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FOSSO
Brasil não só está entre os 4 países mais desiguais em estudo do Banco Mundial como tem mecanismos para perpetuar situação
Bird vê "armadilha da desigualdade" no país
FERNANDO CANZIAN
ENVIADO ESPECIAL A WASHINGTON
Mais uma vez, o Brasil recebeu
destaque negativo em estudo do
Bird (Banco Mundial). O país foi
apresentado ontem como um dos
mais desiguais do mundo e envolto no que a instituição chamou de
"inequality trap" (armadilha da
desigualdade).
Campeão da desigualdade social na América Latina, o Brasil só
está melhor hoje do que quatro
países africanos (Suazilândia, República Centro-africana, Botswana e Namíbia), segundo o Bird.
Pior: o Brasil reúne quase todos
os ingredientes possíveis citados
pelo estudo "Eqüidade e Desenvolvimento" para continuar perpetuando essa situação.
No trabalho, o país ganhou destaque em texto sob o título "Oportunidades desiguais persistem
por gerações no Brasil".
Nele, o Bird observa que não somente a renda dos mais pobres é
um problema, ao lado da falta de
bons serviços como saúde e educação, mas que não há no Brasil
condições e mecanismos de interação entre ricos e pobres.
O Banco Mundial vê avanços
nos últimos 12 anos, principalmente após a implantação do
programa Bolsa-Família no governo FHC e sua ampliação no
governo Lula, mas constata que
eles são absolutamente insuficientes para mudar o quadro.
No trabalho, o Bird considera
"eqüidade" como chances iguais
a todos, independentemente de
cor, raça ou nível social.
Elite e poder
Já a "armadilha da desigualdade", segundo o Bird, dá-se quando a elite econômica e política se
perpetua no poder, criando mecanismos financeiros e legislativos para manter o comando e obter vantagens.
Um exemplo clássico no caso
brasileiro seria quando o Poder
Legislativo ou Judiciário aumenta
os próprios salários ou se recusa a
cortar ganhos previdenciários incompatíveis com os do resto da
sociedade.
O Bird cita outros exemplos,
desde casamentos constantes entre os filhos de uma mesma elite
política e empresarial à falta de financiamentos em condições
iguais para ricos e pobres.
As desigualdades nos empréstimos revelam mais um problema
no Brasil, segundo o Bird: a falta
de um capitalismo mais avançado. "Se uma pessoa pobre tiver
uma grande idéia, jamais conseguirá um financiamento bancário
nas mesmas condições que alguém rico", diz o estudo.
Na apresentação do trabalho, o
economista-chefe do Bird, François Bourguignon, disse que são
dois os "pilares" do Bird para o
desenvolvimento: clima favorável
para investimentos nos países e
concessão de poderes econômicos e sociais para os mais pobres.
"Quanto melhores forem o clima para negócios e a eqüidade social, maior será o potencial do
crescimento e da distribuição de
renda", diz Bourguignon.
Além de falhar na questão da
eqüidade, o Brasil também foi colocado, na semana passada, na
119ª posição entre 155 países em
um novo ranking do Bird que
avaliou o clima para negócios em
várias regiões do mundo.
O economista brasileiro Francisco Ferreira, um dos principais
autores do estudo apresentado
ontem, comparou a um "Estado
de bem-estar social truncado" a
atual situação brasileira.
"O Estado é muito bom em taxar as pessoas e distribuir o dinheiro somente entre os mais ricos. O que temos falhado em fazer
é gastar mais em áreas onde as
pessoas mais pobres mais precisam", afirmou.
Ferreira cita como exemplo
clássico a educação: filhos de famílias ricas que estudam em bons
colégios particulares acabam entrando nas universidades públicas. "Subsidiamos na universidade pessoas ricas que freqüentaram boas escolas privadas em vez
de subsidiar mais pessoas pobres
em escolas públicas", diz.
O economista afirma que, comparado à Coréia do Sul (um exemplo de país que massificou a educação pública de boa qualidade),
o Brasil gasta de três a quatro vezes mais com pessoas adultas em
universidades públicas.
Segundo o Bird, além de todas
as dificuldades citadas para romper a "armadilha da desigualdade", o Brasil tem um problema
adicional, que é uma das cargas
tributárias mais altas do mundo.
Hoje, ela supera 36% do PIB
(Produto Interno Bruto), contra
12% no México, por exemplo
-país que ainda teria espaço para aumentar impostos para subsidiar os mais pobres.
O estudo do Bird foi lançado na
véspera do início da reunião conjunta entre o banco e o FMI (Fundo Monetário Internacional).
O FMI deve anunciar hoje uma
queda nas projeções de crescimento para as principais economias européias, um crescimento
de 3,5% para os EUA neste ano e
melhora no Japão. Também serão
conhecidas as projeções para o
Brasil e a América Latina.
O Fundo deve ressaltar também
que os altos preços do petróleo e
investimentos insuficientes tanto
na produção quanto no refino do
produto continuarão a constituir
uma ameaça à economia global.
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