São Paulo, quarta-feira, 22 de outubro de 2008

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Petrobras decide alongar investimentos devido à crise

Previsto inicialmente para o período entre 2009 e 2013, plano deve ser diluído até 2020

Gabrielli afirma que piora do cenário mundial também vai afetar "fortemente" o debate sobre novas regras de exploração do pré-sal

VALDO CRUZ
ENVIADO ESPECIAL A HOUSTON

O agravamento da crise no mercado financeiro afetará o plano de investimento da Petrobras, que deve sofrer um alongamento no seu período de implementação. A previsão é do presidente da estatal, José Sergio Gabrielli, para quem a piora do cenário também vai afetar "fortemente" o debate sobre as novas regras de exploração de petróleo do pré-sal. "São dúvidas demais, por isso adiamos nosso plano de investimento e estratégico", disse Gabrielli à Folha, após participar de seminário sobre biocombustíveis em Houston. Segundo ele, o plano não será necessariamente mais conservador, mas "provavelmente mais longo do que era antes". Previsto inicialmente para ser implementado entre 2009 e 2013, Gabrielli sugeriu, durante a entrevista, que sua data final pode ficar mais próxima de 2020 do que de 2013, diante da crise financeira. O atual plano vai de 2008 a 2012 e prevê investimentos totais de R$ 112 bilhões, basicamente com recursos próprios. O presidente da estatal diz que ela não sofrerá problemas no curto prazo, mas as dificuldades vão existir no médio e no longo prazos devido à crise no mercado de crédito internacional. Isso, segundo ele, vai afetar "fortemente as regras do pré-sal" porque se trata de investimento de longo prazo que necessita de financiamento. A seguir, a entrevista concedida à Folha no escritório da empresa nos EUA, na qual disse acreditar que, sem queda de custos, o atual patamar do preço do petróleo é "insustentável", que a conjuntura americana pode beneficiar o álcool brasileiro e que a Petrobras não aceitará ser só prestadora de serviços no Equador.

 

FOLHA - Com o preço do petróleo declinando no mercado internacional, chegando a ficar abaixo de US$ 70 o barril, o sr. acredita que esse patamar pode se consolidar? Ele é sustentável nesse nível?
JOSÉ SERGIO GABRIELLI
- Existem várias incógnitas que ainda não têm resposta. Não sabemos até que ponto o crescimento dos países emergentes vai continuar. Até que ponto a Opep (Organização dos Países Produtores de Petróleo) vai ter condições de reduzir a oferta. Uma redução virá, está prevista para depois de amanhã, mas é uma variável desconhecida. E também não sabemos exatamente qual será o comportamento do consumidor final. O que sabemos é que os custos de produção de petróleo, em termos das novas descobertas, aumentaram substancialmente, porque o novo petróleo vem de áreas mais difíceis de produzir. Os barris marginais adicionais vindos dessas novas fronteiras são mais caros do que os atuais.

FOLHA - O sr. acredita num corte grande na produção da Opep?
GABRIELLI
- Não dá para saber exatamente. Há vários componentes para levar em consideração na decisão dos países produtores de petróleo. Primeiro, qual será o impacto que essa decisão terá na receita total desses países em termos de balança comercial e de resultados fiscais? Se você reduz a oferta e o preço cai ou se eleva muito pouco, você pode reduzir a receita desses países. Outro elemento importante é a grande elasticidade das despesas públicas desses países, que ajustaram seus gastos a níveis de preços mais altos. Um terceiro elemento é como se comporta a taxa de câmbio. Ou seja, são dúvidas demais, por isso adiamos nosso plano de investimento e estratégico.

FOLHA - O plano de investimento até 2012 previa R$ 112 bilhões. O próximo poderia atingir R$ 210 bilhões? Ele foi adiado até quando?
GABRIELLI
- Ainda não tem valor, por isso foi adiado até o final do ano, sem data exata.

FOLHA - Bem, mas esse adiamento sinaliza que o nível de investimento será menor?
GABRIELLI
- Não tem como ter essa resposta ainda.

