São Paulo, quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

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ANÁLISE

Mercado de trabalho põe água na "fervura"

FERNANDO SAMPAIO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Vistos isoladamente, os números do mercado de trabalho formal em dezembro foram, sem dúvida, decepcionantes. Embora no mês final do ano os desligamentos de trabalhadores com vínculo formal de emprego sempre superem as admissões, o saldo negativo apurado pelo governo (415 mil) foi bem maior do que se esperava e do que se verificou, em média, nos demais meses de dezembro desta década (342 mil).
Em todos os grandes setores -serviços, indústria, comércio, construção e agropecuária-, a piora do resultado, na comparação com o mês precedente, foi mais intensa do que costuma ser. A única comparação em que os números do mês passado se mostram positivos é diante do resultado do Caged em dezembro de 2008 -mas este, refletindo a enorme incerteza que então predominava no mundo todo, foi tão ruim (fechamento de 655 mil postos de trabalho) que ficou conhecido pelo trocadilho "traged".
É evidente que avaliar um resultado isolado é pouco prudente. Ainda mais quando um resultado decepcionante foi precedido por um muito melhor do que se antecipava -e foi justamente esse o caso do Caged em novembro.
Quando veio a público que em novembro a criação líquida de empregos formais chegou perto de 250 mil (muito acima da média do mês nos anos anteriores, da ordem de 30 mil), uma parcela dos analistas concluiu que tivera início um processo de aquecimento muito rápido do mercado de trabalho.
Agora é provável que muitos revejam, ao menos em parte, o diagnóstico de que a economia caminha a passos largos para um ponto de "fervura" -um superaquecimento capaz de suscitar, rapidamente, fortes pressões inflacionárias. No âmbito específico do mercado de trabalho, mesmo antes da divulgação do Caged de dezembro já havia elementos que sugeriam um processo menos acelerado de aquecimento.
Em particular, as pesquisas mensais realizadas nas grandes regiões metropolitanas vêm apurando que o ritmo de crescimento do número de pessoas ocupadas -seja com ou sem vínculo de trabalho formalizado- não vem aumentando de maneira progressiva.
Para além do mercado de trabalho, outros aspectos sugerem que os riscos inflacionários continuam bastante limitados no curto prazo: ainda há uma margem ampla de capacidade produtiva ociosa em vários ramos da indústria (sobretudo em bens de capital e em bens intermediários, refletindo, entre outros fatores, a timidez da retomada das exportações, depois de um tombo muito severo); a cotação do dólar não revela tendência de alta significativa; as cotações das commodities também não se encontram numa escalada preocupante.
Mais à frente, a evolução da inflação dependerá de muitos fatores, valendo destacar a velocidade da maturação dos investimentos (e, portanto, da ampliação da capacidade produtiva nos vários setores da economia) e o fôlego da reativação econômica global.

FERNANDO SAMPAIO, economista, é sócio-diretor da LCA Consultores



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