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PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
A Argentina em apuros
A inflação na Argentina chegou a um nível perigoso; quem sabe
não está chegando a hora de
chamar Lavagna de volta?
NÃO SÓ a Argentina -eu também estou em apuros. Tentei escapar de publicar artigo nesta quinta-feira, mas avisei tarde demais e o Jacques Constantino,
que cuida das colunas, disse-me que
não teria tempo de encontrar um
artigo substituto. Perdoe-me, leitora, se o artigo não sair a altura do tema.
A Argentina é um país muito especial. Já escrevi várias vezes a respeito dela nesta coluna e em outras
publicações. Nos tempos de Carlos
Menem e Domingo Cavallo, na década de 1990, a minha preocupação
central era que os argentinos pudessem ser arrastados para a dolarização total e a subordinação completa
aos Estados Unidos, contaminando
em alguma medida a posição brasileira e solapando de vez a integração
sul-americana. Depois, sobreveio a
crise terrível de 1999-2002, uma das
piores de que se tem notícia.
Surgiu então uma espécie de salvador da pátria: Roberto Lavagna,
um dos melhores, provavelmente o
melhor ministro da Economia que
apareceu na América Latina em
muito, muito tempo. Lavagna conseguiu, primeiramente, restaurar a
moeda nacional, libertando-a da
vinculação rígida ao dólar, estabelecida no governo Menem, e afastando o risco de dolarização plena da
economia. Mostrou que era perfeitamente possível romper a ligação
com o dólar sem recair na hiperinflação, como muitos temiam. Em
2004, a taxa de inflação diminuiu
para apenas 4,4%, contrariando
previsões tenebrosas.
Se tivesse feito só isso, Lavagna já
teria entrado para a história econômica argentina. Mas fez mais: liderou a reestruturação da dívida. Nervos de aço. Com coragem e criatividade, acabou conseguindo que a
maioria dos credores aceitasse uma
espécie de contrato de adesão, que
reduziu consideravelmente o estoque e o serviço da dívida pública. A
proposta de Lavagna gerou muitas
reações iradas no exterior, mas ele
ficou firme e acabou prevalecendo.
O que aconteceu, na prática, foi uma
reestruturação unilateral da maior
parte da dívida.
Infelizmente, Lavagna desentendeu-se com o presidente Néstor
Kirchner e deixou o cargo em novembro de 2005. Desde então, a
qualidade da política econômica argentina vem sofrendo sensível deterioração. Os seus sucessores deixaram muito a desejar.
A situação da Argentina não é de
todo ruim. A economia continua
crescendo em ritmo acelerado, mais
de 8% ao ano. O balanço de pagamentos em transações correntes registra superávits ano após ano. As
contas públicas também estão bastante ajustadas.
O grande problema é a volta da inflação -problema agravado pelo
descrédito dos índices oficiais de
preços. A taxa de inflação oficial foi
de 8,5% em 2007. Ninguém acredita
nesse número. Técnicos do instituto
que calcula os índices de preços estimaram a inflação de 2007 em 26%.
A Ecolatina, firma de consultoria
fundada por Lavagna, apresentou
uma estimativa de 24%. Roberto
Frenkel, um dos mais importantes
economistas argentinos, supõe que
a taxa de inflação esteja por volta de
20%.
Como observou Frenkel, a inflação chegou a um nível perigoso. Aumenta a freqüência com que se ajustam os preços e os salários. Os contratos tendem a se encurtar. A economia fica mais vulnerável a choques e à aceleração da inflação. É urgente estabelecer uma política crível
de combate à inflação.
Quem sabe não está chegando a
hora de chamar Lavagna de volta?
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR., 52, escreve às quintas-feiras nesta coluna. Diretor-executivo no FMI, representa
um grupo de nove países (Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Haiti, Panamá, República Dominicana, Suriname e Trinidad e Tobago).
pnbjr@attglobal.net
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