do pleito.
A Folha apurou que o Palácio do Planalto está preocupado com o eventual impacto negativo de uma indenização bilionária nas contas públicas numa hora de queda de arrecadação de tributos. A AGU (Advocacia-Geral da União) foi acionada para dar prioridade à causa. Em ações que não envolvem questões tributárias, mas discussões contratuais, é um valor considerado bem alto.

Resumo do caso
A Cnec prestou serviços ao setor elétrico público federal nas décadas de 70 e 80. Em 1991, a Eletronorte cancelou os contratos. Dois anos depois, realizou-se acerto de contas, no qual a Cnec deu quitação. Porém, em 1994, a empresa ajuizou ação de cobrança indenizatória por "custos financeiros".
A empresa alegou que a Eletronorte atrasou pagamentos em época de inflação alta, que isso a obrigou a tomar recursos em bancos e que, portanto, aumentou seus custos.
A primeira instância federal, a 5ª Vara Cível de Brasília, deu ganho de causa à Eletronorte, dizendo que uma cláusula do acerto de contas dizia o seguinte: "A credora reconhece, em caráter irrevogável e irretratável, para não mais reclamar, preservada a relação contratual, que seus créditos até 30 de abril de 1990, aceitos pela Eletronorte, são os referentes às faturas relacionadas no anexo 3". Nesse anexo, há a lista dos serviços. Para o juiz, a cláusula era de "clareza ímpar" a favor da Eletronorte.
A Cnec recorreu ao TJ do Distrito Federal, que inverteu a decisão da primeira instância federal. O acórdão, decisão final do TJ, invocou argumentos jurídicos inusitados para a defesa de uma empresa do grupo Camargo Corrêa. Argumentos validados por dois ministros do STJ.
Exemplo: uso do Código de Defesa do Consumidor, aplicando à Cnec a proteção ao hipossuficiente (economicamente fraco) e vulnerável. Citou-se a favor da empresa o Código de Hamurabi, que tem mais de 4.000 anos.
O TJ, no entanto, não analisou os argumentos da Eletronorte, na opinião de dois ministros do STJ. A Eletronorte alega que seus argumentos foram ignorados.
Por meio de suas assessorias de imprensa, a Cnec e a Eletronorte disseram que preferem não se manifestar no momento porque o processo tramita na Justiça.
A estatal acrescentou que "a única decisão de mérito, proferida nos autos da ação judicial, reconheceu a inexistência de qualquer dívida".
No processo, a Cnec alega que a expressão "preservada a relação contratual" fundamenta a cobrança judicial.


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