|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
entrevista
"Não há valor que pague o meu constrangimento"
DA REPORTAGEM LOCAL
Cinco anos após ser demitido do cargo de gerente-geral do Bradesco em uma
agência de Salvador, Antônio
Ferreira dos Santos, 47, afirma que "não há valor que pague" o constrangimento pelo
qual passou. A declaração é
uma referência à decisão do
TST (Tribunal Superior do
Trabalho), que negou recurso do Bradesco e reconheceu
que ele foi vítima de assédio
moral e de discriminação por
ser homossexual.
Os valores das indenizações determinadas por instâncias anteriores da Justiça
baiana -R$ 200 mil por dano moral e material corrigidos e mais uma indenização
que prevê o pagamento de
seu salário em dobro desde
sua demissão até a ação ser
encerrada- estão mantidos.
Os advogados de Santos
acreditam que o valor possa
chegar a R$ 1,3 milhão até a
ação ser encerrada e contando com a correção dos valores nos últimos cinco anos.
Demitido por justa causa,
sem explicação formal do
Bradesco, segundo consta na
ação trabalhista, o ex-gerente diz que não conseguiu se
recolocar no mercado, foi
"privado" de seus direitos e
passou por período de depressão ao ter sua reputação
profissional "manchada".
Formado em letras pela
Universidade de Salvador e
pós-graduado em gestão de
negócios pela UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), Santos hoje atua como corretor de seguros.
Leia abaixo trechos da entrevista
concedida ontem, por telefone, à Folha.
(CR)
FOLHA - O que motivou o sr. a
recorrer à Justiça?
ANTÔNIO FERREIRA DOS SANTOS -
Mais importante do que minha homossexualidade é
meu caráter. Fui discriminado por ser homossexual, mas
fui demitido por justa causa
sem uma explicação. Mancharam 22 anos de dedicação
e de trabalho honesto. Sempre trabalhei com clientes
corporativos, atendendo empresas de grande porte. Recebi um prêmio no ano 2000
do [então] presidente do
banco [Marcio Cypriano] pela minha atuação. E de um
dia para o outro fui demitido.
FOLHA - O que o banco alegou
para demiti-lo por justa causa?
SANTOS - Recebi a carta de
demissão e ela mencionava
justa causa de acordo com o
artigo 482 da CLT [Consolidação das Leis do Trabalho].
Esse artigo cita desde ato de
improbidade, embriaguez,
abandono de emprego, insubordinação e outras oito razões. A Justiça trabalhista
questionou durante um ano
a empresa e nunca recebeu,
assim como eu, uma explicação para a minha demissão.
FOLHA - Na opinião do sr., o que
ocorreu?
SANTOS - Fui desligado de
forma perversa. A demissão
por justa causa serviu para
camuflar o preconceito por
eu ser homossexual.
FOLHA - Como ocorreram a discriminação e o assédio?
SANTOS - Foram cinco anos
de constrangimento. Um gerente regional me fez passar
por várias situações [constrangedoras] na frente, até,
de colegas de trabalho. Por
essa razão, consegui comprovar o fato com o testemunho de várias pessoas. Ele dizia que "o Bradesco era um lugar para homens, e não para bichas e veados". Em público, não apertava a minha
mão, como se a homossexualidade fosse transmitida pelo
suor. Quando decorávamos a
agência, em alguma comemoração, dizia que era para
eu parar com a "veadagem".
Como era meu superior, eu
não tinha como nem para
quem reclamar. Fui à Justiça
quando ele me demitiu ao
ocupar o cargo de diretor interinamente.
Texto Anterior: Outro lado: Bradesco vai recorrer da decisão Próximo Texto: Comitê dos EUA aprova limites a setor de cartões Índice
|