|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Recessão do crédito persiste para as pequenas empresas
Pesquisa aponta que 63% das micro e pequenas ainda são afetadas pela crise
Queda na demanda e
dificuldade para conseguir
empréstimo são principais
problemas; impacto é maior na indústria e no agronegócio
CLAUDIA ROLLI
DA REPORTAGEM LOCAL
Quatro em cada dez micro e
pequenas empresas do país reclamam que ainda não há melhora na oferta de crédito oferecido pelos bancos, apesar das
várias medidas anunciadas pelos governos federal e estaduais
para incrementar os financiamentos e aliviar o caixa dos empreendimentos, atingidos pela
crise financeira mundial.
É o que mostra levantamento
feito, a pedido da Folha, pelo
Sebrae-SP com 4.200 micro e
pequenas empresas (MPEs) de
todos os Estados e distribuídas
pela indústria, pelo comércio e
pelo setor de serviços. A pesquisa, feita entre 16 de março e
15 de maio, é a primeira de âmbito nacional com o objetivo de
avaliar os reflexos da crise nesse segmento empresarial.
A crise não apenas afetou,
mas ainda afeta os negócios de
63% dessas empresas. Queda
na demanda e dificuldade para
obter crédito -que, além de
mais disputado, passou a ser
mais caro- são os principais
impactos sentidos pelas MPEs.
Os efeitos são piores para
empresas do setor industrial e
do agronegócio, cujas atividades são mais voltadas para exportação. Ou naquelas que fabricam produtos para o mercado interno com alto valor unitário e que dependem da concessão de crédito para vender
ao consumidor -caso de eletroeletrônicos e móveis.
Entre os empresários do comércio e dos serviços, setores
mais dependentes da renda do
consumidor, os impactos são
menores. Nesse caso, a queda
da demanda ocorre porque o
consumidor teme a incerteza
da economia e, por isso, adia as
compras de longo prazo.
Enquanto 42% das empresas
reclamam que persiste a dificuldade para conseguir empréstimos, 28% nem sequer sabem responder a questão. Só
30% notaram melhora.
Em setembro do ano passado, antes de as turbulências internacionais afetarem o Brasil,
o BNDES (Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e
Social, um dos poucos canais
das empresas para conseguirem empréstimos com juros
menores e prazos maiores) havia emprestado R$ 1,159 bilhão
às micro e pequenas que buscaram financiamento nas linhas
de crédito disponíveis para esse segmento. Esse valor representava 14,3% do total emprestado para empresas de todos os
portes, ou R$ 8,128 bilhões.
Em abril deste ano, o segmento das MPEs conseguiu financiamentos que, somados,
chegaram a R$ 818 milhões
-10,6% do total emprestado
pelo BNDES a todas as empresas (R$ 7,721 bilhões). O valor
emprestado é 30% menor do
que o de setembro de 2008.
"O problema do crédito continua presente. Burocracia,
exigências exageradas para que
a empresa dê garantias reais de
que vai cumprir as regras do
empréstimo e desinformação
ainda são problemas constantes no dia a dia desse perfil de
empreendedor. Com a crise, as
exigências se acentuam", diz
Ricardo Tortorella, diretor-superintendente do Sebrae-SP.
Desinformação
Tatiana Tichauer, proprietária da Doctor Clean, indústria
de produtos antissépticos, diz
que a expansão da empresa e a
contratação de mais empregados esbarram no jogo de empurra-empurra e desinformação dos próprios bancos.
"Com a questão da gripe suína, as nossas vendas aumentaram. Preciso de empréstimo
para promover ações em pontos de venda e não tenho conseguido crédito para capital de giro. Não quero comprar máquinas, como oferecem algumas
poucas linhas existentes."
A empresária passou os últimos 60 dias esperando uma
resposta de um banco que a havia informado, equivocadamente, de que conseguiria o financiamento no BNDES. "Agora, a informação é outra. A linha
que buscava não existe."
A justificativa do setor financeiro para aumentar as exigências e selecionar ainda mais os
clientes é o risco de inadimplência -que, segundo dados
do Banco Central, cresceu tanto para pessoas físicas como para empresas. Em abril, os calotes representavam 5,2% dos
empréstimos comerciais (crédito pessoal, cheque especial e
empréstimos de capital de giro
às empresas). O nível foi o mais
alto desde outubro de 2000.
Erros e acertos
Para Fábio Pina, economista
da Fecomercio SP, o governo
acerta ao forçar os bancos públicos a baixar os juros para
empréstimos a empresas e a fomentar a criação de fundos para estimular a ampliação dos financiamentos, mas o maior
problema é a demora na implementação das medidas. "Até os
recursos, que estão mais escassos, caros e disputados, chegarem à praça demora muito."
Há duas semanas, o governo
editou medida provisória que
libera R$ 4 bilhões da União para criar dois fundos que visam
garantir operações de crédito
para micro, pequenas e médias
empresas e para trabalhadores
autônomos. A expectativa é dar
cobertura para que R$ 48 bilhões sejam concedidos em empréstimos a partir de julho.
O governo pretende, com a
medida, estimular o mercado
financeiro a voltar a emprestar
para as pequenas e a reduzir o
"spread" (diferença entre os juros pagos pelos bancos ao captar recursos no mercado e a taxa cobrada dos clientes) nos financiamentos às empresas.
"O "spread" foi reduzido para
crédito consignado, financiamento de automóveis e grandes
empresas, mas não para as médias e pequenas", afirma Milton Bógus, diretor titular do
Departamento da Micro, Pequena e Média Indústria da
Fiesp (federação das indústrias
paulistas). "Quando a taxa Selic
cai um ponto percentual, os juros para linhas de capital de giro baixam de 32,7% para 32,5%
ao ano. Ou seja, nada."
A falta de crédito pode até
afetar o abastecimento, segundo avalia, em alguns segmentos
que se beneficiam do consumo
direto, caso de alimentos, confecções e calçados. "Em junho,
notamos melhora gradativa no
emprego e na demanda. Mas,
sem crédito, as empresas não
conseguem capital para comprar matéria-prima e fazer a
produção girar. Se a demanda
não é atendida, o abastecimento pode ser prejudicado."
Expectativa
A disponibilidade do crédito
só deve melhorar, na avaliação
de Fabio Silveira, economista
da RC Consultores, a partir do
último trimestre deste ano.
"Mas isso deve ocorrer apenas
se não houver novas turbulências externas, o que não está totalmente descartado."
Para o Sebrae-SP, as expectativas para o segundo semestre
são positivas. "Quase metade
dos entrevistados prevê que o
faturamento vai aumentar, o
que é até esperado, já que deve
ocorrer a reposição das perdas.
E 66% acreditam que o nível de
emprego deva se manter. O empresário já vê mais que uma luz
no fim do túnel, começa a soltar
o freio", diz Tortorella.
Texto Anterior: Mercado Aberto Próximo Texto: Agência paulista deve oferecer R$ 150 milhões a partir de julho Índice
|