São Paulo, Domingo, 22 de Agosto de 1999
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CÂMBIO
Analistas dizem que a moeda deve chegar em setembro a R$ 1,90, mas depende de atuação do governo
Só virada política pode segurar dólar

MARCELO DIEGO
RICARDO GRINBAUM

da Reportagem Local


A manobra executada pelo Banco Central anteontem, que evitou a ultrapassagem da marca simbólica de dois reais por dólar, não pode ser repetida sempre. Ao vender títulos com valor atrelado à moeda norte-americana, o BC acalmou o mercado, mas voltou a alimentar sua dívida em dólares.
Para os economistas ouvidos pela Folha, o câmbio só melhora com sinais de virada no campo político. Os analistas estão confiantes de que isso possa ocorrer e que, em um mês, o teto do dólar fique em torno de R$ 1,90.
"Em todo o mundo, intervenções no câmbio só dão resultado se forem alterados os fundamentos que estão provocando problemas na economia. E, no caso brasileiro, a causa é política", diz José Júlio Senna, ex-diretor do BC.
A grande razão que está levando bancos e empresas a comprar avidamente dólares ou títulos atrelados à moeda norte-americana é a desconfiança de que o governo não tem mais força para impor reformas e garantir um ajuste fiscal definitivo. Além disso, há o medo do aprofundamento da crise na Argentina ou de uma alta dos juros nos Estados Unidos.
Se não ocorrer nenhuma surpresa, dizem os analistas, o calendário político pode trazer alívio.
"No dia 31, o governo apresenta o Orçamento para o ano 2000. Há uma análise de que o ajuste fiscal deste ano se deve apenas a receitas extraordinárias. É uma análise equivocada. Os resultados de curto prazo têm sido bons e podem continuar no ano que vem", afirma Carlos Kawall, economista-chefe do Citibank.
Apesar do temor difundido no mercado e refletido no câmbio, os economistas dizem que os fundamentos econômicos estão bons.
"A situação fiscal não é ruim, o PIB (Produto Interno Bruto) mostrou crescimento e a inflação, a despeito dos aumentos de tarifas, está sob controle", afirma Rubens Sardenberg, economista do ABN Amro Bank.
Para o ex-ministro Mailson da Nóbrega, a situação política também é melhor do que parece. "Estão comparando a baixa popularidade do presidente Fernando Henrique com a dos ex-presidentes Collor e Sarney. É um exagero", diz Nóbrega, que foi ministro da Fazenda no final do governo Sarney (88-89).
"No governo Sarney, havia a crise da dívida externa, a inflação estava alta e o presidente estava sendo abandonado pela base política. O governo não tinha como inverter a situação."
Se o Brasil não está vivendo uma forte crise política e econômica, como dizem os especialistas, por que não diminui a pressão sobre o câmbio? "O dólar está nitidamente superavaliado, mas não se pode descartar uma nova alta porque tudo depende da percepção que o mercado tem da situação política", diz o ex-presidente do BC Gustavo Loyola.
Por isso, dizem os economistas, o governo precisa dar sinais de que tem força para fazer as reformas que promovam o ajuste fiscal.
Um efeito colateral de toda a confusão no câmbio pode até ser uma melhora da situação fiscal. Com o dólar em alta, há pressão por alta de preços. Os reajustes corroem a renda da população em geral, incluindo os salários do funcionalismo público. "As contas públicas podem melhorar, mas com custos para a população", diz Danny Rappaport, do Banco Santander.
Para o economista Eduardo Giannetti da Fonseca, professor da Faculdade de Economia e Administração da USP, a grande inquietação é com uma desvalorização excessiva do real, atrelada a economia aquecida e a juros baixos. "A experiência do início do ano foi feita sob outras circunstâncias, com a economia desaquecida", afirma. Para ele, segurar os juros e reduzi-los mais (estão em 19,5% ao ano) é "a batalha de vida ou morte" do BC adiante. "É mais importante do que a crise no câmbio."


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