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agrofolha
Cadeia da cana perde R$ 10 bi em 2 anos
Apesar da elevação da moagem em 83 milhões de toneladas, usinas do setor mantêm mesmo faturamento de 2006/07
Queda de preços expõe fragilidade do setor, que precisa de mudança na comercialização e na política de financiamentos
MAURO ZAFALON
DA REDAÇÃO
Os preços do álcool não reagem e o setor sucroalcooleiro
paulista sai desta safra com
perdas de R$ 10 bilhões, acumulados em duas safras. Um
momento ruim para perdas já
que houve aumento da área de
cana plantada, expansão do
parque industrial e elevação do
endividamento no setor.
A reação nos preços é o alívio
de que produtores e usineiros
necessitam para amenizar a falta de crédito, acentuada com a
crise econômica mundial.
Na semana passada, ao contrário da tendência normal para a entressafra, os preços do álcool voltaram a cair. Em média,
as usinas paulistas venderam o
hidratado -utilizado diretamente no tanque- a R$ 0,7279
por litro, sem impostos, conforme pesquisa do Cepea (Centro
de Estudos Avançados em Economia Aplicada).
O anidro -misturado à gasolina-, também em queda, foi
comercializado a R$ 0,8275 por
litro. Em duas semanas, o hidratado soma queda de 11,3%
nas usinas, segundo o Cepea.
"Perdem todos com essa queda, tanto produtores como usinas", diz Antonio de Padua Rodrigues, diretor técnico da Unica (União da Indústria de Cana-de-Açúcar).
Se produtores e usineiros
não sentem a recuperação dos
preços da matéria-prima, os
usuários do combustível nos
postos também não veem muita retração nos valores.
Pesquisa semanal feita pela
Folha em 50 postos da capital
paulista mostra que, apesar de
leves quedas de preços em alguns estabelecimentos, outros
ainda mantêm tendência de alta. Na média, o litro de álcool
caiu para R$ 1,405 na semana
passada, ante R$ 1,408 na anterior. O repasse da baixa para o
consumidor é sempre mais demorado do que o da alta.
Sem remuneração
Essa perda de R$ 10 bilhões
nas duas últimas safras ocorre
porque "o preço não é suficiente para remunerar a atividade",
segundo Padua. Para manter a
atividade, a lavoura tem de renovar pelo menos 20% do canavial todo ano e as indústrias
devem fazer uma revisão do
parque industrial.
"O lucro da atividade não
veio e o setor foi obrigado a ir ao
mercado financeiro, dando no
que deu", afirma ele. Desses
R$ 10 bilhões, 61% são prejuízos na fase agrícola da atividade
e outros 39%, na industrial.
Padua explica a origem desse
"lucro que não veio". O faturamento atual do setor é o mesmo
de há duas safras, mas nesta última (2008/09) a moagem de
cana atinge 345 milhões de toneladas, ante apenas 262 milhões na de 2006/07.
Em 2006/07, o setor moeu
262 milhões de toneladas, com
faturamento na usina de R$ 85
por tonelada de cana moída, ou
seja, R$ 22,3 bilhões. Nesta safra, o preço médio é de R$ 65,5,
o que deve render R$ 22,6 bilhões, mas com 345 milhões de
toneladas moídas. "O setor aumentou a moagem em 83 milhões de toneladas e está faturando o mesmo de quando essa
moagem era de 262 milhões",
diz Padua.
A perda de renda desta safra
que se encerra será de R$ 5,6 bilhões, enquanto a da anterior
ficou em R$ 4,4 bilhões nos cálculos do diretor da Unica.
Com custo de produção elevado, a renda da cana moída
não remunerou o capital investido. "A renda da tonelada de
cana moída [que resulta em álcool e açúcar] deveria ter sido
de R$ 80 a R$ 85 para as indústrias nestas duas últimas safras,
mas ficou em R$ 65."
Padua diz que não há explicações para essa queda nos preços do álcool em plena entressafra e em uma semana que antecede o Carnaval, período de
grande consumo.
Algumas usinas ainda mantêm a produção, mas com baixa
produtividade. Além disso, as
pressões de caixa diminuíram
nesse período, o que leva as usinas a colocarem menos álcool
no mercado. A oferta de álcool
aumentou nesta safra, mas a
demanda também cresceu com
as vendas de carros flex.
Os estoques do início de fevereiro eram de 5 bilhões de litros, sendo que o consumo
mensal gira próximo de 1,8 bilhão. As usinas vão ter de antecipar bem a produção de março
e abril para atender a demanda
de maio, segundo Padua.
Fragilidade
A queda de preços, em plena
entressafra, mostra "a fragilidade do setor". Há muitos vendedores, que correm todos os
riscos, e poucos compradores,
"sem riscos", segundo Padua.
Na avaliação dele, serão necessárias mudanças profundas
tanto na comercialização como
na política de financiamento.
"A comercialização ocorre só
no mercado spot, sem contratos futuros. É preciso fazer os
contratos futuros na BM&F
funcionarem para que o produtor faça hedge [proteção]. Se
continuar assim, só o produtor
corre risco", diz Padua.
Para o diretor da Unica, são
necessárias medidas também
na política de financiamento,
tanto de safra como de estoques. A falta de crédito já gera
preocupação com a próxima safra. As usinas poderão ser obrigadas a desovar ainda mais a
produção para fazer caixa.
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