São Paulo, domingo, 23 de dezembro de 2007

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

VINICIUS TORRES FREIRE

Almanaque aleatório dos anos "7"


Retrospectiva casual de 2007 e dos anos de final "7", malditos, segundo a lenda dos povos dos mercados em Wall Street


STÁLIN ROUBOU um banco em 1907. Lênin fugia da Rússia, para onde retornaria no 1917 da revolução comunista, que roubou sete décadas da história russa. Em 1907, banqueiros dos EUA deram golpes na praça por meio de operações financeiras exóticas e escusas.
Engrossaram o caldo da crise de liqüidez e de solvência daquele ano de corridas bancárias. Era o grande pânico de 1907. Na década anterior, os EUA cresciam a 8% ao ano. Havia grandes fusões & aquisições. Não havia o Fed, o BC dos EUA. John Pierpont "JP" Morgan, o grande banqueiro, uniu-se ao secretário do Tesouro e convocou colegas para tapar rombos bancários. Taparam.
Os EUA ficaram mais ricos. São hoje um raro lugar do planeta onde banqueiros pegam cana dura. Para o então presidente dos EUA, Teddy Roosevelt, a crise era coisa de "ricos malfeitores". Bush diz que não vai deixar "o bom povo americano ficar sem casa". Está ficando. O JP Morgan é um dos bancões da Wall Street de 2007, onde se inventou a atual crise de crédito (ainda se discute se de solvência ou liqüidez).
O secretário do Tesouro dos EUA, Hank Paulson, vinha articulando com bancos um fundo contra a crise. Paulson já dirigiu o Goldman Sachs, o bancão que ganhou dinheiro nesse tumulto. Na semana passada, os bancões desistiram de criar esse tal fundão para tapar rombos em seus balanços, peneira causada por empréstimos irresponsáveis, alavancagens exóticas e algumas safadezas. O nome do fundo seria "Super SIV" (fundo de instrumentos financeiros exóticos). O povo de Wall Street rebatizou o Super SIV de "Super Sieve" (Super Peneira): um truque para maquiar balanços e fingir que ativos podres valem algum.
A idéia da Super Peneira tornara-se pública na semana em que o "crash" de 1987 da Bolsa de Nova York fazia 20 anos, a maior queda da história dessa Bolsa num único dia. Na data do "niver" do "crash", sexta-feira, 19 de outubro de 2007, a Bolsa de Nova York levou um grande tombo. Mas o "crash" de 1987 passou como apareceu, um raio em dia de céu azul, como gostava de escrever Marx no "Capital". A crise de 2007 tomou corpo, aprendeu a andar e caminha forte e sacudida para 2008.
2007 foi o ano do porco para os chineses. Para o povo de Wall Street, foi um ano do cão, outro da maldição do "7", "agourento" para as finanças. Alan Greenspan começou seu reinado no Fed no ano do "crash" de 1987. Tem comparado a atual crise às de 1907 e de 1987 e também à da bolha imobiliária de 1837 e à de 1998, que brotara na Ásia, em 1997, mas não afetou bancos dos EUA. "A raça humana jamais encontrou um modo de lidar com bolhas", tem dito o mestre das bolhas.
Almanaques anotam que Picasso terminou de pintar "Les Demoiselles d'Avignon" em 1907. O governo americano barrava a imigração de "indesejáveis" (como França e EUA o fazem agora). Surgiu uma lei de esterilização compulsória de doentes mentais e outros "indesejáveis" nos EUA. Inventaram a lava-roupas elétrica. Foi assinada a Convenção de Haia, que vetava armas químicas e maus-tratos a prisioneiros de guerra, como ocorre em Guantánamo e alhures. Jung encontrou Freud. Com a exceção da África, o mundo inteiro está mais rico do que nunca.

vinit@uol.com.br


Texto Anterior: Desemprego no ABC é o menor em 10 anos
Próximo Texto: Montadora dá "canseira", afirma Procon
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.