São Paulo, sábado, 23 de agosto de 2008

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Governo muda a contabilidade pública

Portaria da Fazenda vai convergir contabilidade nacional a padrões internacionais, acabando com conceito de superávit primário

Novas normas já devem ser aplicadas no Orçamento de 2010; Fazenda quer dar mais transparência aos gastos com juros


GUILHERME BARROS
COLUNISTA DA FOLHA

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, deve publicar portaria na terça-feira determinando que a contabilidade pública passe a adotar as normas contábeis consagradas internacionalmente.
Na prática, a portaria acaba com o conceito de superávit primário, que é usado pelo governo para contabilizar as receitas ante as despesas gerais, mas sem incluir o pagamento dos juros da dívida pública.
Com essas novas normas contábeis, passam a valer os conceitos de resultado fiscal, hoje chamado de nominal.
O objetivo é dar mais transparência à contabilidade pública. A Fazenda quer deixar claro o total de gastos do governo, principalmente com juros, pessoal e Previdência.
O conceito de superávit primário foi introduzido no Brasil em 1991, ainda no governo Collor, durante as negociações de acordo com o FMI (Fundo Monetário Internacional).
A intenção era calcular o montante de recursos que o governo poderia empregar para o pagamento dos juros da dívida.
No governo Fernando Henrique Cardoso, com a crise da desvalorização cambial de 1999, também seguindo orientação do FMI, o setor público passou a adotar metas de superávit primário para melhorar a imagem do país junto aos credores internacionais, já que ressalta a relativa responsabilidade fiscal do governo.
O conceito de superávit primário só existe no Brasil e em alguns poucos países que, depois, também seguiram essa recomendação do FMI.
Hoje, o país não deve mais ao FMI, tornou-se credor internacional -o volume de reservas supera o valor da dívida externa- e ainda foi promovido a grau de investimento pelas agências de classificação de risco internacionais. Mas, mesmo assim, o conceito de metas de superávit primário foi mantido nos Orçamentos.
A portaria que o Ministério da Fazenda irá divulgar na próxima terça-feira não deve determinar a partir de quando a contabilidade pública nacional irá convergir para os padrões internacionais, mas, de acordo com o que a Folha apurou, o objetivo é que a LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) de 2010 já seja encaminhada ao Congresso nesse novo padrão.
Nela, em vez de uma meta de superávit primário, o governo irá definir uma meta de resultado fiscal (déficit zero).
Um dos maiores defensores da aplicação do déficit nominal zero, o ex-deputado Delfim Neto considera essa mudança na contabilidade um aperfeiçoamento importante para o país.
"O superávit primário era um truque criado pelo FMI para enrolar todo mundo", disse. "O Brasil está, aos poucos, se aproximando do mundo."
Em 2005, Delfim propôs ao então ministro da Fazenda, Antonio Palocci, que o país acabasse com o conceito do superávit primário e adotasse o nominal, mas sua idéia foi abatida em pleno vôo. Uma das principais vozes dissonantes na época foi a da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff.
O economista Adriano Biava, especialista em finanças públicas e professor da FEA-USP, concorda que essa mudança significa avanço na contabilidade, mas afirma que não será isso que mudará o comportamento do governo. "O ideal seria o governo gastar melhor."
O secretário-executivo da Fazenda, Nelson Machado, apresentará todas as mudanças na contabilidade pública na próxima quinta-feira, no encerramento do 18º Congresso Brasileiro de Contabilidade, que se inicia amanhã em Gramado, no Rio Grande do Sul.


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