São Paulo, terça-feira, 21 de maio de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

LUÍS NASSIF

As auditorias e o novo mercado

O caso Enron colocou no foco das atenções mundiais o papel das empresas de auditoria. Não apenas a questão do conflito de interesses entre auditoria e consultoria, mas as novas formas de avaliar empresas.
As empresas de auditoria passaram a dar consultoria com o advento dos sistemas de automação das empresas. Os sistemas de ERP (de automação administrativa e industrial das empresas) necessitavam da empresa de auditoria para destrinchar os processos internos. Com o tempo, as grandes empresas passaram a solicitar às auditorias que rodassem o sistema, interferissem no design. E aí começaram a surgir parcerias com grandes fabricantes de softwares, e aí também começaram os problemas das empresas de auditoria. Especialmente quando surgem o e-business e o capital de risco.
A consultoria passou a custar mais caro do que a própria auditoria, gerando o conflito de interesses. Mas como administrar os conflitos de interesse?
Depois dos últimos episódios, a tendência das maiores empresas de auditoria é vender a sua parte de consultoria. A própria Arthur Andersen já havia vendido sua divisão pouco antes da tragédia Enron. A Pricewaterhouse é outra que caminha para essa decisão.
No Brasil, os casos Nacional e Econômico fizeram a CVM (Comissão de Valores Mobiliários) baixar a resolução 308, instituindo o rodízio de auditores, para evitar essa cumplicidade.
Na opinião da Price brasileira, a solução deveria ser mais bem discutida. Seu argumento é que não é o rodízio que vai instituir a independência. Mais que isso, as empresas de auditoria definem competências, bancos de dados, especializações. Com o tempo, aprendem os macetes das empresas auditadas, centram a análise nos pontos mais frágeis de controle.
Quando se institui rodízio de auditores de uma mesma auditoria, os bancos de dados são preservados, diz ela. Quando se institui rodízio de auditorias, quem entra na área tem que começar do zero, ficando muito mais sujeito a burlas.
Na sua opinião, o que a CVM deveria fazer seria punir severamente os erros, em vez de soluções de atacado que, em sua opinião, pioram a situação.
Os novos conceitos de governança corporativa, o controle social sobre as empresas e os novos critérios de formação de valor estão a exigir mudanças substantivas nos demonstrativos e balanços contábeis.
As demonstrações são pouco claras, inacessíveis aos leigos, e há um sem-número de novos fatores que têm que ser contabilizados para uma melhor avaliação das empresas.
Os balanços se limitam a levantar os ativos tangíveis das empresas. Nos últimos anos a pirâmide de valor se inverteu. O valor maior está no conhecimento, não nos ativos. No entanto todos os procedimentos de análise de receita continuam centrados na economia do tangível.
Há toda uma literatura discutindo a questão do levantamento do capital intelectual, algo que não consegue ser captado pelas demonstrações contábeis. O tema foi levantado com mais ênfase no período de explosão especulativa da Nasdaq. Mesmo tirando o componente especulativo, havia uma diferença monumental entre o valor contábil e o valor de mercado das empresas, demonstrando que o avaliador não captava o valor que o mercado racionalizava.
Uma das consequências foi a consagração do método do "fluxo de caixa descontado" como critério de valor. Ou seja, avaliar quanto a empresa pode render em um determinado período e trazer a valor presente de acordo com determinadas taxas de desconto -maiores para setores de maior volatilidade, menores para setores mais estáveis. A moderna visão de avaliação é que a empresa tem que reportar aquilo que é valor, independentemente de ser tangível ou não.
Um segundo desafio é mudar a linguagem, para permitir, por exemplo, a uma ONG saber o que lhe interessa. Daí a questão do balanço social. Mas quem precisa definir as novas linguagens é o regulador.

E-mail - lnassif@uol.com.br



Texto Anterior: Opinião Econômica - Benjamin Steinbruch: O silêncio vale por mil palavras
Próximo Texto: Mercado tenso: Santander discute futuro de analistas
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.