São Paulo, sexta-feira, 21 de maio de 2004

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EFEITO CONTRÁRIO

Segundo o mercado, Banco Central admitiu fragilidade da economia ao manter juros; dólar vai a R$ 3,214

Turbulência aumenta com decisão do BC

FABRICIO VIEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL

Se a intenção do Banco Central era acalmar os mercados ao manter a taxa básica de juros em 16%, o tiro saiu pela culatra. O dólar atingiu ontem R$ 3,214, seu maior valor em 13 meses. O risco-país foi a 758 pontos (alta de 8,75%). A Bolsa de Valores de SP caiu 2,4%, e os juros futuros subiram.
Fatores externos também contribuíram para a deterioração dos mercados, mas a decisão do BC teve um efeito preponderante.
Na quarta-feira, o Copom (Comitê de Política Monetária) manteve os juros básicos da economia em razão da "volatilidade recente" nos mercados.
A decisão foi encarada ontem como uma admissão de que o Brasil é vulnerável aos efeitos da turbulência que atinge os mercados internacionais.
Nas últimas semanas, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o ministro Antonio Palocci Filho (Fazenda) e o próprio presidente do BC, Henrique Meirelles, vinham dizendo que a turbulência externa não ameaçava o Brasil.
"É como se o BC tivesse "comprado" a turbulência do mercado, assumindo o quanto ela o preocupa", disse Adolpho Nardy Filho, diretor do banco Cruzeiro do Sul, referindo-se à decisão do Copom. "Como o mercado está muito especulativo, qualquer sinalização dessas é motivo para pressionar o dólar e o risco-país."
Os efeitos negativos do Copom somaram-se a um cenário externo desfavorável -as Bolsas caíram na Europa, e o risco-país dos principais emergentes subiu.
Na BM&F, a taxa do contrato DI -que acompanha os juros praticados entre bancos- com vencimento em janeiro, o prazo mais negociado, saltou de 17,05% para 17,76% anuais. As taxas desses contratos são importantes para as empresas planejarem seus investimentos.
"Estamos num período ruim de contágio, de muita volatilidade. Para o mercado melhorar, temos de ter um cenário de petróleo acomodado e uma idéia mais clara de como o banco central americano agirá em relação à sua taxa de juros", diz Clive Botelho, diretor financeiro do Banco Santos.
Lá fora, apesar de o petróleo não ter alcançado outro preço recorde, o dia também foi negativo. As preocupações dos investidores internacionais seguem focadas na expectativa em torno da alta dos juros nos EUA e da pressão sobre o preço do petróleo. O Embi+, média do risco-país dos emergentes, subiu 4,99%.
A queda de ontem da Bolsa de Valores de São Paulo reflete a expectativa do mercado de que os juros voltem a subir no último trimestre do ano. No mês, a Bolsa acumula queda de 6,9%.
Em meio ao turbulento dia, o Tesouro Nacional realizou leilão de compra e venda de títulos públicos prefixados (LTNs).
Analistas afirmaram que o governo atendeu a demanda de instituições financeiras que necessitavam vender LTNs, mas não encontravam compradores no mercado. Quando isso ocorre, as taxas dos papéis caem, e fundos que os carregam podem ter perda de rentabilidade. O Tesouro retirou do mercado cerca de R$ 386 milhões em papéis prefixados.
Nos últimos dias, a volatilidade do mercado financeiro no Brasil -medida de quanto os preços dos ativos variam a cada dia- disparou. Índice calculado por Octavio Vaz, da Questus Asset Management, mostra que a volatilidade da Bolsa era, ontem, 40% maior do que há uma semana.
"A volatilidade do mercado está muito forte. Um sinal disso é que, há três dias, os preços dos ativos têm começado o dia sempre muito descolados dos preços de fechamento da véspera. Isso mostra que os investidores não estão confortáveis com as suas posições", disse. Esse desconforto é reflexo de uma percepção cada vez maior de risco, tanto do cenário externo quanto do doméstico.
Além da volatilidade, outra medida desse temor crescente é a busca por ativos de curtíssimo prazo, cujos preços sempre tendem a oscilar menos.
Tem aumentado, por exemplo, o volume de recursos destinados à compra de títulos que vencem em uma ou duas semanas, no máximo.


Colaborou Érica Fraga, da Reportagem Local


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