São Paulo, quinta-feira, 22 de setembro de 2005

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OPINIÃO ECONÔMICA

Envelheçam, rápida e urgentemente!

PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.

No brasil , a política monetária tem sido conduzida, em grande medida, por economistas acadêmicos treinados nos EUA, relativamente jovens e com pouca experiência prática.
Certa vez, perguntaram a Nelson Rodrigues que conselho ele daria às novas gerações. Resposta: "Envelheçam, rápida e urgentemente!". Para ele, o jovem tinha todos os defeitos do ser humano e mais este: a imaturidade. Agora, que já cheguei aos 50, estou achando esse conselho de uma sabedoria total.
Dei essa pequena volta para falar um pouco do presidente do banco central dos EUA, Alan Greenspan, 79 anos, que deixará o cargo em janeiro próximo. Como quase tudo em economia, o seu desempenho nos 18 anos em que ocupou o cargo é objeto de controvérsias. O célebre economista Paul Krugman, por exemplo, é um crítico bastante severo. Já Alan Blinder, outro conhecido economista americano, tem uma avaliação geral muito positiva. A opinião predominante é basicamente favorável.
Seja como for, vale a pena examinar a atuação de Greenspan, pois ela contrasta flagrantemente com princípios e teorias ensinados, não raro com certo dogmatismo, nos departamentos de economia das universidades norte-americanas. Vários dos nossos jovens economistas formam-se lá e voltam encantados e seduzidos, prontos para fazer o "dever de casa". Alguns entram para a diretoria do Banco Central, poucos anos depois, e aplicam com o fervor dos neófitos as regras e os modelos que aprenderam nos bancos escolares norte-americanos ou no FMI.
Os resultados vêm sendo bisonhos, como se sabe. Metas exageradas de redução da inflação, as taxas de juro mais altas do mundo, sobrevalorização cambial, crescimento econômico modesto, desemprego elevado, pesada carga de juros para o governo e concentração da renda nacional.
Os nossos jovens banqueiros centrais teriam se beneficiado de um estágio com Greenspan. A marca da sua gestão é a flexibilidade. O presidente do BC americano é um empirista e um pragmático. Não segue regras formais nem confia cegamente em modelos, teorias e previsões quantitativas. Recusou, por exemplo, insistentes recomendações de que o BC americano adotasse o modelo monetário da moda em certos meios: o regime de metas para a inflação (aplicado no Brasil desde 1999).
Até meados dos anos 90, o "consenso" acadêmico nos EUA era razoavelmente pessimista sobre o potencial de crescimento da economia. Muitos estimavam a taxa "natural" de desemprego nos EUA (a taxa de desemprego compatível com a não-aceleração da inflação) em torno de 6%. Se Greenspan tivesse aceito acriticamente esses cálculos, ele teria sufocado o crescimento da economia com juros altos. Pragmaticamente, o BC examinou com cuidado um amplo conjunto de informações, foi testando a temperatura da água e descobriu aos poucos que a economia poderia crescer, sem risco de inflação, muito mais do que imaginavam os acadêmicos.
Greenspan tem sido um fiel seguidor do mandato do BC. De acordo com o "Federal Reserve Act", a política monetária deve promover "os objetivos de emprego máximo, preços estáveis e taxas de juro moderadas de longo prazo". Diferentemente do que ocorre em outros países, o BC americano não pode concentrar-se exclusivamente no combate à inflação. Durante a longa gestão Greenspan, houve apenas duas recessões brandas e o BC atuou diversas vezes para conter processos recessivos e estimular a atividade econômica.
Agora que Greenspan vai se aposentar do Fed, ele bem que poderia vir ao Brasil dar alguma orientação ao nosso BC. Posso imaginar a cena. Como visitante bem-educado, ele faria, em entrevistas, elogios generosos à política monetária brasileira. Portas fechadas, Greenspan perguntaria aos neófitos do BC: "What kind of a show are you putting on here?" (Que circo é esse que vocês estão armando aqui?).


Paulo Nogueira Batista Jr., 50, economista e professor da FGV-EAESP, escreve às quintas-feiras nesta coluna. É autor do livro "O Brasil e a Economia Internacional: Recuperação e Defesa da Autonomia Nacional" (Campus/Elsevier, 2005).
E-mail - pnbjr@attglobal.net


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