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LUÍS NASSIF
Um decálogo para a transição
Diplomata experiente e polêmico, por sua independência intelectual, autor de livros
importantes sobre a história da
diplomacia, Paulo Roberto de Almeida, de seu posto em Washington, elaborou o chamado "decálogo da transição", com conselhos para o PT sobre como atravessar a transição com o mínimo
de sobressaltos. Pela oportunidade, fica o registro resumido:
1) Unificar o discurso
Pequenos chefes e porta-vozes
auto-assumidos têm de ser alertados para os efeitos nefastos da
chamada "dupla linguagem".
Em operações militares não pode
haver dualidade de comando, e a
arte da política tem regras muito
semelhantes.
2) Falar ao país, não ao partido
A primeira palavra não deve
ser aos seus seguidores, mas à nação, ainda que esse pronunciamento contenha palavras de
agradecimento a todos aqueles
que tornaram possível a vitória.
Esqueça por um momento os
grupos sociais e os problemas locais, com exceção de uma menção ampla aos excluídos e marginalizados, pois os interesses começam justamente a divergir
quando se mencionam categorias específicas da população.
3) Dirigir-se ao mundo, seletivamente
Cabe ao novo presidente, cuidadosamente, planejar eventual
viagem pré-posse (...), não necessariamente aos pontos que oferecem soluções aos problemas, mas
àqueles que representam a própria fonte desses problemas. (...)
Se nos dedicarmos (a combater a
exclusão social) de forma consequente, com ou sem a cooperação internacional (...), o prestígio
externo será o resultado de termos alcançado aquele objetivo,
não a consequência de qualquer
novo ativismo no plano externo.
4) Tranquilizar os agentes econômicos
(...) Essa confiança não cresce
apenas com a abertura ao diálogo, mas sobretudo com a capacidade demonstrada de tomada de
decisão. Há um momento, portanto, em que as consultas precisam ser interrompidas, e a decisão, anunciada.
5) Designar os principais assessores, depois negociar.
(...) Caberia designar a equipe
econômica que vai começar a
trabalhar na primeira fase da
transição, dando-lhe inteiro respaldo e preservando-a das inevitáveis barganhas das demais escolhas. Uma vez feito isso, pode-se sentar para ouvir (...) sem negociar o que é essencial, isto é, a
capacidade governativa no núcleo central.
6) Recompor um programa de
governo
(...) De preferência será curto,
preciso, objetivo, sem adjetivos,
indicando claramente para onde
vai dirigir-se a ação governamental, numa primeira fase pelo
menos. Lembre-se de que não será possível contentar a todos, e
assim certos problemas não serão
necessariamente tocados. Isso
não deve ser motivo de angústia,
pois ninguém espera, sobretudo
os mais esclarecidos, que a nova
situação resolva tudo em seis meses.
7) Atender a circunstâncias excepcionais
(...) Determinados bens públicos devem ser preservados além e
acima das querelas ideológicas, e
a situação econômica é um deles.
Eventualmente, medidas excepcionais serão necessárias, antes
mesmo da assunção ao poder, o
que exige, antes de mais nada, o
abandono da postura do "eu não
disse?" em favor da adoção de
uma atitude de responsabilidade
compartilhada no acolhimento
dos custos -inclusive políticos- derivados de medidas restritivas ou de ajuste emergencial.
8) Indicar as linhas do discurso
de posse
(...) Destacar mais os elementos
afirmativos da futura ação governamental do que as críticas à
herança recebida (ainda que algum "exagero" seja aqui compreensível).
9) Estruturar as bases do apoio
congressual
(...) O novo governo, no Executivo ou no Legislativo, deve estar
primariamente interessado na
eficácia de suas ações, não na sua
conformidade a qualquer cartilha política do passado. A clareza
de propósitos deve servir como
elemento de pressão (contras as
pressões fisiológicas) do ponto de
vista da opinião pública.
10) Preparar-se para o pior,
manter a mensagem otimista
(...) A desconfiança no valor da
moeda é o sinal mais claro do
desconforto com a mudança, que
não resulta necessariamente da
obra de "especuladores" ou outros conspiradores externos. Tudo isso precisa ficar claro para a
nova maioria, que não pode perder o sangue-frio e sair buscando
"bodes expiatórios" e culpados
de ocasião.
(...) Por isso caberia preparar-se para o pior, isto é, para uma
deterioração ainda maior da situação econômica nos próximos
meses, ainda que mantendo um
discurso otimista -ou moderadamente realista -sobre a superação da presente fase de turbulências.
E-mail -
LNassif@uol.com.br
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