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Sem cláusula, comissário europeu
vê explosão de ações entre países
DA REPORTAGEM LOCAL
O tom do discurso do comissário da União Européia para a
Agricultura, Franz Fischler, 57, sinaliza que as negociações da reunião ministerial da OMC (Organização Mundial do Comércio) em
Cancún vão ter dois nós.
O primeiro: a discussão sobre a
redução de subsídios. "Nem todos os subsídios agrícolas são
ruins e não há como eliminar toda
a ajuda que concedemos aos produtores europeus", disse.
O segundo: a questão da prorrogação da Cláusula da Paz. "Se a
Cláusula da Paz não for prorrogada, vamos assistir a uma explosão
do número de contenciosos entre
os países-membros da OMC".
O pedido brasileiro- ao lado
da Tailândia e da Austrália- para a abertura de painel (comitê de
arbitragem) na OMC contra os
subsídios europeus ao açúcar
também dão uma mostra do campo de batalha que será Cancún.
Ontem, a União Européia exerceu o direito de bloquear a abertura de painel. Para Fischler, esse
contencioso reflete uma ação extrema e prejudicial para os países
ACP (África, Caribe e Pacífico),
que são extremamente dependentes da renda das exportações
de açúcar.
Roberto Rodrigues, ministro da
Agricultura, rebate: "Defender os
interesses do Brasil e pleitear redução de subsídios não é ação extrema".
A seguir, a entrevista concedida
por Fischler à Folha.
(CC)
Folha - Quais as perspectivas do
sr. com relação à rodada interministerial em Cancún, em setembro?
O sr. se considera otimista?
Franz Fischler - Sou realista. Sei
que as negociações serão muito
duras porque há interesses muitos diferentes em jogo. Não vai
haver consenso, a não ser que os
países em desenvolvimento -especialmente os mais pobres, que
dependem de cotas preferenciais- sintam que há propostas
que os beneficiem.
Folha - Quais seriam os principais
entraves ao avanço das negociações em Cancún?
Fischler - A União Européia já
avançou bastante na questão de
subsídios com a reforma da PAC
[política agrícola da UE] e isso vai
refletir em Cancún. Fizemos um
grande esforço para eliminar as
práticas que distorcem o comércio. A dificuldade será conciliar
posições extremas. No caso do
Grupo de Cairns [18 países grandes produtores e exportadores
agrícolas, entre eles o Brasil], há a
ênfase na redução total dos subsídios e a luta por maior acesso a
mercados. Só que nem todos os
subsídios agrícolas são ruins e
não há como eliminar toda a ajuda que concedemos aos produtores europeus. Quanto ao acesso a
mercados, a UE hoje já e o maior
importador de produtos agrícolas
e o principal importador de alimentos dos países em desenvolvimento e dos LDCs [sigla em inglês
para designar os países menos desenvolvidos]. No caso dos EUA, o
problema é que eles querem interferir, opinar e solicitar que nós, da
UE, façamos reformas profundas
nos subsídios, coisa que já fizemos, mas eles não querem modificar suas regras sobre a questão.
Na minha avaliação, a UE tem
uma posição intermediária. Temos um compromisso com o
avanço das negociações, mas todos os países -especialmente os
desenvolvidos- têm de se comprometer com as mudanças.
Folha - No Brasil, alguns setores
têm a percepção de que as negociações entre o Mercosul e a União Européia nos temas agrícolas poderiam caminhar mais rápido que
aquelas na OMC. Como o sr. vê isso?
Fischler - São duas negociações
diferentes, com objetivos diferentes. Na OMC, temos questões
mais abrangentes, que tratam de
estabelecer regras e negociar modalidades. Já com o Mercosul há
discussões mais pontuais, como a
diminuição de tarifas. Ambas são
importantes e podem correr paralelamente. No final de agosto,
haverá um encontro entre os representantes dos dois blocos, mas
não dá para prever o andamento
dessas negociações. Neste momento, temos que dar importância às negociações no âmbito bilateral. Um fracasso em Cancún poderia ter consequências desastrosas para o comércio mundial.
Folha - O término da Cláusula da
Paz no final de 2003 também pode
contribuir para acirrar as tensões
no comércio internacional. A UE defende a prorrogação da cláusula?
Fischler - A UE não postulou nenhum pedido de prorrogação da
cláusula. Porém acreditamos que
se a cláusula da paz não for prorrogada, vamos assistir a uma explosão do número de contenciosos entre os países-membros da
OMC. Esse cenário ainda pode ser
agravado se as negociações em
Cancún falharem. A nossa posição é negociar com os membros
da OMC e procurar estabelecer as
bases para uma nova Cláusula da
Paz entre todos. Ela é um instrumento importante. Um aumento
do número de "panels" [comitês
de arbitragem] entre os países-membros só tende a prejudicar o
comércio internacional e a emperrar a agenda da OMC.
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