São Paulo, quinta-feira, 23 de abril de 2009

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entrevista

"Não há valor que pague o meu constrangimento"

DA REPORTAGEM LOCAL

Cinco anos após ser demitido do cargo de gerente-geral do Bradesco em uma agência de Salvador, Antônio Ferreira dos Santos, 47, afirma que "não há valor que pague" o constrangimento pelo qual passou. A declaração é uma referência à decisão do TST (Tribunal Superior do Trabalho), que negou recurso do Bradesco e reconheceu que ele foi vítima de assédio moral e de discriminação por ser homossexual.
Os valores das indenizações determinadas por instâncias anteriores da Justiça baiana -R$ 200 mil por dano moral e material corrigidos e mais uma indenização que prevê o pagamento de seu salário em dobro desde sua demissão até a ação ser encerrada- estão mantidos.
Os advogados de Santos acreditam que o valor possa chegar a R$ 1,3 milhão até a ação ser encerrada e contando com a correção dos valores nos últimos cinco anos.
Demitido por justa causa, sem explicação formal do Bradesco, segundo consta na ação trabalhista, o ex-gerente diz que não conseguiu se recolocar no mercado, foi "privado" de seus direitos e passou por período de depressão ao ter sua reputação profissional "manchada".
Formado em letras pela Universidade de Salvador e pós-graduado em gestão de negócios pela UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), Santos hoje atua como corretor de seguros.
Leia abaixo trechos da entrevista concedida ontem, por telefone, à Folha. (CR)

 

FOLHA - O que motivou o sr. a recorrer à Justiça?
ANTÔNIO FERREIRA DOS SANTOS
- Mais importante do que minha homossexualidade é meu caráter. Fui discriminado por ser homossexual, mas fui demitido por justa causa sem uma explicação. Mancharam 22 anos de dedicação e de trabalho honesto. Sempre trabalhei com clientes corporativos, atendendo empresas de grande porte. Recebi um prêmio no ano 2000 do [então] presidente do banco [Marcio Cypriano] pela minha atuação. E de um dia para o outro fui demitido.

FOLHA - O que o banco alegou para demiti-lo por justa causa?
SANTOS
- Recebi a carta de demissão e ela mencionava justa causa de acordo com o artigo 482 da CLT [Consolidação das Leis do Trabalho]. Esse artigo cita desde ato de improbidade, embriaguez, abandono de emprego, insubordinação e outras oito razões. A Justiça trabalhista questionou durante um ano a empresa e nunca recebeu, assim como eu, uma explicação para a minha demissão.

FOLHA - Na opinião do sr., o que ocorreu?
SANTOS
- Fui desligado de forma perversa. A demissão por justa causa serviu para camuflar o preconceito por eu ser homossexual.

FOLHA - Como ocorreram a discriminação e o assédio?
SANTOS
- Foram cinco anos de constrangimento. Um gerente regional me fez passar por várias situações [constrangedoras] na frente, até, de colegas de trabalho. Por essa razão, consegui comprovar o fato com o testemunho de várias pessoas. Ele dizia que "o Bradesco era um lugar para homens, e não para bichas e veados". Em público, não apertava a minha mão, como se a homossexualidade fosse transmitida pelo suor. Quando decorávamos a agência, em alguma comemoração, dizia que era para eu parar com a "veadagem". Como era meu superior, eu não tinha como nem para quem reclamar. Fui à Justiça quando ele me demitiu ao ocupar o cargo de diretor interinamente.


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