São Paulo, terça-feira, 21 de novembro de 2006

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VINICIUS TORRES FREIRE

Caindo e subindo pelas tabelas


Governos funcionam tão bem no Brasil quanto nos EUA, diz "ranking mundial de democracia" da "Economist"


NA OLIMPÍADA de Atenas, em 2004, o Brasil ficou em 18º lugar. Entre 175 países, há 120 outros melhores que o Brasil para tocar uma empresa, diz um ranking do Banco Mundial, o "Doing Business" de 2006. Para o banco, é melhor negociar no Paquistão, em Uganda, na Etiópia ou na Albânia do que no Brasil. Mais benevolente, o "ranking de democracia" da revista "Economist" nos coloca em honroso 42º lugar. "Mas onde é que nós estamos?", pode perguntar o leitor.
Estamos no blocão das "democracias falhas". Entre 167 países, só existem 27 "democracias plenas" nas contas do instituto de pesquisas da revista, a Economist Intelligence Unit, publicadas ontem.
Uruguai e Costa Rica são "democracias plenas". Chile (30º) e Itália (34º) são "falhas", mas nem tanto quanto a Argentina (54º). A Venezuela (93º) é um "regime híbrido" (de autoritarismo e democracia). Divertido é que, no ranking da "Economist", o funcionamento e a representatividade das instituições de governo nos EUA são tão bons como no Brasil. O grau de liberdades civis é mais alto no Brasil que nos EUA, no Reino Unido e na França.
Quase tão divertido, o Iraque é um "regime híbrido" (112º), mas melhor que "autoritários" como Marrocos, Paquistão ou Egito. Nada como a liberdade de voar: voar em milhares de pedaços devido a bombas de lunáticos americanos ou iraquianos.
A "Economist" avaliou quesitos como eleições, pluralismo, governo, participação e cultura políticas e liberdades civis. Misturou notas de politólogos, dados objetivos e pesquisas de opinião (em especial, no caso de participação e cultura políticas). Quanto menos gente participa de partidos, ONGs, manifestações e quanto mais apóia militares, tecnocratas e autoritários, pior a nota nos quesitos "participação" e "cultura", nos quais o Brasil "vai mal".
O tabelão da "Economist" não é bizarro. Cientistas políticos do mundo inteiro gostam de comparar assim o grau de democracia e liberdades. Comparações transversais podem ser úteis. Mas dados nus e crus por vezes produzem disparates.
O ranking da "Economist" é biruta? Lendo a tabela inteira, é fácil ver quantos buracos do inferno há sobre a face da Terra. Quando se observa a posição do Brasil nessa e noutras tabelas, percebe-se que costumamos ficar ali pelas médias medianas medíocres que nos parecem adequadas.
Existem rankings ainda mais disparatados, como aquele do Banco Mundial ou o da Repórteres Sem Fronteiras (o Brasil fica em 75º lugar de 161 países em termos de liberdade de imprensa). Mas, em educação, é difícil negar que estejamos em 72º lugar em 125 países (ranking Unesco). No IDH da ONU, que compara níveis de renda, educação e esperança de vida, em 65º. Normal.
No ranking de "competitividade" do Fórum Econômico Mundial, o Brasil fica em 66º lugar. Mas por que seríamos quase tão "competitivos" como El Salvador, Azerbaijão, Trinidad, Romênia ou Rússia? Dá para comparar tal diversidade, em termos de tamanho de economias, população, recursos, tecnologia etc.?
Enfim, ressalte-se que tais "rankings" sempre são acompanhados de receituários de políticas e reformas; boas ou não, representam sempre pontos de vista interessados.

vinit@uol.com.br


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