São Paulo, quarta-feira, 22 de fevereiro de 2006

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OPINIÃO ECONÔMICA

Os juros já podem ter uma queda significativa

JULIO GOMES DE ALMEIDA

Não houve discordância quanto a um ponto central no seminário promovido no último dia 16 em São Paulo e que reuniu economistas, políticos e empresários para debater o tema "Política Monetária e Crescimento Econômico no Brasil": as taxas de juros podem e devem cair no país. Em outras palavras, ninguém discordou da tese de que os juros estão em patamar errado, embora cada um dos seis palestrantes (dentre outros, os ex-presidentes do Banco Central Ibrahim Eris e Armínio Fraga) tivesse a sua própria avaliação quanto à magnitude do erro, assim como quanto às medidas de ajuste da política monetária que se fazem necessárias para facilitar o processo de queda das taxas de juros.
Ou seja: a redução dos juros pode ser feita incondicionalmente, sendo, porém, mais consistente se for acompanhada de outras medidas. O Iedi vem alertando precisamente sobre esse ponto, vale dizer, que a queda da taxa de juros pode ter início desde já, sem condicionalidades, pois importantes mudanças na economia a tornaram muito menos propensa a surtos inflacionários. Vamos citar apenas alguns dentre muitos exemplos.
No nível empresarial, os avanços quanto à produtividade, à logística e à gestão permitem que o setor produtivo tenha muito maior flexibilidade no ajuste de capacidade produtiva, o que o torna capaz de abastecer os mercados de bens e serviços mesmo na hipótese de significativa reativação da demanda. No nível macroeconômico, os elevados superávits comerciais e a acumulação de reservas dos últimos anos já permitem baixos níveis de risco, para os quais, cedo ou tarde, deverá convergir a taxa de juros interna.
Contudo, é necessário assegurar que a redução da nossa taxa de juros para um nível semelhante ao das economias emergentes de maior êxito econômico (em torno a 2% a 5% reais) tenha sustentação a médio e longo prazos e, para isso, será preciso que o país venha a promover uma expressiva redução do gasto público que atualmente já supera 40% do PIB e que vem crescendo a uma taxa muito alta (10% em termos reais). O agravante em nossa situação é que não devemos seguir à risca certos exemplos de ajuste público em países desenvolvidos apontados como modelos de referência, pois, ao contrário desses casos, o Brasil não pode sacrificar os gastos sociais. Teremos que ser mais criativos e, como alternativa aos cortes dramáticos na área social, devemos dar grande ênfase ao desenvolvimento gerencial do setor público, à supressão de privilégios e ao combate à informalidade, além de aprofundar as reformas (da previdência, tributária etc.).
Ademais, será importante fazer com que a capacidade de produção cresça à frente do consumo. O objetivo é aumentar a taxa de investimento da economia e afastar de vez o fantasma inflacionário derivado de uma insuficiente evolução da capacidade produtiva diante de uma reativação da demanda. Um programa de investimento é sugerido para incentivar por pelo menos três anos o investimento privado por meio da redução dos elevados custos tributário e de financiamento do investimento que vigoram no Brasil. E, ao nível do setor público, são imprescindíveis um programa de sustentação dos recursos para inversões em infra-estrutura, educação e inovação, além de ações para desenvolver a regulação para atrair investimentos privados em infra-estrutura.
Maior arrojo na redução da taxa de juros o que é perfeitamente factível nas condições atuais e a execução de planos audaciosos de ajuste do setor público e de retomada de investimentos serão as garantias de que a economia enfim deixará para trás o longo período de sacrifícios impostos pelos juros excessivos para retomar o caminho do desenvolvimento.


Julio Gomes de Almeida é diretor-executivo do Iedi (Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial).

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