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LUÍS NASSIF
O poder da Hanna
Hoje em dia, a mineradora
Hanna Mining é um retrato na parede. Suas minas nos
EUA perderam competitividade, no mesmo ritmo da perda de
competitividade das siderúrgicas americanas. A empresa tentou mudar para o setor químico,
fez a conversão. Há alguns anos,
foi adquirida por um outro grupo. Até os anos 60, sua influência sobre o Partido Republicano
foi enorme e interferiu em muitas decisões do governo norte-americano em relação ao Brasil.
Uma das músicas favoritas do
Centro de Cultura Popular da
União Nacional dos Estudantes,
nos anos 60, aliás, era uma paródia do "Barracão" -"de zinco, sem telhado", porque o zinco
a Hanna levou.
Foi na condição de embaixador de Vargas em Washington,
em 1952, que Walther Moreira
Salles tomou contato, pela primeira vez, com a extraordinária
influência da mineradora.
O embaixador andava atrás
de um empréstimo do Eximbank para o Brasil, cerca US$
100 milhões, para o reaparelhamento da Central do Brasil, no
trecho Vale do Paraopeba/Angra dos Reis. O empréstimo dependia da concordância de
George Humphrey, secretário
do Tesouro e, como tal, diretor
do Eximbank. Certo dia, Walther foi convocado ao seu gabinete, onde foi alvo de uma chantagem explícita, da parte de seu
secretário, Randolph Burgues.
"Meu chefe não gosta de seu governo. Pretendeu obter as minas
de manganês do Amapá, e vocês
as entregaram à Bethlehem
Steel", disse ele. A Icomi, de Trajano de Azevedo Antunes, havia
conseguido a outorga para explorar o manganês do Amapá e
associou-se com a Bethlehem
Steel, rival da Hanna.
Devido à gravidade da crise
cambial, o governo brasileiro
aceitou trocar a Easterns Fuel
pela Pittsburgh Consolidation
Coal, controlada pela Hanna,
como fornecedora de carvão ao
país. Só depois de consumada a
operação, o empréstimo foi liquidado.
A Hanna foi criada no século
19 pelo senador Marcus Alonzo
Hanna (1837-1904), de Cleveland. Em 1885, reorganizou a
firma, que passou a se chamar
M.A. Hanna & Co. e, além da
mineração, explorava estaleiros, navios, bancos, construção
de linhas de bonde, a ópera de
Cleveland e o jornal "Cleveland
Herald".
Em fins dos anos 50, a Hanna
decidiu entrar em Minas Gerais,
liderando um consórcio de investidores que adquiriu o controle da "The Association for
Working the Mines of São João
d'El Rey Mining Company", associação constituída em 1830
para explorar minas em São
João Del Rey e São José, nas serras do Bonfim e do Lenheiro, em
Minas Gerais, cujo controle havia sido adquirido na Bolsa de
Londres pelo corretor nova-iorquino Leo Model, da firma Model & Roland.
No início do governo JK,
quando Lucas Lopes constituiu
o Conselho de Desenvolvimento,
em uma discussão sobre a Vale,
em 1956, Roberto Campos foi incisivo demais, segundo depoimento de seu amigo Casemiro
Ribeiro para o CPDOC: "Vende
a Vale do Rio Doce e vende para
a Hanna". Vender a Vale era
uma questão ideológica, mas
por que para a Hanna? Segundo
Casemiro, assessores de Campos
tentaram montar um rolo compressor, mas dois coronéis do
Grupo de Trabalho entraram
na parada e a discussão terminou. Veio desse episódio a fama
de "entreguista" de Campos.
Homem que salvou a Vale do
Rio Doce e, depois, as Minerações Brasileiras Reunidas
(MBR), de Trajano Antunes, da
Hanna, Eliezer Baptista dá um
desconto no depoimento de Casemiro. Campos era impulsivo,
ideológico, mas não negocista.
Tanto na Vale quanto na
MBR (onde foi trabalhar, depois
de cassado), Eliezer deu um "by-pass" na Hanna, estabelecendo
canais diretos de venda com o
Japão. A Hanna se associou à
MBR, mas sempre como minoritária, e jamais conseguiu que a
empresa se tornasse uma mera
fornecedora de matéria-prima
para a matriz americana.
Nos anos 60, a fama da Hanna pioraria no país devido ao
estilo do seu então presidente, o
brasilianista John Foster Duller
Jr., erudito e truculento como o
pai -secretário de Estado de
Eisenhower. Só após Lucas Lopes assumir a presidência da
Hanna no Brasil a empresa começou a se civilizar. Provavelmente porque seu tempo político já se esgotara, tanto aqui
quanto nos EUA.
E-mail - Luisnassif@uol.com.br
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