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ARTIGO
O sistema financeiro paralelo se desfaz
NOURIEL ROUBINI
ESPECIAL PARA O "FINANCIAL TIMES'
A semana que passou determinou o fim do sistema bancário paralelo criado nos últimos
20 anos. Por causa de uma regulação maior dos bancos, a
maior parte da intermediação
financeira nas últimas duas décadas cresceu dentro de um sistema paralelo cujos membros
são corretoras-operadores do
mercado, "hedge funds", grupos de "private equity" (fundos
privados de participação em
empresas), títulos complexos e
obscuros, fundos mútuos e empresas de créditos hipotecários
não-bancárias.
A maioria dos integrantes
desse sistema faz operações de
crédito de curto prazo, é muito
mais alavancada que os bancos
e investe em instrumentos financeiros de pouca liquidez.
Como os bancos, carregam o
risco de sofrerem uma corrida
contra suas obrigações. Mas, ao
contrário dos bancos, protegidos desse risco por seguros e
apoio emergencial de bancos
centrais, a maioria dos integrantes do sistema paralelo não
tinha acesso a essas proteções.
Uma corrida geral a esses
bancos paralelos começou
quando a desalavancagem pós-estouro da bolha dos ativos gerou incertezas sobre quais instituições estavam solventes. O
primeiro estágio foi o colapso
de todo o sistema de SIVs (fundos de instrumentos financeiros complexos e obscuros),
quando os investidores perceberam a sua toxicidade.
O próximo passo foi a corrida
aos grandes corretores-operadores do mercado americano:
primeiro o Bear Stearns perdeu
sua liquidez em dias. O Federal
Reserve (BC dos EUA) então
estendeu seu apoio como fonte
de crédito emergencial para
corretores-operadores sistemicamente importantes. Mas
mesmo isso não impediu uma
corrida aos outros corretores-operadores dada a preocupação
com a solvência: foi a vez de o
Lehman Brothers quebrar. O
Merrill Lynch enfrentaria o
mesmo destino se não tivesse
sido vendido. A pressão se deslocou para o Morgan Stanley e
o Goldman Sachs.
O terceiro estágio foi o colapso de outras instituições alavancadas sem liquidez e provavelmente insolventes graças à
sua irresponsável concessão de
crédito: Fannie Mae e Freddie
Mac, AIG e mais de 300 instituições de crédito hipotecário.
O quarto estágio foi o pânico
nos fundos mútuos de investimento. Eles competiam agressivamente por ativos e, para dar
retornos maiores e atrair investidores, alguns aplicaram em
instrumentos sem liquidez.
Quando esses investimentos
estouraram, o pânico tomou
conta dos investidores, causando enorme corrida contra esses
fundos. Isso seria uma catástrofe. Então, noutra mudança
radical, os EUA estenderam as
garantias de depósitos a eles.
O próximo passo será uma
corrida contra milhares de
"hedge funds" altamente alavancados. Após breve período
de bloqueio, seus investidores
podem resgatar os investimentos trimestralmente. Assim,
uma corrida contra esses fundos na forma de uma corrida
bancária é bastante provável.
Centenas de fundos menores
e mais novos que assumiram
riscos excessivos com alta alavancagem e são mal-administrados podem quebrar. Uma
enorme mexida na inflada indústria de "hedge funds" é provável nos próximos dois anos.
Mesmo as firmas de "private
equity" e suas compras irresponsáveis e altamente alavancadas de empresas não serão
poupadas. A bolha de "private
equity" gerou compras alavancadas de empresas ("LBO" na sigla em inglês) que jamais deveriam ter ocorrido. A corrida
contra essas LBOs é lenta, mas
só atrasam a crise de refinanciamento e tornará ainda pior
as quebras que se seguirão.
Mesmo grandes LBOs, como
GMAC e Chrysler, estão agora
em risco.
Estamos observando uma
corrida acelerada contra o sistema bancário paralelo que está causando seu fim. Se o apoio
emergencial e a garantia de depósitos forem estendidos a
mais integrantes do sistema,
essas instituições terão de ser
regulamentadas como os bancos para evitar risco moral. Claro, esta severa crise financeira
também tem custo aos bancos
tradicionais: centenas estão insolventes e terão de fechar.
O lado econômico real da crise financeira será uma severa
recessão nos EUA. O contágio
financeiro, o euro forte, as importações americanas em queda, a explosão das bolhas habitacionais européias, os altos
preços do petróleo e um duro
Banco Central Europeu causarão recessão na zona do euro,
no Reino Unido e na maioria
das economias avançadas.
Instituições financeiras européias correm o risco de perdas agudas por causa dos títulos
tóxicos vendidos a elas. Assim,
a crise financeira do século
também envolverá as instituições financeiras européias.
Nouriel Roubini é presidente da Roubini Global
Economics e professor de economia na Universidade de Nova York.
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