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ENTREVISTA
ALEXANDRE HOHAGEN
Internet móvel no país é cara e nos atrasa, diz Google
Preços e qualidade do serviço deixaram Brasil no "fim da fila" do celular Nexus
Alexandre Hohagen, 40, foi contratado em 2005 para
turbinar a venda de anúncios para o Google no Brasil.
Em 2009, passou a comandar a maior empresa de mídia do planeta na América Latina. Hoje, a companhia
domina a internet no Brasil, as receitas cresceram
60% (a maior taxa do mundo) e, a partir de 2010, elas
serão diversificadas com o Nexus, o primeiro celular
com a marca da empresa. Com ele, o Google vai para
cima da Apple, hoje líder de navegação pelo iPhone.
Leonardo Wen/Folha Imagem
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O diretor-geral do Google para a América Latina, Alexandre Hohagen, na sede da empresa em SP
JULIO WIZIACK
DA REPORTAGEM LOCAL
No Brasil, o preço dos pacotes de telefonia celular e o poder das operadoras entre os fabricantes de telefones podem
atrapalhar os planos do Google.
Hohagen diz que esses entraves
atrasaram a chegada do Nexus
ao país. O aparelho será lançado no Brasil no início do segundo semestre deste ano.
Ainda segundo ele, a companhia pressiona as teles a baixar
os preços dos pacotes de dados
para massificar o uso da internet móvel. Isso seria importante para a próxima fase do Google, que prevê a oferta de aplicativos e outros serviços via celular que exigem conexão permanente e estável.
FOLHA - Com o iPhone, a Apple
passou a liderar o uso da internet via
celular. Foi por isso que o Google
lançou o Nexus?
ALEXANDRE HOHAGEN - Cerca de
65% dos acessos à internet móvel ocorrem pelos smartphones
[celulares que são pequenos
computadores]. Dentro desse
universo, a Apple detém 60%
de participação com o iPhone.
O Google nunca escondeu que a
internet do futuro será via celular, com serviços personalizados. Essa internet identificará
quem acessa, será capaz de localizá-lo, identificar seus gostos, "saber" o que ele procura
na internet. A plataforma móvel tem vantagens enormes sobre a fixa para esse tipo de funcionalidade. A ideia do Google
sempre foi fazer a convergência
da plataforma PC [internet fixa] para a móvel. O lançamento
do Nexus tem a ver com o nosso
interesse em oferecer essa experiência ao usuário sem nenhum tipo de interferência.
FOLHA - Que interferência?
HOHAGEN - Hoje as empresas
de telecomunicações detêm o
controle total do que vai nos celulares. Elas definem o sistema
operacional, que aplicativos serão instalados, se vai acessar internet, em que rede o aparelho
será usado. A estratégia do Nexus é deixar o cliente completamente livre, tanto em relação à
operadora quanto ao conteúdo
nele instalado.
FOLHA - Esse modelo encontra barreiras nas operadoras, cujo negócio
está atrelado à venda de aparelhos
subsidiados. Acredita que será possível quebrar as regras?
HOHAGEN - Por isso o modelo é
híbrido. Vendemos o aparelho
bloqueado -e, nesse caso, vinculado a um pacote de uma
operadora- e desbloqueado,
para o uso de qualquer chip.
FOLHA - Quando o Nexus chegará
ao Brasil?
HOHAGEN - No início do segundo semestre. Em breve, devemos enviá-lo para a homologação na Anatel [Agência Nacional de Telecomunicações]. O
aparelho está sendo apresentado para as matrizes das operadoras brasileiras.
FOLHA - Por que o Brasil não está
entre os primeiros da lista?
HOHAGEN - Porque não chegou
ao ponto de inflexão que países
como a Índia atingiram. Aqui as
operadoras não têm planos de
dados com tarifas mais baixas.
O Brasil está entre os países
com mais celulares, mas o volume de buscas pelo Google via
celular no país é baixíssimo.
FOLHA - As teles também reclamam que o tráfego de dados em sua
rede é baixo.
HOHAGEN - No fundo, não faz
parte da estratégia delas baixar
o preço dos pacotes de dados
nem vender planos sem limite
de uso, que incentivariam a utilização da rede. Quanto custa
um iPhone no Brasil? R$ 1.200,
mais R$ 200 por mês por um
pacote de dados? É um absurdo, estamos falando de quase
US$ 150 em dados por mês. Em
um ano, acaba custando mais
que o aparelho. Na Índia, as
operadoras vendem planos ilimitados por US$ 5 mensais. É
isso o que chamo de inflexão e é
o que o Google espera da América Latina. Infelizmente, a região ainda está muito atrasada.
FOLHA - As teles dizem que os planos são caros porque os investimentos da rede 3G ainda não foram
amortizados.
