São Paulo, quarta-feira, 21 de abril de 2004

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ARTIGO

Alta nas taxas ameaça famílias e empresas

PAUL KRUGMAN

"Sim, a república está em perigo", disse um amigo. "Mas o que vai acontecer com as taxas de juros?"
Está bem, vamos dar uma folga à política. Nos últimos dois anos as taxas estiveram muito baixas. Em junho passado a taxa dos títulos para dez anos atingiram seu mais baixo nível em 48 anos. Três semanas atrás a taxa continuava abaixo de 4%, nível visto pela última vez em 1963.
Se a economia se recuperar plenamente, as taxas de juros aumentarão acentuadamente. Em seu relatório Perspectivas Econômicas Mundiais, a ser divulgado hoje, o FMI (Fundo Monetário Internacional) pede que o Federal Reserve (banco central americano) prepare a economia para taxas maiores, para "evitar a ruptura do mercado financeiro, tanto internamente como no exterior".
Mas até onde as taxas vão subir? Não vamos entrar na "kremlinologia" de Greenspan, esmiuçando os resmungos do presidente em busca de pistas sobre a próxima medida do Fed. Perguntemos, em vez disso, quanto as taxas vão subir se e quando as condições normais de oferta e demanda voltarem ao mercado de títulos.
Meus cálculos continuam me levando para uma taxa de 7% para os títulos de dez anos, e uma taxa de hipoteca de 8,5% -com uma possibilidade substancial de que os números sejam ainda maiores. As taxas atuais estão em cerca de 4,4% e 5,8%, respectivamente. Você pode ver por que o FMI está preocupado com a "ruptura do mercado financeiro".
Por que 7%? Bem, nos últimos 20 anos o rendimento médio dos títulos de dez anos ficou na verdade ao redor de 7%.
Alguns dizem que, ao contrário das taxas do passado, as futuras não incluirão um prêmio para inflação esperada. De fato, nos últimos 20 anos o índice médio de inflação foi de 3%, consideravelmente maior que a experiência recente. Mas nos primeiros três meses de 2004 os preços subiram a um índice anual de mais de 5%.
Mais realistas, os investidores esperam uma inflação considerável nos próximos dez anos. A margem entre os títulos protegidos contra inflação, cujos pagamentos são indexados ao CPI (Índice de Preços ao Consumidor, na sigla em inglês), e os títulos comuns indicam uma taxa esperada de 2,5% para a próxima década.
Durante muitos anos os defensores dos cortes fiscais insistiram que as leis normais da oferta e da demanda não se aplicam ao mercado de títulos, em que os empréstimos do governo -ao contrário dos empréstimos feitos por famílias ou empresas - não afetam as taxas de juros.

Risco déficit
Mas isso não se discute entre economistas sérios. Por exemplo, um livro-texto de Gregory Mankiw, o atual economista-chefe da Casa Branca, declara -em itálico- que "quando o governo reduz a poupança nacional entrando em déficit orçamentário, a taxa de juros sobe".
Estimativas dizem que o déficit público deverá elevar as taxas de juros para dez anos em cerca de um ponto percentual. Como indiquei antes, os déficits gêmeos, orçamentário e comercial, fariam soar alarmes se os EUA fossem um país do Terceiro Mundo. Por enquanto os EUA têm o benefício da dúvida, mas, se os mercados financeiros decidirem que nos transformamos em uma república de bananas, o céu é o limite para as taxas de juros.
Muitas famílias e empresas terão grande dificuldade se as taxas de juros realmente subirem tanto quanto estou sugerindo. É por isso que o FMI está pedindo que o Fed se manifeste.
Suspeita-se que o Fundo, que, como Alan Greenspan, tende a transmitir mensagens em código, está disparando um tiro contra o arco de Greenspan. Vários analistas acusaram o presidente do Fed de promover uma bolha da dívida nos últimos anos, assim como o acusam de alimentar a bolha das ações na década de 90.
Apenas dois meses atrás, Greenspan esforçou-se para enfatizar os benefícios financeiros das taxas de hipotecas ajustáveis, e não fixas. Vamos esperar que poucas famílias tenham considerado isso um conselho útil.


Paul Krugman, economista, é colunista do "New York Times" e professor na Universidade Princeton (EUA).

Tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves


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