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Conjunto de erros levou setor à penúria nos EUA, diz especialista
DE WASHINGTON
Mentalidade retrógrada,
contratos trabalhistas inviáveis
e aposta tardia em veículos menores e movidos a combustíveis alternativos. Esses são os
três males de Detroit, segundo
o português Francisco Veloso,
especialista em indústria automobilística americana da Universidade Carnegie Mellon, em
Pittsburgh, na Pensilvânia.
Leia trechos de sua entrevista à Folha, por telefone.
(SD)
FOLHA - Como as três grandes
montadoras chegaram ao estado de
penúria em que estão?
FRANCISCO VELOSO - Uma razão é
o que chamaria de mentalidade
retrógrada de Detroit. No período em que o petróleo era barato, em vez de investirem no
futuro e se preparem para um
mundo que seria claramente
de restrição a esse tipo de combustível, basearam seu modelo
nos SUVs, carros grandes que
consomem muita gasolina e
davam lucro alto. Isso permitiu
que elas sobrevivessem no final
dos anos 90 e no começo deste
século. Só que não usaram esse
lucro no desenvolvimento de
soluções alternativas para o futuro. Nos últimos dois anos, o
erro foi percebido e elas tentaram mudar, lançaram carros
pequenos ou médios bastante
competitivos, mas era tarde.
FOLHA - O que mais?
VELOSO - A sindicalização do
trabalho na zona de Detroit. A
United Auto Workers [UAW,
principal sindicato do setor]
conquistou contratos muito rígidos, que levaram a custos extras associados a cada veículo.
Estima-se que um carro feito
em Detroit custe US$ 2.000 a
mais do que o feito em outras
regiões do país, por conta principalmente dos planos de aposentadoria e de saúde dos trabalhadores sindicalizados.
Isso era possível no mundo
de dez, 15 anos atrás. Hoje, com
um cenário mais competitivo,
com mais importações e montadoras estrangeiras produzindo no sul do país a custos mais
baixos, é inviável. Além disso,
as fábricas de Detroit são menos flexíveis a modernizações
que as do sul ou as de fora dos
EUA. Por fim, a aposta em produção de veículos de combustíveis alternativos como flex, híbridos elétricos e elétricos puros veio muito mais tarde que a
competição internacional.
FOLHA - O sr. acha que os EUA podem se adaptar a um modelo de indústria de propriedade estrangeira,
como o que ocorre no Brasil?
VELOSO - Não é o caso de pensar
no desaparecimento completo
de GM, Chrysler ou Ford. O que
elas têm de fazer é reestruturar-se, serem menores, mais
enxutas e com isso mais produtivas. O que acontecerá é fechar
fábricas, renegociar os contratos, fechar algumas linhas e
concentrar recursos em outras.
Podemos pensar num avanço
mais rápido de uma tendência
dos últimos anos, que é a perda
da prevalência da indústria
americana nos EUA. Se em
1980, 75% da indústria era
americana, em 2006 já falamos
de 50% e falaremos no futuro
talvez de 40%. Mas não creio
que seja mais radical que isso.
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