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VINICIUS TORRES FREIRE
As últimas do divórcio americano
Rolo financeiro deve piorar, mas dados não desqualificam a hipótese de parte do mundo descolar da crise dos EUA
ESTÁ NO FORNO uma nova rodada de anúncios de desastres
financeiros, alguns sendo assados na Europa e no mercado de seguro contra calotes financeiros, que
está queimando de novo. A estagnação americana mal começou, é coisa
de um trimestre e pouco, ainda.
Isto posto, no entanto, segue animado o debate sobre o "descolamento" ou "descasamento" ("decoupling") -a hipótese de parte relevante do planeta não sofrer nesta
crise os efeitos plenos do baixo crescimento econômico nos EUA. Por
ora, ainda no começo do primeiro
tempo desse jogo, as notícias dão
vantagem para os mais otimistas.
No início de fevereiro, os economistas do JP Morgan haviam apontado que o "repasse" da desaceleração americana para os emergentes
vinha sendo até então um terço menor do que de costume. A alta persistente do preço das matérias-primas
é outro indício ao menos provisório
da resistência das economias emergentes, "Chíndia" (China e Índia)
em particular, mas também no Brasil, na Rússia, no leste Europeu etc.
Ontem, a Economist Intelligence
Unit revisou de 1,5% para 0,8% sua
estimativa para o PIB americano em
2008, mas manteve seu cenário de
alta para preços de commodities
(com exceção de metais industriais,
para os quais prevê queda, o que porém não se observa até agora). O
presidente da maior produtora
mundial de fertilizantes, a Potash,
disse à Bloomberg que há risco de
fome devido à escassez de grãos.
Em pesquisa do instituto alemão
IFO e da FGV, o "índice de clima
econômico" na América Latina ainda continua positivo, apesar de uma
ligeira deterioração (as coisas não
vão tão bem no México ou no Chile,
por exemplo). Mas, nos Brics, o índice de otimismo ficou estável (Brasil,
Índia) ou subiu (China, Rússia).
Também ontem, Alexandre
Schwartsman, economista-chefe
para a América Latina do ABN,
apresentou uma conta inevitavelmente provisória a respeito da hipótese do possível divórcio entre EUA
e resto do mundo. Comparou o ritmo de crescimento das importações
de EUA, China, Europa e o do resto
do planeta, desde 1993. Verificou a
conhecida associação entre queda
do crescimento das importações
americanas com as do restante do
planeta durante quase todo o período, com exceção do presente momento e de 1997-98, quando as crises russa e asiática compreensivelmente baixaram a correlação.
No final de 2005, o crescimento
das importações americanas e as
mundiais (afora EUA) iam de mãos
dadas, a um ritmo de quase 14% no
acumulado de 12 meses. No final de
2006, a correlação começa a despencar. No final de 2007, as importações americanas haviam relaxado
o passo a cerca de 5%, enquanto o
resto do mundo acelerava, na média,
para 15%. Schwartsman ressalta que
essa é uma primeira aproximação
do problema, que não se sabe do que
será da crise daqui em diante etc.
Há muita gente séria para quem o
"descolamento" é um mito alucinado. Pode ser. Pode ser também que
não tenhamos visto nem parte do
rolo financeiro euroamericano e
seus efeitos na economia "real". Mas
os fatos à vista até agora indicam que
poderá sobrevir uma novidade grande a respeito da influência da economia americana no resto do planeta.
vinit@uol.com.br
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