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Nova rodovia dará ao Brasil acesso limitado ao Pacífico
Interoceânica, no Peru, tem obstáculos estruturais e políticos para virar corredor de exportação
Além da instabilidade social do país vizinho, limitações de circulação na rodovia podem atrasar projeto
de integração comercial
AGNALDO BRITO
ENVIADO ESPECIAL AO PERU
Distrito de Marcapata, Departamento de Cusco, Peru.
Sob chuva forte, um paredão de
150 metros se desprende da
montanha e desaba sobre a estrada. Mais de 250 mil toneladas de escombros soterram a
rodovia. O trabalho de meses fica sob os Andes. Não tem sido
nada trivial o esforço econômico e político do governo vizinho
para a construção dos mais de
mil quilômetros da Rodovia Interoceânica, projeto de US$ 2
bilhões que conectará o Brasil e
o Peru, vizinhos que dividem
uma fronteira de 3.000 km.
Mais que isso: proporcionará
ao Brasil acesso ao Pacífico.
Parte de um projeto geopolítico de integração regional, a
Rodovia Interoceânica -um
dos nove grandes eixos rodoviários de interligação sul-americana- oferecerá ao Brasil até
o fim de 2010 uma saída com
grandes restrições aos portos
do outro oceano.
Além dos limites estruturais,
recente crise social faz lembrar
ao Brasil que o Peru é também
um país com forte instabilidade
política, desafio para qualquer
grande planejamento logístico.
No mais recente episódio, grupos indígenas bloquearam por
cerca de dois meses estradas na
região norte do país em protesto contra o governo (leia texto
nesta página). As rodovias foram liberadas anteontem.
Na Interoceânica, a estrada
também trará desafios de infra-estrutura. Boa parte dessa obra,
ao sul do território peruano,
avança sobre a cordilheira dos
Andes. E o salto sobre essa muralha só está sendo possível
graças à construção de uma pista sinuosa e com imensas limitações para o trânsito de grandes caminhões, como aqueles
usados no Brasil para o escoamento da produção agrícola rumo aos deficientes portos de
Santos (SP) e Paranaguá (PR).
A reportagem da Folha percorreu mais de 1.700 quilômetros de estradas na região sul
do Peru e pôde constatar que,
entre as duas finalidades planejadas para esse grande projeto de infraestrutura, apenas a
de permitir a integração turística e comercial entre regiões
isoladas do Brasil e do Peru parece crível. O plano dos governos de viabilizar a Estrada do
Pacífico como um corredor de
exportação para o agronegócio
brasileiro -embarcando commodities para a Ásia- não deve
prosperar por enquanto.
Polêmica
O próprio agronegócio brasileiro prevê que, na ponta do
lápis, os ganhos eventualmente
obtidos com o custo menor de
frete marítimo não compensam os mais de 2.000 quilômetros que separam as zonas produtoras do Brasil central aos
portos do Pacífico.
"É uma ideia muito polêmica. A implementação desse corredor não é tão simples. É louvável a iniciativa, pode melhorar muito a nossa performance
com a China. Mas, por enquanto, prefiro apostar em outras alternativas dentro do Brasil, em
vez desse corredor peruano",
afirma Carlos Lovatelli, presidente da Abag (Associação Brasileira de Agribusiness).
Para Luiz Antonio Fayet, especialista em logística para o
agronegócio, mais de 80% dos
mercados brasileiros estão no
Atlântico Norte e no Oriente
Médio, regiões que podem ser
atendidas pelos portos brasileiros. "Na minha visão, a grande
prioridade nacional é resolver a
questão do escoamento da safra do Centro-Norte e do Centro-Oeste com saídas pela bacia
amazônica ou pelas portas da
costa do Atlântico", afirma.
Os limites
O primeiro grande limite da
rodovia, para os propósitos de
transformá-la num corredor de
exportação rumo à China, é de
ordem estrutural. Projetada
para suportar caminhões de até
seis eixos, a Estrada do Pacífico
não foi idealizada para grandes
veículos, com sete a nove eixos
e capacidade para transportar
até 50 toneladas de carga, como
os usados para transporte de
cargas de exportação.
A inclinação de 12 graus da
rodovia peruana é suave, mas
isso a tornou excessivamente
sinuosa, o que exige atenção extrema de quem tem o volante às
mãos. A reportagem levou mais
de 13 horas para percorrer 750
km num veículo de passeio.
Esse excessivo tempo de viagem para vencer a cordilheira é
suficientemente grande para
eliminar as vantagens dos portos do Pacífico.
Para o agronegócio nacional,
o ganho estaria na possibilidade de embarcar grandes volumes de carga do outro lado da
América do Sul, como em San
Juan de Marcona. A profundidade das baías de Marcona chega a 30 metros, o que permitiria
a atracação de navios de 300
mil toneladas de capacidade.
Os navios que atracam no porto
de Santos, o maior do país, são
carregados com apenas 60 mil
toneladas de carga.
Considerando um navio carregado para Xangai, na China, a
diferença entre sair de Santos
ou de um porto no lado do Pacífico é de quatro dias de navegação -uma economia estimada
por uma grande companhia de
navegação transoceânica em
US$ 177 mil.
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