São Paulo, segunda-feira, 24 de abril de 2006

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CONTAS PÚBLICAS

Técnicos da área econômica já defendem que Mantega comece a falar em meta de 4,35% do PIB para este ano

Governo ensaia aumento "estratégico" de superávit

SHEILA D'AMORIM
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O desconforto com o excesso de gastos públicos neste ano, destacado nas recentes análises econômicas de bancos e consultorias, tem crescido também dentro da própria equipe econômica. O respaldo que o Palácio do Planalto tem dado para as pressões sobre o Ministério da Fazenda por novas despesas e as dúvidas do mercado em relação ao real comprometimento do ministro Guido Mantega (Fazenda) com a meta de ajuste fiscal para este ano fizeram com que técnicos da área econômica sugerissem um ligeiro aumento "estratégico" do valor fixado.
A proposta é que Mantega assuma que o superávit primário deste ano -estabelecido em 4,25% do PIB- poderá chegar a 4,35% do PIB, com uma margem de variação de 0,10 ponto percentual, que serviria para acomodar possíveis diferenças entre as projeções para o crescimento da economia neste ano e o valor efetivamente realizado.
Na prática, o esforço fiscal não estaria sendo alterado porque sabe-se que é difícil acertar o número exato e haverá mesmo ajuste estatístico a depender do PIB. Mas a avaliação é que, com isso, o ministro sairia ganhando sob dois aspectos.
Primeiro, marcaria sua posição, afastando de vez as dúvidas em relação ao seu compromisso com os 4,25% que foi um número fixado pelo seu antecessor, Antonio Palocci Filho.
Segundo, defendem membros da equipe ouvidas pela Folha, isso ajudaria a minimizar, pelo menos em parte, "o ímpeto" pela gastança dentro do governo que conta com aval da ministra Dilma Rousseff (Casa Civil). Indício disso foi a declaração de Mantega em Washington na reunião do FMI no sábado. O ministro disse que a meta é de, no mínimo, 4,25% do PIB.
Apesar de técnicos tanto da Fazenda quanto do Planejamento e do Banco Central ouvidos pela Folha considerarem que não há risco de a meta de 2006 não ser cumprida, as constantes pressões por novas despesas incomodam. As simulações feitas até agora no governo não apontam sequer que o esforço fiscal acumulado em 12 meses poderá ficar abaixo dos 4,25% do PIB em algum momento ao longo deste ano.
Esse cenário já é traçado por alguns economistas. Em função do forte ajuste fiscal registrado nos meses de março, abril e maio do ano passado, o economista Caio Megale, da MauáInvest, calcula que o superávit primário em 12 meses poderá ser menor do que a meta em junho deste ano. Em fevereiro, o valor registrado era de 4,38% do PIB. Esta semana, o BC divulgará o dado consolidado de todo setor público referente ao mês de março.
Até agora, os números do governo não apontam um cenário parecido, mas ainda assim, a situação "não é nada tranqüila" para técnicos da área econômica. O excesso de gastos considerados de "má qualidade", destacam, colocam em risco a manutenção do esforço fiscal nos próximos anos.
A avaliação é que um superávit de 4,25% do PIB é suficiente para fazer com que a dívida líquida do setor público caia do nível atual de 51,7% do PIB para o patamar dos 40% do PIB, em 2011. Ainda assim, será mais difícil sustentar esse esforço fiscal mesmo com o crescimento da economia.
Isso porque considera-se que o modelo de ajuste fiscal baseado no aumento da arrecadação, que prevaleceu desde o governo Fernando Henrique Cardoso, não poderá ser mantido. O forte crescimento das receitas proporcionou nos últimos anos espaço para elevação de gastos a despeito de metas fiscais crescentes. Agora, argumentam, chegou momento de "olhar melhor as depesas".
No início desse ano, todas as esferas de governo (União, Estados, municípios e estatais) diminuíram o esforço fiscal em relação a 2005 e o governo federal é o que mais tem contribuído para queda do superávit primário.
A arrecadação líquida da União, descontadas as transferências para Estados e municípios, cresceu 3,5% em termos reais no primeiro bimestre deste ano, comparativamente ao ano passado, enquanto isso, a despesa subiu 8,97%.
"Acredito que não teremos problema em 2006 (para cumprir a meta). O risco é a arrecadação não corresponder ao que se imagina em função de um crescimento menor da economia", afirma Sérgio Werlang, ex-diretor de Política Econômica do BC.
Ele diz que trabalha com projeções menos otimistas do que as do governo para o PIB. Segundo Werlang, o Brasil deverá crescer entre 3% e 3,5% em 2006. A projeção do governo na LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) enviada ao Congresso prevê crescimento de 4,5%.


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