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Início de safra enfrenta colapso do transporte de grãos
Reportagem cruza um dos principais corredores de exportação do Centro-Oeste e constata infraestrutura precária no país
Obra de duplicação do trecho Rondonópolis-Posto Gil (MT), por onde passa 15% do agronegócio, ainda é só uma promessa do PAC
AGNALDO BRITO
ENVIADO ESPECIAL AO CENTRO-OESTE
O jatinho com o ministro dos
Transportes, Alfredo Nascimento, se aproxima do aeroporto de Rondonópolis (MT).
Wenderson Moreira, o Pretinho, sua em bicas, enquanto
procura um maldito fusível do
ar-condicionado que achou de
pifar. Três fusíveis depois, a boleia do caminhão bitrem está
com temperatura de gabinete.
Ministro embarcado, rodovia
interditada para a visita, começa a viagem de 20 quilômetros
em um dos mais importantes e
movimentados corredores de
exportação, a BR-163. Minutos
depois, Nascimento anuncia
um pacote de obras previstas
no PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), entre as
quais a mais esperada: a duplicação do trecho de 300 quilômetros entre Rondonópolis e
Posto Gil (MT), por onde passa
15% do agronegócio brasileiro.
Oito meses depois, a reportagem da Folha embarcou na
mesma cabine climatizada do
bitrem visitada pelo ministro.
Saindo de Rondonópolis, subindo até Sorriso (MT) e retornando no "caminho da soja".
Depois de cruzar 24 cidades e
percorrer 2.470 quilômetros
sobre estradas exauridas entre
os Estados de Mato Grosso e
Goiás, a constatação é a de que
as obras do PAC existem apenas no papel e que o sistema de
escoamento está em colapso.
A precária infraestrutura de
escoamento começa a ficar cara demais, além do limite viável
para despacho da produção rumo aos portos. A escalada de
preços para o transporte não
explodiu graças à crise, que esfriou a demanda internacional.
Mas isso não elimina o esfacelamento dos corredores de exportação.
Da ineficiência para carregamento dos caminhões às longas esperas para descarregamento nos terminais. Dos buracos gigantes que ornam estradas em agonia à ausência de
acostamento para constantes
emergências. Do mato que engole a parca sinalização que poderia avisar de riscos escondidos na traiçoeira estrada ao
completo abandono de longos
trechos de rodovias federais
por onde não se transita com
velocidade superior àquela dos
tempo das velhas diligências.
A questão já é econômica.
Levantamento do Imea (Instituto Mato-Grossense de Economia Agropecuária) mostra
que, se o Estado fosse uma única fazenda, o custo total de produção e transporte superaria
hoje a receita por hectare. Isso
não vale para todos, mas, para
alguns, sim. "O custo do transporte, a ser mantido como está,
em alguns anos pode inviabilizar a produção em parte de
Mato Grosso", diz Cid Ferreira,
gerente de planejamento da
Aprosoja (que reúne os produtores de soja de Mato Grosso).
Os custos de produção e
transporte fazem a distância de
Mato Grosso em relação ao Paraná aumentar. Na colheita
neste momento, o Paraná terá
uma vantagem em custos de
31% sobre Mato Grosso. A razão disso? O transporte.
Tomadas só as despesas de
frete, a diferença é ainda maior,
alcançando US$ 225 por hectare na soma dos custos de escoamento entre os dois grandes
produtores de soja do país. O
custo de frete no Paraná é de
US$ 135/ha, em Mato Grosso
será de US$ 360/ha nesta safra.
Basta percorrer os corredores das BRs 163 e 364 pelos
quais a reportagem da Folha
cruzou para entender o tamanho do problema. Pelo trecho
passam 10 mil caminhões por
dia numa rodovia que não suportaria a metade. Um terço da
frota de caminhões tem mais
de sete eixos. Cada eixo, com
peso de dez toneladas, em uma
pista que foi construída para
suportar seis toneladas.
Aberta nos anos 60, a BR-163
exauriu. É uma evidência, admitida inclusive pelo governo,
do esgotamento da infraestrutura e um obstáculo para novos
saltos de competitividade.
A situação não é melhor na
rodovia federal BR-452, que interliga Rio Verde a Itumbiara,
em Goiás. Aliás, é bem pior. Ali,
o piso ganhou até um apelido:
asfalto Sonrisal.
A reportagem tomou mais de
seis horas para cruzar os 197
quilômetros. A impressão percorrendo o caminho era a de
estar cruzando uma estrada em
zona de guerra, em área sob intenso bombardeio aéreo, tal a
quantidade de buracos na pista. A velocidade em alguns trechos não superou 10 km/h.
Sentado à beira de um buraco gigante no meio da rodovia,
Carlos Alberto Freitas, 46, enumera os prejuízos frequentes
com o caminhão. Freitas transporta bagaço para fornos de secagem de soja e é um dos poucos obrigados a usar a estrada
mesmo não havendo condições. "Antes, o governo mandava um caminhão de asfalto para
jogar na estrada, agora nem isso. Sinceramente, isso aqui
precisa ser reconstruído", diz.
A estrada era uma das principais rotas de escoamento de
boa parte dos 11 milhões de toneladas de grãos da produção
goiana que rumam para os portos de Santos e Paranaguá. As
alternativas estão igualmente
destruídas. Um exemplo pode
ser visto na GO-206, saída para
Mato Grosso do Sul. Há um
ano, o rompimento de uma
barragem destruiu a ponte sobre o rio Corrente. Hoje, uma
pequena balsa suporta caminhões pequenos, mas as grandes carretas estão proibidas de
transitar pelo corredor.
Com isso, os prejuízos com o
transporte da produção vão se
somando e tomando pouco a
pouco a competitividade da região. "Tivéssemos aqui a produtividade por hectare do Rio
Grande do Sul, não teríamos
mais produção. O Centro-Oeste sobrevive queimando os ganhos da produtividade", afirma
Pedro Arantes, analista da Faeg
(Federação da Agricultura e
Pecuária de Goiás).
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