|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
depoimento
Embarque no exterior provoca revolta resignada
FÁBIO VICTOR
EM LONDRES
Justamente quando parece surgir uma luz no fim da
pista para a Varig, são trevas
inacreditáveis que acompanham os passageiros que
tentam voar nestes dias pela
companhia. Eu vi a treva kafkiana ontem no aeroporto de
Heathrow, em Londres.
Como quase todos, o vôo
Londres-São Paulo, RG8757,
que sairia às 22hs, foi cancelado. A Varig precisava, então, endossar o bilhete para
que uma outra companhia
aérea transportasse seus
náufragos. Fui à loja, no terminal 3. A fila, às 19h30, era
curta, mas caótica, e cada pequena tragédia particular a
tornava mais infernal do que
tantas outras bem maiores
que inundavam o aeroporto
àquela altura.
Era uma revolta resignada
a dos náufragos. Todos ouviam dos funcionários que a
companhia não pagaria hotel
nem transporte para quem
precisasse pernoitar em
Londres - algo praticamente inevitável, já que raros
passageiros conseguiram ser
acomodados em vôos de outras empresas.
"A Varig não tem dinheiro
nem pra pagar os funcionários, como vai pagar hotel?",
disse uma das atendentes no
meio da fila, o escárnio soando como algo banal. "A senhora paga o hotel, pega a
conta e depois tenta receber
do seguro de viagem."
"Vou botar na Justiça," retrucou a náufraga, que tinha
uma conexão por Milão e cujas malas estavam perdidas.
Um casal jovem, com sotaque mineiro, que dizia estar
ali desde as 16hs, abriu um
sorriso aliviado quando lhe
deram a solução de voar via
Nova York. Pouco depois,
mudaram a opção: teriam de
dormir em Londres por conta própria, pegar um vôo para Miami hoje cedo, de Miami ir para Manaus, e de lá para São Paulo, chegando na
segunda-feira. O casal fechou a cara de novo.
Um senhor ao lado nem
com essa opção contava, já
que não tinha visto para os
Estados Unidos. "Mas me coloquem em qualquer vôo para qualquer lugar da Europa.
Quero sair daqui hoje", implorou. "Mas o senhor depois
volta como para o Brasil?",
perguntou a mocinha, tentando ser amável. Ele não
soube responder e deixou o
balcão.
Eu só queria pegar o endosso, o que me custou uma
hora, pois a Varig teve de reemitir meu bilhete perdido
-a base de Londres é a única
da companhia talvez do
mundo que ainda não trabalha com tíquete eletrônico,
pelo que queria me cobrar
setenta libras. "Mas vocês
cancelam o vôo, não pagam
nem um metrô para os passageiros e querem cobrar
uma reemissão de bilhete?!",
argumentei. Acabaram sem
cobrar.
Mas continuo em Londres,
não sei até quando.
Texto Anterior: Novo corte de vôos tumultua aeroporto Próximo Texto: Chilenos são "abandonados", e funcionário sugere deportação Índice
|