São Paulo, Domingo, 22 de Agosto de 1999
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MERCADO TENSO
Governo dispensou US$ 4,3 bi porque pagaria juros e não poderia usá-los para segurar câmbio
Terceira parcela do FMI não seria útil

MARCIO AITH
de Washington

Ao contrário da mensagem que o governo brasileiro pode ter tentado passar aos mercados ao anunciar que não sacaria a terceira parcela do empréstimo organizado pelo FMI (Fundo Monetário Internacional) no ano passado, rejeitar dinheiro do Fundo não é prova de tranquilidade financeira, muito pelo contrário.
Desde que instituiu o câmbio livre e revisou seu programa com o Fundo no primeiro trimestre, o governo se comprometeu com regras que limitam drasticamente a possibilidade de intervenção no câmbio e estabelecem níveis mínimos de reservas.
Portanto, o dinheiro da parcela de US$ 4,3 bilhões do FMI não poderia, de qualquer maneira, ser usado para segurar o valor da moeda. O governo levantaria esse dinheiro e, provavelmente, seria obrigado a assistir à desvalorização do real, como vem fazendo.
Diante de tal situação, rejeitar o dinheiro foi uma estratégia rotineira que tem sentido somente em outro plano. O plano da falta de opções.
O país paga taxas de juros (de mercado) sobre os empréstimos do FMI que levanta. É mais interessante, portanto, buscar essa terceira parcela só em casos extremos de crise no balanço de pagamentos, financiando importações e pagando juros da dívida externa.
Nesse caso, a decisão do governo foi rotineira e lógica. Mas seu anúncio, feito pelo diretor de Assuntos Internacionais do BC, Daniel Gleizer, revela uma contradição do governo.
A equipe econômica tem divulgado com destaque algumas decisões com relação ao programa do FMI e escondido outras.
No dia 17 de junho passado, os mercados ficaram sabendo pelo presidente dos EUA, Bill Clinton, que o Brasil havia decidido pagar somente 30% da primeira parcela de US$ 4,15 bilhões que pegou do BIS (Banco para Compensações Internacionais) e cujo pagamento vencia naquele dia.
"O Brasil indicou que não seria aconselhável pagar 100% das primeiras parcelas do acordo agora, dada a persistência dos riscos e incertezas da economia global", disse Clinton ao Congresso.
Provavelmente por entender que tal notícia poderia dar um sinal de fragilidade aos mercados -embora ela também seja rotineira-, ela não foi anunciada no Brasil

Agradecimentos
No FMI, a decisão brasileira de não levantar a terceira parcela do empréstimo foi vista com pouca surpresa, embora o ministro da Fazenda, Pedro Malan, tenha escrito cartas comunicando o fato a autoridades norte-americanas num clima de agradecimento e de entusiasmo com a situação do país.
A diretoria do Fundo está preocupada com o câmbio brasileiro, e não com o volume de recursos que o país levanta na instituição.
Além disso, o Fundo sabe que o Brasil não é pioneiro na decisão: Argentina, Peru, Uruguai, El Salvador e Cabo Verde fazem parte da enorme lista de países que tiveram dinheiro liberado pelo FMI, mas não o levantaram.


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