São Paulo, quarta-feira, 22 de outubro de 2008

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Com piora da crise, Lula já fala em cortar o Orçamento

Ele diz que, se arrecadação for menor, não haverá dinheiro "para todo mundo'

"Imagina visitar no hospital companheiro em fase terminal e falar: Ó, ontem morreu um cara igualzinho", diz, ao explicar otimismo

Sebastião Moreira/Efe
Presidente Lula na SBPC

DA REPORTAGEM LOCAL

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse ontem que poderá reduzir o Orçamento dos ministérios se a crise financeira mundial atingir o Brasil.
A afirmação foi feita a cientistas na comemoração dos 60 anos da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência) após ser questionado se a crise afetaria a destinação de recursos para a ciência.
Lula respondeu que, para não vender ilusões, não poderia "assumir o compromisso com vocês de que, se houver uma crise econômica que abale o Brasil, a gente vai manter todo o dinheiro de todos os ministérios como está". "Até porque, se a União arrecadar menos, vai ter menos dinheiro para todo mundo", afirmou.
Desde o agravamento da crise global, em setembro, Lula vinha dizendo que o Brasil sofreria pouco: "Ela [crise] é lá [EUA] um tsunami, e aqui vai chegar uma marolinha, que não vai dar nem para esquiar", disse ele no início deste mês.
Mas, desde então, o dólar mantém alta firme em relação ao real (ontem subiu 5%), grandes empresas revelam perdas significativas com o câmbio e suspendem investimentos. Já a confiança dos industriais despencou, apontou pesquisa da CNI divulgada ontem.
Aos cientistas, Lula ressaltou que não há ministério "menos importante" e comparou o governo a uma casa em que os pais têm quatro ou cinco filhos.
"Quando chega o fim do ano um quer um tênis, um quer uma calça. E o dinheiro não dá. Você vai ter que, em vez de dar uma calça, dar uma bermuda mais barata para um e, em vez de dar uma meia que venha até o joelho, dar uma meia pequenininha. É sempre um cobertor que não dá para cobrir o pé e a cabeça", afirmou.
O presidente disse que a crise financeira mundial resgatou "o gostinho pelo papel do Estado". "Até o [presidente dos EUA, George W.] Bush está falando em comprar ações de bancos privados. Isso é muito importante porque o coração do regime capitalista começa a tomar gostinho pelo papel do Estado, que esteve desmoralizado nos últimos 30 anos", afirmou.
E, em outra comparação "caseira", Lula chamou o mercado de filho adolescente. "Quando o filho adolescente vem atrás do pai? Quando está sem dinheiro ou doente (...). O mercado que ditou regras quando precisa recorre ao paizão que é o Estado", disse o presidente.

Otimismo
Apesar da ressalva de poder ter que retirar recursos dos ministérios em caso de crise, o tom do discurso do presidente aos cientistas foi, no geral, otimista.
"É importante que a gente tenha em conta que essa crise pode chegar muito mais leve do que ela chegou nos países de origem, sem nos esquecermos de que é a primeira crise que acontece primeiro nos países ricos para depois ir para a periferia", disse. "E quem está dando solidez para a economia mundial são exatamente esses países periféricos, como Brasil, China, Índia, África do Sul, México e outros."
Ele ponderou que o país pode, no entanto, sofrer as conseqüências de uma recessão no mundo desenvolvido -o que causaria "um certo problema nas exportações de todos os países do mundo, inclusive do Brasil".
Porém, até esse reflexo ele opina que pode não ser tão severo. "Acho que o Brasil sofrerá menos porque diversificou muito sua parceria comercial. Há dez anos nós tínhamos praticamente 27% da nossa balança comercial com os EUA. Hoje nós temos pouco mais de 14%."
Sobre seu otimismo, ele disse que não poderia agir diferente. "Imagina visitar no hospital um companheiro que está em fase terminal, sentar na beira da cama e falar: "Ó, ontem morreu um cara igualzinho'".
(AFRA BALAZINA)



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