FOLHA - Mas estamos num mundo muito mais pessimista do que antes.
GABRIELLI
- É um mundo mais difícil do que antes, particularmente porque no campo do crédito você vai ter uma maior dificuldade de financiamento.

FOLHA - Como piorou o ambiente econômico desde setembro...
GABRIELLI
- Piorou bem, mas ali já havia problemas no crédito. O que estamos vivendo hoje é mais do que um problema de liquidez, há uma crise de confiança entre os agentes. Quem tem dinheiro não quer emprestar porque não sabe se vai receber de volta.

FOLHA - Até a Petrobras, empresa de credibilidade no mercado, está enfrentando essas dificuldades?
GABRIELLI
- A Petrobras não tem problema no curto prazo. Produzimos 2,4 milhões de barris por dia de óleo equivalente [em setembro, recorde mensal]. Com uma produção dessa, não tem problema de caixa no curto prazo. O problema é mais para médio e longo prazos.

FOLHA - Como o cenário piorou, podemos esperar que o próximo plano de investimento será mais conservador?
GABRIELLI
- Provavelmente será um plano de investimento mais longo do que era antes, não necessariamente mais conservador, vai ter de levar em conta as dificuldades de toda a cadeia produtiva.

FOLHA - Isso pode significar que o prazo pode ser de...
GABRIELLI
- O atual é de 2008 a 2012. O próximo poderia ser de 2009 a 2013, ou de 2009 a 2020.

FOLHA - O cenário indica estar mais perto de 2020 do que de 2013.
GABRIELLI
- Provavelmente.

FOLHA - Em que medida o agravamento da crise afeta a definição das regras do pré-sal?
GABRIELLI
- O problema de financiamento do pré-sal afeta fortemente as regras. Porque ele é um investimento longo. Terá resultados positivos durante um período longo. Mas no início terá só investimento, só desembolso, não tem retorno de caixa. Então, essa situação de agravamento das condições de financiamento vai afetar a discussão do pré-sal.

FOLHA - O petróleo até US$ 50 o barril viabiliza o pré-sal?
GABRIELLI
- O pré-sal não está ameaçado pelo preço atual do petróleo. O problema não está aí, está em que vou precisar durante muitos anos de financiamento para ter uma primeira produção.

FOLHA - Antes mesmo do agravamento da crise, a tendência dentro do governo era capitalizar mais a Petrobras para iniciar a produção do petróleo do pré-sal. Com a crise, isso se tornou ainda mais forte?
GABRIELLI
- Como eu disse, acho que o problema principal que teremos será de acesso a financiamento. Num quadro desse, já que houve uma redução geral de financiamento, os melhores projetos tendem a ser mais facilmente financiáveis do que os piores. E os agentes econômicos que têm tradição e prática nos diversos tipos de projeto tendem a ser mais facilmente financiáveis do que os novos agentes. Nesse sentido, acredito que a Petrobras tem uma posição relativamente mais favorável num momento de dificuldades gerais.

FOLHA - O sr. diz desejar que o governo norte-americano dê um melhor tratamento ao etanol brasileiro, com queda das barreiras tarifárias. O sr. acredita que isso acontecerá?
GABRIELLI
- Eu acho que será muito difícil manter as metas de utilização do etanol baseado no milho nos Estados Unidos. Primeiro, porque a produtividade do milho é muito menor do que a da cana-de-açúcar. Segundo, porque nessa mudança de preços relativos e de acesso a crédito nos Estados Unidos, expandir a produção de milho aqui vai ser muito mais difícil.

FOLHA - E como está a polêmica com o Equador?
GABRIELLI
- Nós fizemos um acordo, migramos para um contrato de transição, que mudou as condições tributárias, é mais caro, mas mantém as condições atuais e temos mais um ano para continuar discutindo.

FOLHA - A posição do Equador de transformar a Petrobras apenas numa prestadora de serviços está fora de cogitação?
GABRIELLI
- Não podemos aceitar essa condição, não está no objeto social da empresa.


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