HOHAGEN - Talvez seja por isso
que ainda seja caro. Mas, sem
planos acessíveis, não dá para
trazer ao Brasil aparelhos com
mais recursos nem serviços sofisticados. Temos uma série de
novidades. Os serviços de tradução são extremamente importantes para a estratégia do
Google, mas dependem de haver conexão estável com o
usuário. Sem uma rede parruda, não dá para oferecê-los.
FOLHA - Pelo que se observa, a infraestrutura de telecomunicações
do país ainda atrapalha a expansão
do Google na internet móvel. Mas a
crise fez muitas empresas apostaram na web. Isso não ajudou vocês?
HOHAGEN - Sem dúvida. Na crise, muitos passaram a pesquisar preços na internet, procurando ofertas, promoções. As
empresas, principalmente as
tradicionais, entenderam esse
comportamento do consumidor e aumentaram os anúncios.
O setor financeiro, incluindo
bancos, seguradoras e financeiras, a indústria automobilística
e até as empresas de bens de
consumo aumentaram os investimentos no Google.
O resultado é que crescemos
cerca de 60% no Brasil. É a
maior taxa do mundo para o
Google e, além disso, o país
também registrou a maior margem de lucro [cerca de 50%]. O
mais importante é que conseguimos equilibrar nossa dependência das empresas ligadas à
internet, a base de expansão do
nosso negócio. Há cinco anos,
85% dos anunciantes eram empresas do "core business" [empresas do mundo on-line]. Hoje, representam menos de 40%.
FOLHA - Ainda existe preconceito
das empresas tradicionais em anunciar na internet?
HOHAGEN - Essa barreira existiu porque essas empresas,
principalmente as de bens de
consumo, são mais focadas na
criação de marca [anunciando
em outros canais de comunicação, como a TV e os veículos
impressos]. Quebramos essa
barreira. Hoje, o Google no Brasil já é o principal destino da
Unilever. Em 2009, a GM dobrou seus investimentos, o
Santander ampliou seus anúncios em 400%. Ambos não estavam entre os dez maiores
anunciantes do Google em
2008. É um sinal de que o mercado brasileiro começa a amadurecer. Na Inglaterra, o volume de investimentos em internet já passou o da TV paga.
FOLHA - Como se comportaram as
pequenas e médias empresas?
HOHAGEN - Elas foram um dos
fatores que ajudaram a manter
nosso crescimento. Grandes
grupos não surgem da noite para o dia. Noventa e oito por cento das empresas brasileiras são
de pequeno e médio porte e
cerca de 25% delas estão conectadas à internet. É um volume
brutal de negócios que podemos atingir. Há cinco anos, nenhuma delas anunciava. Hoje
são centenas de milhares. Há
um empreendedor em Guarulhos (SP) que vendia suplementos alimentares no fundo da casa de seus pais. Ele começou a
anunciar no Google e hoje se
transformou no maior vendedor de suplementos e equipamentos de ginástica do país.
FOLHA - O Google vai ceder e pagar
pelo conteúdo das empresas de Rupert Murdoch [magnata dono de
um grupo de mídia que controla o
"Wall Street Journal"]?
HOHAGEN - Essa é uma discussão que põe em xeque a distribuição de conteúdo dos jornais
impressos. O Google não quer
se tornar uma empresa de criação de conteúdo e competir
com eles. O que fazemos é simplesmente colocar nossos
usuários em contato com o
conteúdo dessas empresas no
canal Google News. Seríamos
como jornaleiros exibindo
manchetes na banca.
As empresas têm controle total da nossa indexação e da exposição de seus conteúdos em
nosso site. Podem até dizer que
não querem aparecer nesse canal, como alguns fazem [e como
Murdoch quer fazer com seus
jornais, como forma de pressionar o Google pelo pagamento].
Mas acho um desperdício, porque geramos 1 bilhão de cliques
por mês para esses sites, que
poderiam canalizar o tráfego
para melhorar sua audiência e
atrair anunciantes. Muitos que
nos deixaram voltaram atrás
porque entenderam que podemos ajudá-los como distribuidor de conteúdo.
FOLHA - Então por que a discussão?
HOHAGEN - Os produtores de
conteúdo estão percebendo
que a notícia virou commodity.
O terremoto no Haiti é uma
commodity, porque o internauta encontrará essa notícia em
qualquer site jornalístico. Uma
entrevista com o general brasileiro no Haiti ou uma análise do
episódio passam a ser conteúdos exclusivos. A questão é: como cobrá-los? A internet já tem
modelos de micropagamentos
que poderiam ser usados para
monetizá-los. O que não dá
mais é proteger a notícia que
todo mundo já tem. É esse modelo que o debate entre Murdoch e o Google deixa exposto.
E o Google levará essa discussão até o final, se for o caso.
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