São Paulo, domingo, 21 de fevereiro de 2010

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Paul Volcker vê ganhos obscenos no mercado financeiro

Para ex-presidente do Fed e conselheiro de Obama, práticas de remuneração dos bancos perderam contato com a realidade

Volcker volta a ter posição central no debate econômico com proposta para evitar que bancos realizem operação financeira com capital próprio


DO "FINANCIAL TIMES"

Paul Volcker é visto como um dos sábios da vida pública dos EUA. Como presidente do Fed (Federal Reserve, o BC norte-americano) nos governos Jimmy Carter e Ronald Reagan, ele subjugou a inflação, façanha pela qual hoje é elogiado, embora suas ações tenham causado controvérsia na época.
Quando Obama foi eleito, Volcker foi nomeado para a presidência do Conselho de Assessoria sobre Recuperação Econômica da Casa Branca, um cargo que inicialmente parecia em grande parte cerimonial.
Mas Volcker voltou a ocupar posição central no debate econômico e financeiro, no mês passado, quando Obama expressou apoio à sua proposta para impedir que os bancos comerciais realizem operações financeiras com capital próprio, um plano que ganhou o apelido de regra Volcker.
Para ele, a remuneração no mercado financeiro perdeu "contato com a realidade", tornando-se "obscenamente alta". E propõe um Fed mais ativo como lição da crise atual: "Não podemos mais confiar apenas em consertar os estragos após o estouro de uma bolha".

 

PERGUNTA - Algumas pessoas falam sobre a regra Volcker como parte das restrições que visariam evitar o problema das instituições financeiras grandes demais para falir. Era essa a sua intenção?
PAUL VOLCKER
- Não, essas questões terminaram por ser confundidas. O presidente disse alguma coisa a respeito ao mesmo tempo, mas o meu foco sempre foi o das transações próprias. Isso não significa que eu me oponha à ideia de algumas restrições por tamanho.

PERGUNTA - E em sua opinião, o banco central cometeu erros?
VOLCKER
- Creio que todo mundo cometeu. Meu problema é que o Fed sempre termina apontado como culpado, quando a SEC (órgão que fiscaliza e regulamenta o mercado de valores mobiliários), o OCC (serviço de controle da moeda), e o pessoal da Freddie Mac e Fannie Mae também erraram. Houve um relaxamento coletivo, e indevido, da disciplina regulatória ou de fiscalização.

PERGUNTA - O senhor acredita que tenha havido uma mudança de filosofia e que a partir de agora o Fed tenha a responsabilidade de prevenir a próxima bolha?
VOLCKER
- Não, acredito que tenha havido certa mudança de filosofia no sentido de que não podemos mais confiar apenas em consertar os estragos depois do estouro de uma bolha. Isso deixa uma importante questão de julgamento sobre como conduzir essa mudança, em termos técnicos e outros.

PERGUNTA - Uma crítica à regra Volcker... Alguém a terá criticado?
VOLCKER
- Algumas pessoas criticaram. Um comentário feito por algumas pessoas foi o de que "Paul Volcker é um homem de grandes e históricas realizações, mas até que ponto ele está conectado com os mercados atuais?" Tenho certeza de que não compreendo todas as complicações do mercado financeiro. E não sei quanto dos líderes dessas instituições o compreendem.br>Mas compreendo que é muito complicado. E isso gerou uma forte opacidade, que a torna muito difícil de administrar. As operações básicas de bancos comerciais têm uma mentalidade diferente da que orienta o típico operador com capital próprio, o típico profissional de fundo de hedge.

PERGUNTA - Até que o ponto o senhor se preocupa com a questão dos incentivos errados incorporados à remuneração dos executivos?
VOLCKER
- Agora, se estamos falando de dificuldades e complexidades, você mencionou uma das grandes. Acredito que as práticas de remuneração em uso no mercado financeiro atual tenham perdido o contato com a realidade e criado incentivos que não são úteis. E a remuneração se tornou obscenamente alta em termos da discrepância entre o trabalhador médio e os líderes.

Tradução de PAULO MIGLIACCI



Texto Anterior: Frase
Próximo Texto: Frase
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.