São Paulo, quarta-feira, 22 de abril de 2009

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Estrangeiro retoma especulação com juro

Bancos veem a volta de fundos agressivos, que emprestam dinheiro no exterior para investir com retorno maior no Brasil

Diferença de juros entre Brasil e EUA, que chega a dez pontos percentuais, e menor instabilidade no câmbio estimulam investidor

TONI SCIARRETTA
DA REPORTAGEM LOCAL

Sete meses após o agravamento da crise, o mercado brasileiro voltou a sentir a volta do investidor estrangeiro de perfil agressivo, especialmente os fundos de hedge americanos, que buscam ganhos em curto prazo com os juros ainda altos e ações baratas no Brasil.
Segundo bancos estrangeiros, esse investidor está agora menos alavancado e volta de forma tímida, com volumes bastante inferiores aos vistos até meados do ano passado. O objetivo é ganhar com a diferença de rentabilidades no Brasil, em relação ao dinheiro captado dos clientes e mesmo emprestado em seus países de origem, o chamado "carry trade".
Só que essas operações -especulativas porque trabalham com projeções de cenários- só fecham se a moeda brasileira tiver trajetória estável ou ascendente, como perdurou até meados de 2008. Com alta volatilidade, o eventual ganho com juro maior -hoje de dez pontos percentuais acima de EUA, Europa e Japão- pode ser corroído em poucos dias pelo câmbio.
"É verdade que esse investidor está voltando. Mas em proporção muito menor do que se via. O juro no Brasil ainda é muito alto. Tem um "carry trade" pesado para fazer aqui", disse Pedro Lorenzini, diretor de tesouraria do Citibank.
A volta do estrangeiro é notada pela entrada, ainda modesta, de recursos na primeira metade deste mês, que levou o dólar a recuar até 6,7% e a bater em R$ 2,17 na última quinta. Na Bovespa, as aplicações líquidas de estrangeiros já somam R$ 2,96 bilhões em abril. Segundo o BC, os estrangeiros trouxeram nos primeiros sete dias úteis do mês US$ 287 milhões -mais do que os US$ 62 milhões de todo o mês de março.
A consultoria EPFR global, que mede o fluxo de dinheiro entre os fundos, aponta a entrada de US$ 255 milhões no Brasil em abril -no ano, a captação já chega a US$ 1,36 bilhão.
Na ponta oposta, houve venda maciça de títulos dos EUA, cujos papéis de dez anos tiveram o retorno elevado de 2,5% a quase 3% ao ano em menos de 30 dias -a taxa sobe conforme cai a procura. Em abril, os fundos de renda fixa de países desenvolvidos tiveram saques de US$ 18,1 bilhões, enquanto US$ 3 bilhões migraram para a renda fixa de alta performance, incluindo emergentes como o Brasil, segundo a EPFR.
De acordo com Sidnei Nehme, especialista em câmbio, os fundos estrangeiros mudaram de lado na BM&F na semana passada, passando a apostar na valorização do real. Na Bolsa, as apostas na alta do dólar caíram de US$ 3,3 bilhões para US$ 275 milhões, de 1º a 15 de abril. "Se esse movimento se acentuar, poderá agilizar a valorização do real", disse Nehme.
Com a alta do real, o "carry trade" ganha duas vezes: o juro maior e o câmbio de saída.
Para Carlos Rocha, responsável pela gestão de fundos do JPMorgan, a volta do especulador estrangeiro ainda é incipiente, apesar da diminuição do risco cambial e da melhora da confiança externa.
"A gente vê o investidor estrangeiro entrando de volta, fazendo operações, mas ainda esporádicas. Apesar de a volatilidade do câmbio estar mais baixa, o mercado ainda chacoalha muito mais do que em 2007. O "carry trade" não está tranquilo com esse nível de volatilidade. Ele começa a ficar mais viável. O arbitrador entrava para ganhar um diferencial de juros de dez pontos e podia perder isso em três dias no câmbio -essa arbitragem com taxa de juros deixava de fazer sentido; agora, começa a fazer sentido."
Lorenzini diz que o mercado vive um dilema sobre se o fundo do poço já passou ou se a melhora não passa de um soluço. "Se você acredita que é o início do fim da crise e tem um pouco de capital para apostar, começa a fazer um pouco aqui e ali [de "carry trade']. A gente sente alguns estrangeiros indo para a renda fixa. Quando entra em renda fixa, fatalmente faz "carry trade" porque carrega um custo de capital mais baixo, seja ele de EUA, Japão ou Europa."
Para Keith Gardner, responsável por emergentes da Legg Mason, maior gestora de renda fixa do mundo, a redução dos juros no Brasil não deve desestimular a entrada de estrangeiros. "Muitas pessoas reduziram suas posições em "carry trade" no Brasil por causa das incertezas sobre o ciclo global. Mas o Brasil está mais estável do que muitos imaginavam. O país continuará sendo um dos mais atraentes para investimento em portfólio, inclusive pela liquidez, que é uma das maiores do mundo", disse.


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