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São Paulo, quinta-feira, 21 de agosto de 2003

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OUSADO OU GRADUAL?

Maior corte desde 99 surpreende a maioria dos analistas e o setor produtivo; Fiesp elogia com moderação

BC reduz juros para 22% e alivia pressões

NEY HAYASHI DA CRUZ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O Banco Central promoveu ontem a maior redução da taxa básica de juros desde maio de 1999. Ao cortar 2,5 pontos percentuais, deixou a Selic em 22% ao ano. A decisão surpreendeu a maioria dos analistas do mercado financeiro e o setor produtivo, que esperavam uma redução menor.
A expectativa era de uma queda de apenas 1,5 ponto percentual. A decisão do Copom (Comitê de Política Monetária) aliviou as pressões e as críticas contra o BC, que partiam da indústria, do comércio e de dentro do governo.
Foi o terceiro mês seguido de redução nos juros. Nas duas ocasiões anteriores, porém, o BC foi bastante criticado por ter promovido cortes que seriam insuficientes para a retomada do crescimento econômico.
Nas últimas semanas, o presidente do BC, Henrique Meirelles, se defendeu das críticas classificando de "gradualista" a política de redução da taxa Selic. Ou seja, os juros cairiam, mas aos poucos. Essa declaração foi entendida por analistas como um sinal de que, dificilmente, o corte seria maior do que 1,5 ponto.
A queda da taxa para 22% ao ano era vista como desejável pela cúpula do governo, pois faz com que ela volte para o mesmo patamar de novembro de 2002, no início da transição de governo. O ministro da Fazenda, Antonio Palocci Filho, disse que a decisão de ontem foi técnica, não política.
O BC limitou-se a informar que o corte de ontem faz parte "de uma estratégia gradualista de flexibilização da política monetária". Segundo nota da instituição, "dados divulgados desde a última reunião do Copom" confirmam que a manutenção dos juros em níveis elevados trouxe "resultados positivos" no combate à inflação.
Apesar de não terem sido citados pelo BC, três dados divulgados desde a última reunião do Copom mostram, além do controle da inflação, a forte desaceleração da economia:
1) a renda média do trabalhador caiu 16,4% no mês passado, em relação a julho de 2002;
2) as vendas do comércio recuaram 5,37% em junho passado, na comparação com o resultado de junho de 2002;
3) a indústria está tecnicamente em recessão, depois de registrar dois trimestres seguidos de queda na produção.
Ou seja, a queda na renda faz as pessoas comprarem menos. O consumo menor traz prejuízos ao comércio, que reduz as encomendas à indústria. Isso faz com que os industriais diminuam a produção. A situação piora com os juros altos, que encarecem o crédito.
É justamente esse cenário recessivo que ajuda a conter a inflação. E a inflação, por sua vez, tem dado sinais de queda. Segundo pesquisa feita pelo BC entre analistas de mercado, a expectativa é que o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo), índice que serve de parâmetro para as metas do governo, registre alta de 9,74% neste ano. No mês passado, projetava-se 10,81%.
"Não posso deixar de elogiar essa queda e dizer que o Banco Central mantém o gradualismo, a cautela. Acredito que houve um entendimento de que era possível fazer uma redução com responsabilidade", afirmou o presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), Horacio Lafer Piva. Mas ele lembrou que, mesmo com a diminuição, o Brasil ainda tem uma das taxas mais elevadas do mundo.
Para Emílio Alfieri, da ACSP (Associação Comercial de São Paulo), trata-se do primeiro passo para a recuperação da economia. "A partir de outubro podemos esperar sinais de melhora para vendas no crediário se os juros continuarem a cair", diz.
A taxa Selic é aquela que remunera os empréstimos feitos entre os bancos. Por isso, serve de referência para os juros cobrados pelos bancos de seus clientes e tem influência sobre o desempenho de toda a economia.
Por essa razão, a decisão do BC pode colaborar para aumentar o otimismo de empresários e consumidores, estimulando a retomada do crescimento.
Como os juros praticados efetivamente nas relações cotidianas são maiores do que a Selic, o efeito no bolso do consumidor pode ser menor. Segundo estimativa da Anefac (Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade), os juros médios cobrados pelo comércio, por exemplo, devem cair de 6,67% ao mês para 6,5%. Mas especialistas dizem que a redução da Selic tem um efeito psicológico, de diminuir o temor de perder o emprego, que pode estimular as pessoas a gastarem mais.


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