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São Paulo, sexta-feira, 23 de maio de 2003

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Um dia após o Copom, banco anuncia saída de Goldfajn

LEONARDO SOUZA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

As críticas internas do PT e as divisões no governo quanto à condução da política monetária, principalmente sobre a definição da taxa básica de juros, precipitaram ontem o anúncio da saída do diretor de Política Econômica do Banco Central, Ilan Goldfajn.
Ontem, um dia após o Copom (Comitê de Política Monetária) ter decidido manter os juros básicos da economia em 26,5% ao ano, sob fortes críticas do vice-presidente José Alencar, o presidente do BC, Henrique Meirelles, anunciou o pedido de demissão de Goldfajn.
Oficialmente, a justificativa dada pelos dois, que convocaram entrevista no começo da manhã, foi que Goldfajn decidiu sair do banco por questões pessoais, pois queria voltar para a iniciativa privada.
De fato, em dezembro ele havia comunicado a Meirelles que pretendia deixar o banco. Mas, a pedido de Meirelles, aceitara permanecer por mais uns meses, durante o processo de transição de comando da instituição.
Segundo Goldfajn, eles haviam combinado então que neste mês anunciariam sua saída, que só seria concretizada no começo de julho. Segundo a Folha apurou, Goldfajn gostaria de ter anunciado sua demissão no começo do mês, entre as reuniões do Copom de abril e de maio.
No entanto, devido ao mal-estar causado por declarações de integrantes do PT e do governo, como o senador Aloizio Mercadante (SP) e o vice-presidente José Alencar, que criticaram em público a atuação do BC e defenderam a queda da taxa básica de juros, Goldfajn concordou que seria melhor esperar a reunião do comitê deste mês.
Meirelles queria na verdade que o diretor de Política Econômica postergasse o anúncio de sua saída por mais alguns dias, para evitar a interpretação óbvia de que sua decisão estava relacionada também com as pressões políticas.

Cronograma
"Gostaria de deixar claro que chegamos a pensar em mudar o cronograma para evitar esse tipo de especulação. Mas resolvemos não mudar nosso calendário", disse ontem Meirelles.
Goldfajn não é o primeiro diretor que veio da gestão de Armínio Fraga, antecessor de Meirelles, a deixar o banco por pressões políticas do PT. A primeira foi a ex-diretora de Fiscalização Tereza Grossi, muito criticada por integrantes do partido pela participação na operação de salvamento dos bancos Marka e FonteCindam, em janeiro de 1999, durante a crise da desvalorização do real.
O segundo foi o ex-diretor de Liquidações e Desestatização Carlos Eduardo de Freitas. Ele queria manter o programa de privatização dos bancos estaduais remanescentes, o que contrariava a posição de muitos petistas e de pessoas ligadas ao governo.
Para o lugar de Goldfajn foi indicado e apresentado ontem mesmo o economista Afonso Bevilaqua, ex-funcionário do FMI (Fundo Monetário Internacional).
Além disso, o BC decidiu reativar uma das diretorias do banco, a de Estudos Especiais, que será ocupada pelo economista Eduardo Loyo, atualmente professor visitante da Universidade de Columbia (Nova York).
Segundo Meirelles, os dois foram escolhidos por ele e pelo ministro Antonio Palocci Filho (Fazenda). O presidente do BC argumentou que não conseguiria trazer dois nomes de peso como os deles de uma hora para outra, o que comprovaria que a decisão de Goldfajn de deixar o banco já havia sido definida antes.
Goldfajn disse que permanecerá no banco durante o mês que vem e que participará da próxima reunião do Copom e da divulgação do relatório trimestral de inflação de junho. Não quis adiantar onde trabalhará, mas disse que durante os quatro meses do período de quarentena a que estará submetido voltará a dar aula, o que é permitido por lei.

10 anos de malanismo
O BC já está com a "cara" do PT. Dos cargos-chaves da diretoria, somente a de Assuntos Internacionais ainda é ocupada por um integrante da gestão do ex-presidente da instituição Armínio Fraga. Mas a nova face do BC muito se assemelha à do "malanismo".
A explicação está na origem do pensamento acadêmico dominante no BC de hoje: a do Departamento de Economia da PUC do Rio, onde Pedro Malan deu aula e foi professor, dentre outros, de Armínio Fraga.
Durante os quase dez anos em que Malan esteve no comando das políticas econômica e monetária no país , o pensamento que prevaleceu no Banco Central foi o ortodoxo-liberal da PUC do Rio de Janeiro.


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