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AGROFOLHA
GRÃOS
Produção recorde de 61 milhões de toneladas não deve se confirmar em razão de fatores climáticos e doença; preço bate recorde
Quebra da soja pode frustrar supersafra
MAURO ZAFALON
DA REDAÇÃO
A grande safra brasileira de soja
não vai ocorrer. Os brasileiros devem provar neste ano o amargor
que os norte-americanos vêm
sentindo há seis anos. Brasil e Estados Unidos, os dois líderes
mundiais na produção de soja,
vão ter quebra de safra de até 22
milhões de toneladas neste ano, o
que representa 11% do consumo
mundial previsto para o período.
Esse volume é mais do que os 21
milhões de toneladas que a China
importa.
Esse cenário está alterando
completamente as negociações
mundiais. Os preços atingem os
maiores patamares dos últimos 16
anos e são bem superiores aos negociados no mercado futuro.
Apesar de estar em plena safra e
com grande oferta de produto, o
Brasil é o principal prejudicado.
A demanda mundial por soja é
forte. A mesma China que forçou
a elevação nos preços do produto
provocou reajuste de até 200%
nos preços dos fretes marítimos
em um ano. A soja brasileira, mais
distante do mercado chinês do
que a norte-americana, vale US$ 3
a menos por saca.
Fernando Muraro, da AgRural,
de Curitiba, afirma que essa defasagem de preços não se deve, no
entanto, somente aos fretes marítimos, mas ao "apagão logístico"
que o país vive nos últimos anos.
A produção da soja brasileira
está em localização distante, o
transporte é precário -e dependente de rodovias- e o escoamento dos portos é incerto, o que
força os importadores a pagar
mais pelo produto dos Estados
Unidos.
Quando a soja é negociada no
mercado internacional, tem como
referência os preços da Bolsa de
Chicago. Os preços pagos pelos
importadores podem ficar acima
ou abaixo dos de Chicago, dependendo das condições de entrega
desse produto.
O Brasil, neste momento, recebe
preços inferiores aos de Chicago
-um castigo pela ineficiência da
infra-estrutura nas exportações
do país. Ontem, por exemplo, a
soja para maio foi negociada na
Bolsa de Chicago a 1.055,75 centavos de dólar por bushel, mas os
interessados em importar produto brasileiro só pagavam 935,75
centavos. Já a soja norte-americana era comercializada a 1.056,10
centavos.
Quebra de safra
O Brasil interrompe neste ano
um longo período de safras recordes de soja.
As estimativas mais otimistas,
feitas pelo Usda (Departamento
de Agricultura dos Estados Unidos), indicavam uma safra de 61
milhões de toneladas.
Excesso de chuvas no Centro-Oeste, seca forte na região Sul e a
ocorrência de ferrugem asiática
em todo o país, no entanto, vão
derrubar a safra brasileira para
51,5 milhões de toneladas, conforme as estimativas mais pessimistas, feitas pela CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do
Brasil).
Se confirmados, esses dados vão
indicar uma quebra de pelos 9 milhões de toneladas no país. A
AgRural, a primeira a indicar forte quebra de safra, já está revendo
esses dados e espera uma safra
próxima de 52 milhões de toneladas. "Esses dados são os que já
constatamos, mas até o final da
safra poderemos ainda ter novas
surpresas", diz Muraro.
Já os EUA vêm patinando há
seis anos e sempre colhendo uma
safra bem menor do que a prevista. No período, a produção dos
norte-americanos ficou 33 milhões de toneladas abaixo da prevista. Somente neste ano, a quebra da safra foi de 13 milhões de
toneladas.
A oferta mundial de soja, prevista para 212 milhões de toneladas no início desta safra 2003/4, ficará abaixo dos 190 milhões, na
avaliação de Muraro. Essa queda
coloca em perigo o abastecimento
mundial, já que os estoques recuam para apenas 15% do consumo, estimado em 200 milhões de
toneladas pelo Usda.
A queda de oferta de produto
brasileiro desvia a atenção do
mercado para setembro, quando
deverá ser colhida a safra 2004/5
dos norte-americanos.
Mais um ano de quebra nos
EUA fará os preços explodir. Essa
explosão, no entanto, tem um limite e esbarra no potencial de
compra dos consumidores, afirma Muraro.
Produtividade
O Brasil, que vinha sustentado a
produtividade média mundial
por hectare -porque passou a
produzir bem mais soja por hectare do que os norte-americanos-, mesmo com um aumento
de 15% na área plantada neste
ano, poderá produzir uma safra
menor ou próxima dos 52,4 milhões de toneladas do ano passado. A produtividade mundial deve recuar neste ano para 36,6 sacas por hectare -9% menos do
que em 2003.
As condições climáticas vinham
sendo tão favoráveis para os produtores brasileiros nos últimos
anos que Muraro costumava dizer que "Deus é brasileiro e planta
soja". Agora, o analista afirma já
não ter tanta certeza dessa nacionalidade.
O "apagão logístico" preocupa,
mas ele será mascarado neste ano
devido à quebra de safra. O país
precisa urgente buscar uma saída
para o Pacífico, onde estão os
principais mercados para os produtos brasileiros, diz Muraro.
O maior prejudicado com todos
esses gargalos de escoamento da
safra é o produtor. As multinacionais se adaptam a esses custos extras e os descontam do preço pago
ao produtor. Todo o ganho de
produtividade que o país vem
conseguindo nos últimos anos
acaba sendo eliminado nesses
custos extras, de acordo com o
mercado.
A situação neste momento é
ainda mais grave por causa da
greve no porto de Paranaguá
(PR), o principal no escoamento
da safra.
Com a paralisação, a saca de soja escoada pelo porto vale cerca de
US$ 20,40, com queda de US$ 0,60
em relação aos preços praticados
nos portos de Santos (SP) e de Rio
Grande (RS).
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