São Paulo, sexta-feira, 23 de julho de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

INTEGRAÇÃO

Ministro das Relações Exteriores critica proposta agrícola da União Européia e diz que acordo não será "a qualquer custo"

"Quiseram nos fazer de bobos", diz Amorim

ELIANE CANTANHÊDE
DIRETORA DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

ANDRÉ SOLIANI
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, reagiu ontem duramente à proposta da União Européia para um acordo agrícola com o Mercosul: "Quiseram nos fazer de bobos", disse ele, numa conversa informal.
"Que ninguém pense que nós estamos desesperados por um acordo. Nós queremos um acordo, sim, mas não a qualquer custo", disse o ministro, durante o cafezinho depois de um almoço no Itamaraty em homenagem ao chanceler da Espanha, Miguel Ángel Moratinos -a quem o Brasil pediu apoio nas negociações com a UE. Depois, em entrevista coletiva, Amorim falou sobre a decisão de interromper as negociações em Bruxelas: "Nós não fizemos nenhum gesto teatral. Não havia mais o que falar".
Amorim disse que pretende aproveitar uma reunião da OMC (Organização Mundial do Comércio), na semana que vem, em Genebra, para uma conversa com o comissário europeu de comércio, Pascal Lamy. Será uma espécie de conversa preparatória para a nova reunião dos coordenadores dos dois blocos, prevista para 9 de agosto, em Brasília.
O Brasil, portanto, considera que as negociações vão continuar: "Com relação à conclusão do acordo, eu continuo trabalhando com a hipótese de terminarmos até outubro. Mas é preciso o mínimo de equilíbrio entre os benefícios mensuráveis de curto prazo. Nós achamos que isso não existe", disse o chanceler brasileiro.
Na opinião tanto de Amorim quanto do ministro do Desenvolvimento, Luiz Fernando Furlan (que também participou do almoço), negociações comerciais seguem esse "rumo natural": "Quando chega a hora de os técnicos negociarem, sempre empaca", disse Furlan. "Ele [Furlan] tem razão", aquiesceu Amorim.
É por isso que Furlan já anunciou que estará presente, "como ouvinte, sem dar opinião", na reunião dos coordenadores em Brasília. Uma presença política, segundo ele, tem uma espécie de efeito moral sobre as negociações. Ele também disse que, a partir de agora, todas as propostas serão apresentadas por escrito. Antes, eram apenas verbais.
Amorim usou o exemplo da carne para ilustrar o incômodo do Brasil com a oferta dos europeus de parcelar em dez anos as cotas de exportação de produtos agropecuários com taxas mais flexíveis. Segundo ele, o Mercosul teria direito a exportar apenas 6.000 toneladas no primeiro ano. A parte brasileira seria, então, de 2.400 toneladas. "Isso é só um caminhão. É ridículo", disse, em seguida.
Ele, porém, acha que não há nenhuma relação entre o endurecimento da UE e o atual fracasso nas negociações do Mercosul para a instalação da Alca (Área de Livre Comércio das Américas).
Ao discordar da hipótese de os europeus estarem aumentando os obstáculos porque a Alca deixou de ser uma alternativa imediata para os produtos do Mercosul, o ministro disse: "Não acho. Nesse caso, seria ao contrário: eles deveriam aproveitar as dificuldades da Alca para facilitar e fechar logo o acordo com o Mercosul".
O ministro comentou, ainda, o afastamento do embaixador em Bruxelas, José Alfredo Graça Lima, do comando das negociações com a UE: "Não entendi por que esse estardalhaço. A coisa mais natural do mundo é o embaixador do país não comandar a delegação brasileira. Sempre tem sido assim", disse ele. O assunto, porém, é tratado com constrangimento por embaixadores e demais diplomatas no Itamaraty.


Texto Anterior: Estrutura: Regra de investir não muda já, diz FMI
Próximo Texto: Espanha apóia oferta de europeus
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.