São Paulo, sexta-feira, 21 de abril de 2000


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POLÊMICA
Dornbusch, professor do MIT, responde às críticas do ex-economista-chefe do Banco Mundial ao FMI
Stiglitz versus FMI: mais uma opinião

RUDI DORNBUSCH

A Ásia está demonstrando taxas de crescimento miraculosas, uma vez mais. A Coréia do Sul, um dos países mais atingidos pela crise de 97/98, já tem um nível de Produto Interno Bruto (PIB) 12% superior ao que tinha antes da crise. Qual é a lição? As políticas do Fundo Monetário Internacional (FMI) funcionam; a noção de incompetência e de soluções inadequadas apontada por Joseph Stiglitz em seu artigo é completamente frívola e, evidentemente, egoísta.
O que mais ofende no texto, e a maior inverdade, é a sugestão de que a equipe do FMI consiste de "estudantes de terceira categoria das universidades de primeira linha". (Será que o mesmo se aplica aos ex-colegas dele no Banco Mundial?). Em Harvard e no MIT, bem como em todas as demais escolas importantes, os doutores recém-titulados que não conseguem empregos nas cinco maiores universidades mundiais optam pelo FMI e pelo Banco Mundial. E isso é uma vantagem, na verdade. As pessoas com mais chance de serem escolhidas inicialmente pelas universidades para cargos acadêmicos provavelmente serão um tanto teóricas demais para o trabalho mais cru da condução política. Stiglitz mesmo, com sua predileção pelas exceções intrigantes de preferência à regra geral, é um exemplo claro. Nem o FMI nem o Banco Mundial precisam de teóricos; o que lhes serve melhor são veterinários rurais bem treinados. Como o grande Edwin Kemmerer, de Princeton -o Jeffrey Sachs dos anos 20-, disse: "Na periferia, a enxada impera".
A alegação de Stiglitz de que a ignorante e arrogante equipe do FMI empregou medicamentos drasticamente errados -orçamentos sob estrito controle e altas taxas de juros- e transformou uma situação difícil em um desastre generalizado é tão contraditória quanto errada. O que ele quer dizer? Diante de governos que estavam sofrendo golpes da ordem de 50% (ou mais) do PIB em suas finanças públicas devido à falência de bancos e à inadimplência generalizada, políticas fiscais frouxas deveriam ser a regra? Ante o colapso das divisas devido à pressão causada pela fuga de capitais, as taxas de juros deveriam ter sido cortadas a fim de baratear o custo de tirar dinheiro do país e derrubar ainda mais o câmbio? Estranho, muito estranho. Nos últimos cem anos, a regra vem funcionando sem erro: a estabilização começa com as taxas de câmbio e as finanças públicas. Os investidores recuperam a confiança e reconduzem seu dinheiro aos países onde vêem política fiscal conservadora e taxa de juros elevada. Basta fazê-lo por alguns meses e tudo volta aos trilhos. Era essa a política da Liga das Nações nos anos 20, com grande sucesso, e desde sempre vem sendo a política do FMI. Continua a funcionar.
A Coréia do Sul está florescendo, e o mesmo vale para o resto da Ásia. As taxas de juros caíram depois de alguns meses, com o retorno de capitais estabilizando e propiciando altas de câmbio; as finanças públicas puderam começar a ser relaxadas assim que os investidores compreenderam que o fim do mundo não estava chegando. Nos países em que a orientação do FMI foi seguida prontamente e sem hesitação, a recuperação foi mais rápida. Mas em lugares como a Indonésia, onde as autoridades vacilaram, a crise continua.
Quando os países chegam de maca ao FMI não é hora de idéias bonitinhas. Políticas drásticas são necessárias para evitar a hemorragia, o colapso da moeda e a irreparável depressão econômica. A estabilização não é um concurso de popularidade ou um seminário de pesquisa. Hoje, nenhum ministro das Finanças optaria pela Clínica Stiglitz de Medicina Aliterativa; eles pedem que as ambulâncias os levem ao FMI. E quando o fazem, os mercados recuperam a confiança rapidamente e daí é só um pequeno passo para a normalização.
Stiglitz se queixa de que ninguém o ouviu, exceto o dr. Mahatir, outro charlatão. Não surpreende! É verdade que Stiglitz é um economista renomado, que um dia deve ganhar um Nobel por sua contribuição teórica à explicação dos fracassos do mercado.
Mas ninguém jamais o considerou um economista político, e muito menos alguém que tenha a mais remota idéia sobre macroeconomia e estabilização. Afinal, ele é ex-economista-chefe do Banco Mundial que, em meio à crise asiática, sugeriu que a China desvalorizasse sua moeda, com a provável consequência de causar um novo colapso por toda a Ásia. Ainda bem que ninguém o ouviu.
A Ásia vai bem. A principal lição para o FMI é que da próxima vez eles deveriam aplicar exatamente a mesma receita e desfrutar de sucesso igualmente espetacular. Parabéns à brilhante equipe do Fundo Monetário Internacional.


Rudi Dornbusch é professor de economia e administração internacional do Massachusetts Institute of Technology (MIT).


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