|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Economistas questionam eficácia e custo do socorro
A dúvida é saber se plano para assumir créditos ruins terá reflexos para contribuintes
Na avaliação de economistas americanos, risco de os EUA enfrentarem anos de estagnação diminui com ação do governo
PETER S. GOODMAN
DO "NEW YORK TIMES'
Com o governo federal americano interferindo no centro
da crise financeira, duas perguntas simples aparecem: Essa
intervenção será suficiente para restaurar a ordem? E quanto
esse grande gesto custará aos
contribuintes?
O Departamento do Tesouro,
como supervisor do sistema financeiro, lançou uma série de
iniciativas para conter a catástrofe. Assumiu as maiores financiadoras de hipotecas e
abriu mão de incontáveis bilhões de dólares dos contribuintes para ajudar outros mutuários endividados. Agora, ao
invés de ajudar uma empresa
de cada vez, está assumindo
uma imensidão de papéis podres num golpe só.
Se o novo plano se concretizar, o medo dos bancos de emprestar seus dólares passará e
eles voltarão a liberar crédito?
E qual será o custo de longo
prazo do resgate do governo ao
sistema financeiro após financistas milionários terem ficado
ainda mais milionários com
apostas irresponsáveis no setor
imobiliário?
Alguns questionam a prudência de se elevar a dívida do
governo num momento em que
o Tesouro americano depende
da boa vontade de estrangeiros
para fechar suas contas. Mesmo assim, há grande apoio à necessidade de uma grande intervenção quanto à proposta pelo
Tesouro.
"É bastante abrangente e
melhora o quando substancialmente", diz Alan Blinder, economista da Universidade Princeton e ex-membro do Fed
(banco central dos EUA), que
defendia há meses que o governo assumisse papéis ligados ao
setor imobiliário.
Mas há também muito ceticismo com o plano. Ele prevê
que o Tesouro adquira os papéis podres no mercado gastando até US$ 700 bilhões e revenda depois o que conseguir enquanto tenta destrinchar a alta
complexidade dos títulos. Mas
ninguém sabe quanto essa trama de papéis extremamente
complexos valerá. Sem falar na
mensagem que passará aos financistas sobre os riscos que
podem tomar.
Mas alguns dizem que essas
questões agora são menos importantes. O país enfrenta sua
pior crise financeira desde a
Grande Depressão dos anos 30.
Até o anúncio oficial do plano,
na última sexta-feira, as visões
eram apocalípticas. "Parecia
que estávamos caindo no abismo", diz Blinder.
"O risco de acabarmos como
o Japão, com dez anos de estagnação, é muito menor agora",
diz Nouriel Roubini, economista da Universidade de Nova
York. "O trem da recessão já
deixou a estação, mas serão 18
meses, não mais cinco anos",
previu o economista.
Incertezas
Se o plano funcionar, atacará
a causa central dos problemas
da economia americana: a queda contínua do preço das casas.
Se os bancos voltarem a emprestar mais livremente, haverá mais hipotecas.
Assim, as pessoas poderão
comprar casas, aumentando
seus preços ou ao menos impedindo que eles sigam caindo. Isso impedirá que investimentos
ligados a hipotecas quebrem,
melhorando ainda mais a situação dos bancos, estancando a
espiral atual.
"É fácil esquecer em meio a
coisas tão elaboradas -créditos derivativos, "swaps'- que a
raiz do problema é o preço declinante das casas", diz Blinder.
"Se você conseguir reverter isso, as pessoas sairão de seus
"bunkers" e porão dinheiro onde hoje temem investir", afirma Blinder. Mas ressalva: "A
crise pode não ter acabado".
Para alguns, o aperto no crédito é uma correção inevitável.
Por um quarto de século, a economia americana se sustentou
com dinheiro emprestado, com
investimentos especulativos
que criaram a explosão da bolha da internet e a da habitação.
"O crédito foi muito fácil por
muito tempo, é uma correção
necessária, mas dolorosa", afirma Mark Vitner, economista
do banco Wachovia.
Dois extremos
Outros dizem que nas últimas semanas fomos da era do
crédito exageradamente fácil
ao extremo oposto: uma relutância geral a emprestar.
"O perigo é irmos do excesso
de crédito fácil ao excesso da
aversão ao risco", afirma Jared
Bernstein, do Instituto de Política Econômica. A economia já
cortou cerca de 600 mil empregos neste ano. Se as empresas
saudáveis não tiverem acesso a
crédito, não poderão se expandir e contratar.
"O que estamos assistindo
agora é uma versão ampliada
do que vimos desde agosto. Mas
uma morte súbita, ao invés de
uma sangria lenta", afirma
Bernstein.
O impacto do recuo dos bancos no crédito era evidente na
última sexta-feira na taxa cobrada por uma instituição para
emprestar a outra no curto prazo. Tradicionalmente de 0,2
ponto percentual acima dos títulos do Tesouro, de risco zero,
estavam perto de dois pontos.
Com a intervenção do governo para assumir os créditos
ruins, se espera que os bancos
retomem seus empréstimos. Se
funcionará no longo prazo, restam dúvidas. Mas mesmo o
mais céticos dos economistas
afirma que o caminho do governo é o correto.
"Não é suficiente. Mas é a
primeira vez que eles fizeram
alguma coisa que faz alguma diferença", afirma Roubini, economista da Universidade de
Nova York.
Texto Anterior: Luiz Carlos Bresser-Pereira: A crise se aprofunda Próximo Texto: Frase Índice
|